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Conheça o avião dos EUA usado para combater o Taleban e o Estado Islâmico

O bombardeiro B-52, usado pelas forças americanas no Afeganistão  - Master Sgt. Phil Speck/U.S. Air National Guard via The New York Times
O bombardeiro B-52, usado pelas forças americanas no Afeganistão Imagem: Master Sgt. Phil Speck/U.S. Air National Guard via The New York Times

Eric Schmitt

13/12/2017 04h00

Voando a mais de 6.000 metros de altitude, o enorme bombardeiro de longo alcance circulava de forma funesta. A aeronave militar sobrevoava uma área infestada de militantes no território afegão, perto da fronteira com o Paquistão, em busca de combatentes do Taleban e do Estado Islâmico.

Uma viagem na cabine em uma recente missão de 13 horas proporcionou uma rara visão da recém-renovada política do governo Trump para o Afeganistão. A política prevê o envio de milhares de tropas, assim como mais aviões de guerra como este para protegê-las. Isso inclui atacar os depósitos de drogas do Taleban para debilitar as finanças do grupo, como o Pentágono fez no Iraque e na Síria quando atacou os tanques de petróleo do Estado Islâmico e os locais onde o EI guardava seu dinheiro.

Durante o governo Obama, comandantes americanos foram impedidos de realizar ataques aéreos ofensivos contra o Taleban. Os ataques tinham que ser defensivos, visando proteger as forças afegãs em solo. Os comandantes então reclamavam que a medida atava suas mãos e levava a um impasse. Agora que as luvas foram retiradas, os aviões de guerra americanos já lançaram mais de 3.900 bombas e mísseis contra alvos no Afeganistão neste ano, três vezes mais do que no ano passado.

"Essa nova autoridade me dá a capacidade de ir atrás do inimigo de formas que não podia antes", disse o general John W. Nicholson Jr., o mais alto comandante americano no Afeganistão, no mês passado, após ordenar a nova operação, de codinome Faca Dentada. "Nós estamos atingindo o Taleban onde dói, que é suas finanças."

Os ataques aéreos americanos e ataques terrestres afegãos ao longo do último mês destruíram 25 laboratórios de drogas no sul do Afeganistão, eliminando US$ 16 milhões em produto do Taleban e colocando as operações regionais de narcóticos do grupo em desarranjo financeiro, segundo oficiais militares e estimativas da DEA, a agência americana de combate às drogas.

Nicholson disse que a campanha duraria meses, já que o Taleban opera de 400 a 500 laboratórios por todo o país para sustentar o comércio de ópio do grupo - que movimenta US$ 200 milhões por ano. O dinheiro das drogas é responsável por pelo menos 60% da renda do Taleban e é usado para comprar armas, recrutar e pagar combatentes e conduzir operações.

O bombardeiro B-52, usado pelas forças americanas no Afeganistão - Master Sgt. Phil Speck/U.S. Air National Guard via The New York Times - Master Sgt. Phil Speck/U.S. Air National Guard via The New York Times
Imagem: Master Sgt. Phil Speck/U.S. Air National Guard via The New York Times


Com a guerra no Afeganistão em seu 17º ano, a estratégia do presidente Donald Trump visa empurrar o Taleban para um acordo negociado. Ela busca não apenas estrangular a receita de ópio do grupo, mas também aumentar as ofensivas do exército afegão apoiadas por poder aéreo americano, assim como a realização de eleições para aumentar a legitimidade do governo afegão.

"O Taleban tem três escolhas: reconciliar, enfrentar a irrelevância ou morrer", disse Nicholson.

Especialistas em Afeganistão disseram já ter ouvido essas bravatas antes, mas a guerra continua sendo travada. Eles também expressaram dúvidas sobre o plano de atingi-los no bolso.

"É útil impactar financeiramente o Taleban, mas isso pode apenas deslocar a produção para os vizinhos Paquistão ou Irã", disse David W. Barno, um general reformado do Exército que liderou o esforço de guerra no Afeganistão por quase dois anos.

Outros críticos disseram que o aumento acentuado de ataques aéreos sairá pela culatra, causando inevitavelmente mais mortes de civis e a reação política contrária consequente, apesar dos melhores esforços dos militares para reduzir o risco.

"Se você aumenta o número de ataques sem alocar tempo, pessoal e recursos para prevenir, investigar e reconhecer cada um, você terá mais mortes de civis", disse Daniel R. Mahanty, diretor do programa americano no Centro para Civis em Conflito, um grupo de defesa de direitos. "É uma matemática básica."

Especialistas em alvos no centro de comando aéreo das forças armadas, no Qatar, disseram que chegaram à lista de instalações de drogas, que financiam diretamente os insurgentes do Taleban, ao examinarem centenas de horas de vigilância aérea e se debruçarem sobre os relatórios da inteligência. Os ataques aéreos costumam ser realizados à noite, quando menos pessoas estão próximas dos alvos.

"Foi um processo bastante deliberado", disse o capitão Ryan Pretty, um oficial de artilharia do Exército e vice-chefe da equipe que supervisiona os efeitos da campanha de bombardeio.

Observar e escutar a agitação dos operadores dos laboratórios de drogas, cujos depósitos não foram atingidos na primeira onda, ofereceu informações importantes para os planejadores traçarem a série seguinte de ataques, os ajudando a mapear as redes locais do Taleban.

