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"Enquanto tiver floresta em pé, quem a defende será ameaçado", diz cacique

Almir Narayamoga, líder indígena que falou em Paris em defesa da Amazônia - Daniel Marenco/Folhapress
Almir Narayamoga, líder indígena que falou em Paris em defesa da Amazônia Imagem: Daniel Marenco/Folhapress

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

01/09/2019 04h00

O cacique Almir Narayamoga, da etnia suruí, em Rondônia, é uma referência internacional na defesa da Amazônia. Na quarta-feira (28), ele participou do Encontro dos Executivos, organizado em Paris pelo Medef (Movimento das Empresas da França). Enquanto a floresta ardia em chamas no Brasil, ele falou da necessidade de defender um projeto de desenvolvimento sustentável e da necessidade de a Europa observar de quem compra produtos advindos da floresta.

Em entrevista ao UOL após o evento, ele afirmou que não sabe o resultado de sua fala aos franceses, mas comemorou o que chamou de reconhecimento internacional da importância da floresta amazônica. "Acho que é muito importante o mundo reconhecer o papel da Amazônia para garantir o futuro das gerações. Isso demonstra também uma consciência de valorizar a floresta", disse.

O cacique criticou o discurso do presidente Jair Bolsonaro contra o meio ambiente e contra os povos tradicionais, defendendo uma mudança de política. "A gente precisa, como líderes, reagir e, claro, propor uma nova política para combater esse tipo de construção destruidora do futuro", diz.

Essa não foi o primeiro reconhecimento de sua liderança ao falar sobre a Amazônia fora do país. Em 2007, foi eleito membro do Conselho Nacional de Política Indigenista. No mesmo, durante a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Clima (COP-15), na Dinamarca, recebeu o Prêmio Maia Lin pelo projeto de Carbono Suruí. Dois anos depois, teve um encontro com príncipe Charles, no Reino Unido. Em 2011, participou em frente à torre Eiffel de um protesto contra a construção de barragens na Amazônia.

Defensor da floresta há décadas, o cacique diz que não está livre de enfrentar violência dentro da sua terra indígena. "Enquanto tiver floresta em pé, quem defende a floresta será ameaçado", afirma. Confira a entrevista.

UOL - A Amazônia entrou mais uma vez no noticiário internacional. O que o senhor achou dessa preocupação vinda dos mais importantes líderes mundiais?

Almir Narayamoga - A ajuda internacional demonstra uma consciência de que a Amazônia tem uma importância para o mundo. Dentro do cenário de mudanças climáticas, a Amazônia também tem um papel importante no equilíbrio do clima. Então, acho que é muito importante o mundo reconhecer o papel da Amazônia para garantir o futuro das gerações. Isso demonstra também uma consciência de valorizar a floresta.

Que resultado o senhor acha que sua fala teve nos empresários franceses?

Eu não tenho conclusão da reunião, mas sei que ficou lá o meu depoimento. Nada foi decidido em definitivo, mas fui e participei. Dei nosso recado.

Como o senhor avalia a ideia do governo federal de exploração das reservas indígenas?

É preocupante a política que o governo está propondo contra povos indígenas e o meio ambiente. A forma como ele quer fazer isso é muito perigosa. Como líderes, precisamos reagir e, claro, propor uma nova política para combater esse tipo de construção destruidora do futuro, usando critério e política do nosso próprio país. Acredito que precisamos discutir isso de uma forma que seja boa para todos.

Falta uma política para proteção a povos tradicionais da floresta?

Povos tradicionais são a raiz de um país. Logo, ter pessoas com condições de compreender o que significa a raiz de uma história, suas conquistas, avanços e crescimento é muito importante. Esses povos, dentro da valorização da sua cultura, vêm utilizando o respeito ao meio ambiente e vêm trabalhando o programa e a política de desenvolvimento sustentável do país. Por isso que precisamos —se amarmos nosso país e o nosso povo— ter respeito aos povos tradicionais, que são a nossa história.

O senhor já falou algumas vezes que se sente em constante ameaça na floresta. Esse sentimento continua?

Enquanto tiver floresta em pé, quem defende a floresta será ameaçado. Como eu defendo a sustentabilidade, tenho esse risco. Tenho medo [de morrer], sim, com certeza.

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