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Perdedor em Iowa, Trump tem poucos dias para se preparar para New Hampshire

Jim Watson/AFP
Imagem: Jim Watson/AFP

Maggie Haberman

Em West Des Moines, Iowa (EUA)

03/02/2016 06h00

Donald Trump, o construtor, o dono de cassino, empreendedor de campos de golfe, astro de "reality show" da TV e presença constante nos tabloides, que disse que sua "vida trata-se apenas de vencer", assim como tem liderado todas as pesquisas presidenciais republicanas nacionais nos últimos sete meses, será conhecido por uns dias por um título ao qual não está acostumado: perdedor.

Mas esse adjetivo pode não durar muito. A campanha das primárias agora passa de Iowa, onde Trump ficou atrás do senador Ted Cruz, para New Hampshire, um Estado cujo eleitorado de mentalidade mais libertária, menos socialmente conservador, pode ser mais propício para Trump, um nova-iorquino extravagante.

Mas por uma noite, e em seu primeiro teste real com os eleitores de fato, o homem que continuamente se gaba de ser um vencedor por estar vencendo, teve que procurar palavras para explicar a derrota.

Em seu discurso de reconhecimento da derrota, Trump se manteve calmo e focado de modo notável, retratando a derrota como tendo mesmo assim superado as expectativas, em um Estado onde as pessoas lhe diziam que ele poderia não vencer, e onde assessores lhe sussurraram horas antes sobre o alto comparecimento dos eleitores. Ele começou dizendo o quanto ama a população de Iowa.

"Vamos em frente para New Hampshire!" ele disse, com sua família ao seu lado em um salão de baile apenas parcialmente cheio, no hotel Sheraton.

Apesar de sua celebridade ter deslumbrado e sua mensagem populista ter se espalhado como fogo na mata, atraindo grandes multidões aos seus comícios e transformando os debates presidenciais em programas de grande audiência para os canais de televisão de notícias, a campanha de Trump cometeu erros importantes que provaram ser cruciais nas últimas seis semanas.

Acima de tudo, Trump careceu de uma verdadeira operação de mobilização dos eleitores para saírem para votar em Iowa. De fato, ele nunca pareceu realmente comprometido com o Estado, visitando apenas esporadicamente e raramente se engajando no tipo de campanha de varejo que costuma ser recompensada aqui.

Por não ir com frequência à igreja, ele mal tentou conquistar os muitos cristãos conservadores daqui, e cometeu uma gafe quando o fez: em um culto religioso ecumênico no domingo, quando o prato da comunhão foi passado com as hóstias e o vinho, ele pegou sua carteira.

"Ficou aparente para mim que Trump criou um pool grande o bastante de pessoas para vencer a primária, mas sua campanha fracassou em fazê-las sair para votar", disse Roger Stone, um antigo consultor que ajudou a montar a campanha de Trump, mas se desligou dela em meados do ano passado.

De fato, as pessoas curiosas e deslumbradas que lotavam os comícios de Trump muitas vezes não tinham votado antes e não se sentiram compelidas a se dar ao trabalho. Atrair as pessoas para votar nas primárias historicamente exige que os candidatos realizem comícios menores, onde as pessoas podem lhes fazer perguntas diretas e onde podem responder de modo mais completo.

"Trump vendeu o chiado da carne fritando, não o filé", disse Matt Strawn, o ex-presidente do Partido Republicano de Iowa. "Os cidadãos de Iowa estavam famintos por mais. Mais substância. Mais oportunidades de fazer perguntas para Trump para descobrir se suas conversões mais recentes para políticas conservadoras eram autênticas. Um maior respeito pela primária de Iowa e suas tradições."

Trump não exibiu propagandas na televisão até muito depois de seus oponentes. E apesar de seus rivais e outros detratores terem em geral evitado atacá-lo com propagandas negativas, ele se mostrou vulnerável a elas: as propagandas por Cruz e dois grupos externos mostrando Trump declarando seu apoio aos direitos de aborto em 1999 causaram danos significativos. E sem uma rede confiável de representantes locais que uma operação mais forte em Iowa teria formado, Trump contou com poucas testemunhas de seu caráter para falarem em seu nome fora sua própria família.

Talvez seu erro mais caro, e certamente mais memorável, foi ter desistido do último debate republicano, promovido pela "Fox News" em Des Moines na quarta-feira passada. Ele assegurou às plateias que foi sábio não ter participado, e alguns analistas elogiaram seu instinto de evitar a linha de fogo como uma espécie de lance de gênio.

Mas a decisão fez com que Trump perdesse impulso, e após semanas tentando parecer mais convencional, o furor provocado por sua não participação no debate reforçou os aspectos circenses, e não de estadista, de sua candidatura.

Trump agora precisa demonstrar que sua candidatura pode suportar uma derrota. Ele pode tentar cauterizar o ferimento de Iowa com estoicismo e magnanimidade. Mas também pode buscar deixar de lado o veredicto daqui, retratando Iowa como não representativo do país ou do Partido Republicano.

Ele segue para New Hampshire com uma grande vantagem nas pesquisas do Estado. Mas com a primária em 9 de fevereiro, ele conta com pouco tempo para se reagrupar. E ele estará sob pressão para não apenas comparecer, como também apresentar um forte desempenho no próximo debate, na noite de sábado.