"Esses ataques e o que aconteceu em seguida nos ensinaram muito sobre a complexidade das operações de narcóticos do Taleban", disse o tenente William Conway da Marinha, um ex-promotor em Chicago que agora é um importante oficial de inteligência para o Afeganistão no centro de comando no Qatar.

Os B-52 são centrais tanto para as operações de combate às drogas quanto para proteção das tropas. Este é o mais recente capítulo na longa história do bombardeiro nas últimas seis décadas, de suas missões de bombardeio na guerra do Vietnã e na guerra do Golfo Pérsico de 1991, até seu papel estratégico como parte da estratégia de dissuasão nuclear do país. Em janeiro, bombardeiros B-52 partirão da Louisiana para Guam para atuarem no Pacífico, inclusive perto da Coreia do Norte.

Dos aproximadamente 750 B-52 originalmente construídos, a Força Aérea ainda opera cerca de 75 dos modelos H de oito motores, com asa de envergadura flechada. O avião no qual voei, apelidado de Trem Noturno, foi construído em 1961, de modo que tinha quase o dobro da idade de qualquer um de seus cinco tripulantes do 69º Esquadrão de Bombas, saídos da Base Minot da Força Aérea, em Dakota do Norte.

Nossa missão teve início às 5h da manhã no quartel-general do esquadrão na Base Aérea de Al Udeid, no Qatar, onde a tripulação recebeu uma série de briefings de inteligência, segurança e da missão. Seguindo a tradição dos bombardeiros, a tripulação então se borrifou de colônia (uma de cheiro forte, "Liberdade Extrema", para a missão).

Na escuridão pré-amanhecer, um ônibus transportou a tripulação ao seu jato, com seus motores funcionando, bombas penduradas em suas enormes asas. A tripulação subiu por uma escada de metal para dentro da fuselagem. Os dois oficiais de armas, Soar, 30, de Pittsburgh, e Will, 28, de Arcadia, Califórnia, se sentaram diante de telas brilhantes no apertado compartimento sem janelas de operações ofensivas.

Subindo por outra escada de metal, ficava a cabine e um espaço separado, também sem janelas, para o oficial de guerra eletrônica, Poppa, 28, de San Diego. O comandante da missão, Rage, 29, de Minden, Nebraska, e seu copiloto, Bravo, 26, de Hillsborough, Nova Jersey, passaram abaixados pelo corredor e sentaram-se em seus assentos na cabine, prendendo suas máscaras de oxigênio, macacões de voo, coletes de voo e assentos ejetáveis com paraquedas. Eu me sentei no assento do instrutor atrás de Rage.

Os tripulantes pediram para ser identificados apenas por seus apelidos ou primeiro nome por razões de segurança. É uma tripulação jovem, com apenas um membro, Soar, já tendo sido enviado anteriormente para o exterior. Apenas uma dentre uma dúzia de tripulações do esquadrão, essa era a 23ª missão deles no Afeganistão, Iraque ou Síria desde que chegaram em setembro.

Às 5h41 da manhã, com o horizonte avermelhado pelo amanhecer, o B-52 se posicionou lentamente na pista e decolou para o voo de 3 horas e meia até o sul da província de Nangahar, no leste do Afeganistão, onde combatentes do Taleban e do Estado Islâmico estão enfrentando as tropas do exército afegão.

Ao chegar lá, com vistas de cair o queixo a 6.000 metros de altitude de picos cobertos por neve pelas janelas da cabine, a tripulação recebeu instruções das forças das Operações Especiais para que trabalhasse com as tropas afegãs em solo, usando suas poderosas câmeras sensoras para espionar vários prédios em um vilarejo, à procura de qualquer atividade "nefasta".

Neste caso, o B-52 estava agindo como uma cavalaria aérea, pronto para correr em ajuda às forças amigas com um arsenal formidável, que incluía cerca de duas dúzias de bombas de 900 kg e de 230 kg guiadas por laser, mais de 10 toneladas de destruição ao todo.

Dentro do B-52, conhecido afetuosamente como Buff (de "Big, Ugly, Fat, ...", ou seja, grande, feio, gordo e mais um palavrão, em tradução livre), o barulho era ensurdecedor. Os tripulantes usam fones de ouvido e conversam por microfones. Treze horas é muito tempo em um espaço muito confinado e a tripulação tem truques para permanecer alerta, incluindo bebidas energéticas e muita cafeína. Uma mistura eclética de heavy metal, rock, country e rap tocava em seus fones de ouvido.

Por seis horas, o B-52 voou pela rota de forma levemente inclinada para dar a Soar a melhor visão de seus alvos potenciais. Imagens em preto e branco piscavam em sua tela: um homem cortando lenha. Uma mulher lavando roupa. De repente, ele avistou algo suspeito: um homem retirando um longo objeto cilíndrico de sob uma lona. Seria uma peça longa de madeira ou cano, ou seria um míssil terra-ar?

Sem correr riscos, Rage e Bravo retiraram o avião do alcance de um míssil e pediram para que um drone Reaper armado nas proximidades checasse mais de perto. Após quase uma hora e alguns atrasos, o B-52 precisava voltar à base sem resolver o pequeno mistério.

Nenhuma bomba foi lançada naquele dia, como ocorre em cerca de um quarto das missões da tripulação para proteger as tropas afegãs. "Mas os mocinhos voltaram para casa em segurança", disse Rage.