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Egito tira apresentadoras de TV do ar por estarem "acima do peso"

Khadija Khatab disse ter sido insultada durante a repercussão de seu afastamento - Reprodução
Khadija Khatab disse ter sido insultada durante a repercussão de seu afastamento Imagem: Reprodução

Nour Youssef*

No Cairo

18/08/2016 12h46

A maioria dos jornalistas egípcios teve de tomar cuidado com o que falavam e moderar suas reportagens nos três últimos anos para manterem seus empregos, em um governo dominado pelos militares. Agora, o Estado está ordenando que algumas mulheres que trabalham como âncoras de TV pratiquem uma restrição similar em relação a seu peso.

No começo desta semana, Safaa Hegazy, diretora da rádio e TV estatal do Egito, vetou que oito âncoras mulheres aparecessem no ar durante um mês, dizendo que elas estão acima do peso, como confirmou o site de notícias estatal "Al-Ahram". Hegazy ordenou que as mulheres entrassem em uma dieta enquanto estivessem suspensas, segundo a "Al-Ahram".

Khadija Khatab, uma das oito âncoras, disse que ainda não havia sido notificada oficialmente sobre a ordem de Hegazy, mas acrescentou ter ouvido recentemente que "medidas seriam tomadas contra" aquelas que não conseguissem perder peso até meados de setembro, de acordo com uma entrevista que ela concedeu a uma emissora de TV privada.

Khatab disse ter ficado ofendida com o fato de que a cobertura sobre sua situação incluiu termos como "gorda" e similares, que ela considerou "injustos" e "ofensivos". Ela também disse que as fotos dela que vinham circulando e estavam sendo motivo de gozação na internet e nas redes sociais eram antigas, e que ela havia perdido peso desde que foram tiradas.

Acredito que sou uma mulher egípcia comum com uma aparência normal, e não uso muita maquiagem" Khatab, desafiando as pessoas a contradizê-la.

E foi o que muitos fizeram.

Alaa el-Sadani, uma comentarista para o "Al-Ahram", disse que tinha "nojo da aparência repulsiva" das oito âncoras suspensas, e que acreditava que o resto do país concordava com ela.

Fatma al-Sharawi, outra jornalista do "Al-Ahram", elogiou a iniciativa como uma forma de melhorar os terríveis índices de audiência das emissoras estatais. "Será que banir oito é suficiente?", ela perguntou.

A audiência da TV estatal, há tempos considerada por muitos egípcios como uma fonte humorística de notícias, caiu significativamente depois do levante que tirou o presidente Hosni Mubarak do poder em 2011.

Eles não entendem que as pessoas não os estão assistindo porque eles não têm credibilidade, nem habilidade, nem qualidade. Não tem nada a ver com aparência. Mas isso serve para mostrar que eles não se importam com competência de verdade" Mostafa Shawky, um defensor da imprensa livre junto à Associação pela Liberdade de Pensamento e de Expressão

Shawky disse que as suspensões reforçavam uma ideia bastante disseminada no Egito de que somente mulheres que se enquadram em determinado padrão de beleza deveriam trabalhar em noticiários televisivos. "O fato de que é uma mulher que está fazendo isso torna tudo pior", ele disse.

A reportagem do New York Times não conseguiu entrar em contato com Hegazy.

[Segundo a agência de notícias AFP, Hegazy negou as acusações de sexismo. "Como pode haver discriminação contra mulheres em uma instituição dirigida por uma mulher?", disse.]

* Com contribuição de Rod Nordland