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Estados da Amazônia combatem desmatamento com recursos recuperados na Lava Jato

Queimada é vista na floresta Amazônia nas proximidades de Porto Velho, em Rondônia - Bruno Rocha/Fotoarena/Folhapress
Queimada é vista na floresta Amazônia nas proximidades de Porto Velho, em Rondônia Imagem: Bruno Rocha/Fotoarena/Folhapress

Por Jake Spring

03/06/2020 12h05

Governos de Estados da região amazônica estão intensificando o combate à destruição da floresta tropical com milhões de reais de um fundo com dinheiro recuperado da Petrobras a partir da operação Lava Jato, que tem permitido às autoridades estaduais compensar em parte o enfraquecimento das ações de proteção ambiental durante o governo do presidente Jair Bolsonaro.

Agências ambientais estaduais terão uma fonte de recursos inesperada que a Reuters calcula em ao menos R$ 140 milhões. O dinheiro, que vem de um acordo de indenização da Petrobras, será investido em fiscais, jipes, tecnologia de vigilância e outros gastos para proteger a floresta tropical, disseram autoridades dos nove Estados amazônicos à Reuters.

"Caiu do céu. Sabe o que é cair aquele dinheiro que você nunca esperava e de repente vai ver o seu saldo e está lá um dinheiro que você nem pensava que tinha?", disse Robério Nobre, secretário de Estado do Meio Ambiente do governo do Amapá.

A quantia que será destinada às agências ambientais estaduais não foi relatada anteriormente.

O desmatamento da Amazônia brasileira atingiu uma alta de 11 anos em 2019, e continua subindo neste ano.

O aumento da destruiu coincidiu com a diminuição de recursos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), cujo orçamento foi cortado diversas vezes nos últimos anos e hoje tem menos da metade dos 1.600 agentes de campo que tinha em 2009.

Embora a redução do financiamento tenha começado antes de Bolsonaro, ativistas ambientais culpam o atual governo por piorar a situação relaxando as proteções da floresta tropical. Bolsonaro critica o que vê como regulamentos ambientais muito rígidos que atrapalham o desenvolvimento econômico.

"A transferência de recursos do Fundo Petrobras vem no momento bastante oportuno. Os Estados podem ocupar esse vácuo, podem fazer um contraponto em relação do governo federal", disse Ana Karine Pereira, professora de política ambiental no Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília.

A Petrobras esteve no cerne do maior escândalo de corrupção da história do Brasil, revelado pela operação Lava-Jato, que envolveu o pagamento de propinas a centenas de políticos e líderes empresariais em troca da concessão de contratos com a petroleira.

A empresa admitiu irregularidades relacionadas à manutenção de registros e a controles internos, terminando por concordar em pagar uma multa de R$ 853 milhões para se livrar das acusações de que violou leis anticorrupção dos Estados Unidos.

As autoridades norte-americanas aceitaram devolver a maior parte dos recursos ao governo brasileiro.

Depois que os incêndios na floresta amazônica aumentaram no ano passado e provocaram revolta internacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu direcionar uma parcela dos fundos à proteção ambiental a cargo dos Estados.

Projetos

Para os Estados normalmente carentes de fundos, o dinheiro expandiu os orçamentos radicalmente.

A agência ambiental do Pará, o Estado com o maior nível de desmatamento em 2019, recebeu R$ 49 milhões, o dobro de seu orçamento anual de R$ 24 milhões. O montante será gasto ao longo de cerca de dois anos.

O Pará está contratando 100 agentes de campo adicionais para vigiar o desmatamento e outros crimes, 10 vezes o número de agentes que tinha antes. Estes realizarão sua primeira operação em junho, disse o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, Mauro O'de Almeida.

Vários dos Estados têm longos planos escritos para o uso do dinheiro. O plano do Amapá, por exemplo, contempla desde comprar equipamento para monitorar o desmatamento à reavaliação de suas áreas de reservas protegidas, disse o secretário Nobre.

Roraima, que faz fronteira com a Venezuela, tem um documento de 35 páginas que promete apoiar a agricultura sustentável e educar os moradores sobre a prevenção de incêndios. O chefe da agência ambiental estadual, Ionilson Souza, disse que parte dos fundos será usada para contratar bombeiros em outubro, quando os incêndios costumam chegar ao auge.

Nem todos os Estados gastarão a verba com o meio ambiente. Em maio, o Supremo decidiu que quatro deles terão permissão de redirecionar os fundos, parcial ou integralmente, para o combate ao coronavírus.

O governo Bolsonaro enviou milhares de soldados para a Amazônia no mês passado para combater o desmatamento.

Ativistas ambientais dizem que os militares não conseguem substituir eficientemente a vigilância permanente de agências especializadas como o Ibama.

O vice-presidente Hamilton Mourão, general da reserva que comanda a operação, reconheceu que enviar os militares não é o ideal, mas diz que é a melhor opção disponível para o governo carente de dinheiro.

No mês passado, ele disse que o objetivo final é aumentar o pessoal e o financiamento do Ibama até 2022, quando o primeiro mandato de Bolsonaro termina.

Os Estados dizem estar preenchendo as lacunas.

"A gente não está esperando por essa ajuda, estamos fazendo nossa parte", disse Mauro O'de Almeida.