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Extrativista diz que transporte para vender produtos é maior desafio na região da Amazônia

Carolina Gonçalves

Da Agência Brasil, em Macapá

07/11/2012 12h38

Há 15 anos anos vivendo da extração do açaí em um assentamento no município de Santana, no Amapá, Egimênia da Conceição das Neves não hesita em declarar: "É o melhor negócio. É muito lucrativo para nós produtores". No local, Egimênia divide, com outras três famílias, os ganhos com a produção que, diz, chegam a 20 sacas por ano, comercializadas a R$ 60 reais cada.

A alegria da extrativista não esconde o sacrifício que esse retorno exige diariamente. São as águas do rio próximo ao assentamento que definem todas as manhãs o destino dessas famílias. "A nossa maior dificuldade é o transporte para vender. A gente trabalha de acordo com a maré e quando tiramos o açaí, de manhã, nem sempre a água está boa. Muitas vezes o rio seca."

O escoamento da produção é apenas um dos desafios diários dos mais de 300 mil extrativistas que atuam no país. Na região da Amazônia Legal - que abrange os estados do Amazonas, do Amapá, do Acre, de Mato Grosso, de Rondônia, do Pará, de Roraima, do Tocantins e do oeste do Maranhão -, onde está concentrando grande parte de produtores que dependem dos recursos naturais para sobreviver, os obstáculos são intensificados pelo isolamento e a distância das comunidades.

Ozias Silva viu o pai superar os problemas de escoamento e preferiu seguir outro caminho. Aos 18 anos, optou por estudar na capital do Amapá. Hoje é extensionista e orienta outros extrativistas. "Aqui, os extrativistas ficam com a produção embargada para tirar da floresta e chegar até os portos de embarque ou onde os carros podem levar a mercados e feiras. A gente percebe que o escoamento é uma grande dificuldade, mas também há muitas dificuldades no acesso à educação, saúde e comunicação."

Reivindicação antiga

A lista de obstáculos parece não respeitar limites territoriais e setoriais. E são esses os impedimentos apontados pelos próprios extrativistas que impedem o incremento da produção e, consequentemente, da renda. O governo tem mantido diálogo permanente com o segmento desde o ano passado, quando foi estabelecida uma agenda conhecida como Marajó, com a definição de estratégias para desenvolver o setor. Um ano depois, durante  encontro em que os extrativistas apresentaram novas demandas e antigas reivindicações, representantes do governo prometeram uma radiografia em 76 unidades de conservação onde vivem comunidades tradicionais.

O cadastramento vai completar informações de 40 famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Verde – que repassa R$ 300, trimestralmente, às famílias que contribuem para a conservação de áreas protegidas. Ele será comparado com outros bancos de dados do governo, como o do Bolsa Família, e usado na definição de políticas específicas para cada região e um Plano Nacional de Extrativismo no Brasil.

"Vamos lançar o cadastro para identificar como as coisas estão em todas as unidades do país, quem é quem, quais são os déficits de educação, de saúde, onde preciso ter energia elétrica, quais as atividades econômicas. Porque daqui a três anos, quando acabar o Bolsa Verde, tenho que ter alternativa de renda para essas pessoas e tenho que construir isso agora", disse a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, descrevendo o que chama de “kit extrativismo”. 

A ministra, que está em Macapá para o 3º Congresso Nacional das Populações Extrativistas, alertou que é preciso criar uma nova lógica para essas áreas, destacando que algumas famílias passam até cinco dias em barcos para levar a produção até os locais de comércio, por falta de infraestrutura.

Ao reconhecer dificuldades na gestão das unidades de conservação, Izabella explicou que, por mais que sejam colocadas pessoas na ponta, é insuficiente o número de gestores públicos para lidar com o tamanho do problema e a grandeza de desafios. "Só em um parque, tenho 3,2 milhões de hectares. Ou eu trabalho com as populações que vivem no entorno dessas unidades e começo a construir uma base de dados, ou vou demorar muito tempo para chegar na ponta."

Novo certificado

Durante o evento, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, informou aos extrativistas, que continuam reunidos em Macapá até o próximo dia 8, que quase 1.500 produtores vão receber o certificado de Concessão de Direitos Reais de Uso. O documento, que vale como título provisório para áreas de assentamentos de extrativistas, beneficiará 445 moradores da Reserva Extrativista Cumuruxatiba, na Bahia, e 1.072 da Reserva Chico Mendes, no Acre.

"Esse certificado é a valorização e o reconhecimento da luta dos extrativistas que, muitas vezes, são empurrados para fazer as coisas restritas pelo agronegócio, pelas indústrias de exploração do pescado, do marisco e do caranguejo. Tudo isto nos escraviza no dia a dia", contou Marli Lúcia da Silva Souza. Marli mora em uma reserva marinha extrativista em Bragança, no Pará, onde a regularização foi iniciada há sete anos. Isso garantiu, segundo ela, tranquilidade às famílias que dependem da pesca de peixes, ostras, mexilhão e do caranguejo.