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Paraíso de caçadores se transforma em sucesso de preservação na África

Panorama do lago Ihema no Parque Nacional Akagera, em Ruanda - Ben Curtis/AP
Panorama do lago Ihema no Parque Nacional Akagera, em Ruanda Imagem: Ben Curtis/AP

Pauline Bax

Da Bloomberg

07/01/2019 16h08

Quando Sarah Hall chegou para administrar o mais antigo parque nacional de Ruanda, em 2010, seus guardas mal conseguiam lidar com gente que capturava hipopótamos para comer. Os rinocerontes haviam desaparecido e os leões tinham sido exterminados.

No ano passado, a reserva atraiu mais de 37.000 visitantes nativos e do exterior que se interessam por animais selvagens, incluindo 22 leões e 18 rinocerontes negros trazidos de avião da África do Sul.

"É um lugar muito diferente do que se via há nove anos", disse Hall, que administra o parque Akagera junto com o marido.

Akagera é uma das maiores histórias de sucesso da African Parks, uma organização sem fins lucrativos que recebeu mandato de nove governos africanos para assumir completamente a administração de suas reservas. A African Parks supervisiona mais de 10 milhões de hectares em alguns dos locais de mais difícil acesso no mundo; da violenta República Centro-Africana aos pântanos do extremo oeste da Zâmbia.

A organização emprega a maior força não governamental contra caçadores de toda a África, com quase 1.000 guardas, e também oferece hospedagem que vai desde quartos simples até tendas luxuosas com diária de US$ 1.300. Essa tática e a reintrodução de animais de grande porte ajudaram a incentivar o turismo em locais improváveis como o Chade, que atrai milionários para um acampamento remoto no parque nacional Zakouma, onde não há vagas até 2021.

"O turismo na África é voltado principalmente para natureza e vida selvagem", disse Peter Fearnhead, presidente da African Parks, em entrevista realizada em Joanesburgo. "O que tentamos fazer é erguer uma economia diretamente ligada à conservação."

A abordagem é criticada por alguns ativistas, que argumentam que cercar terras e empregar guardas armados militariza iniciativas de preservação e criminaliza povos que caçam a própria comida.

A trajetória não foi pacífica. Em 2007, a African Parks saiu de duas unidades na Etiópia porque o governo não apoiou negociações com a população local para limitar o uso da terra. Dois anos depois, 15 funcionários foram assassinados por um grupo rebelde em Garamba, na República Democrática do Congo.

Mas o número de prisões em Akagera caiu para 19 no ano passado e não ocorre tiroteio desde o assassinato de dois guardas por caçadores de hipopótamos, em 2010.

Bancada por filantropos e instituições de caridade dos EUA e Europa, a African Parks iniciou suas atividades no Malawi e na Zâmbia em 2003, após três anos de negociações. Hoje administra 15 parques nacionais nas regiões sul e central do continente e está se expandindo para o oeste, incluindo Pendjari, em Benin, considerado patrimônio da humanidade pela UNESCO.

"Está se desenvolvendo um modelo no qual os países aprendem com outros países que há valor em seus parques, tanto que eles próprios estão dispostos a investir neles", explicou Fearnhead, economista nascido no Zimbábue que fundou a African Parks com quatro sócios. O objetivo é administrar áreas grandes o bastante onde possam ser reintroduzidas espécies que desapareceram, o que requer pelo menos 70.000 hectares.

A renda gerada pelo turismo ainda é pequena dentro do orçamento de US$ 45 milhões da African Parks, que vem principalmente de doadores.

A empresa também trabalha para encontrar fontes de renda para quem mora perto, como artesanato e apicultura, e traz crianças para visitar o local, conta a administradora Hall.

"Sou da comunidade e nós não gostávamos muito do parque", lembra Alphonse Ntabana, que hoje é guia turístico do local. "Antes eu pensava que a terra servia para criar gado e não me importava com os animais que viviam ali. Mas desde que comecei a ganhar dinheiro com o parque, entendi a importância da preservação." Em Ruanda, o governo também fez campanhas de conscientização sobre o valor da vida selvagem, incluindo os gorilas

Outro benefício para a população local é que as cercas impedem búfalos e elefantes de destruir plantações.