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Não espero nada desses compromissos da COP26, diz ambientalista

Colaboração para o UOL, no Rio

03/11/2021 10h56Atualizada em 03/11/2021 12h26

O ambientalista Ailton Krenak disse no UOL Entrevista de hoje não esperar avanço nos compromissos firmados na COP26 entre dezenas de países.

Dentre os acordos assumidos pelas principais nações do mundo, dentre elas o Brasil, estão o fim do desmatamento até 2030 e a redução em 30% da emissão de gás metano até o mesmo ano.

"Esse evento, que tem essa importância planetária, foi tratado de uma maneira muito displicente pelos governos. O fato de 100 governos fazerem isso e aquilo é um número totalmente irrelevante. Deveríamos ter uma cúpula de verdade, dos governos que demonstrassem alguma preocupação real com a situação do planeta... Não espero nada desses compromissos da COP26", disse o ativista.

Além dos acordos multilaterais, no primeiro dia da conferência, na segunda (1), o Brasil anunciou a redução em 50% das emissões de gases do efeito estufa até o fim da década. Krenak é pessimista sobre o compromisso assumido pelo país.

No caso do Brasil, todas as juras são falsas. Estamos sentando fogo na floresta, devastando as florestas, matando os rios. A sequência é tão grotesca que acreditar em promessas feitas num encontro desses é mais ou menos acreditar naquele sujeito que espanca a família e aparece de público dizendo 'feliz Natal para todos'
Ailton Krenak

O líder indígena diz que até 2030 o Brasil não conseguirá, por exemplo, "sequer diminuir o rastro do fogo e do gado que está avançando sobre as últimas áreas de floresta no Pará". Ele também cita Rondônia e Acre como estados que têm regiões em risco de desmatamento total.

"A gente continua com essa indiferença do governo brasileiro. É brincadeira dizer que o Brasil pode falar alguma coisa numa cúpula dessa. O Brasil está parecendo aquele aluno displicente que só aparece na hora da merenda. É vergonhoso", afirmou Krenak.

Opinião pública

Krenak afirma que não apenas os governos, mas também a sociedade em geral trata o meio ambiente com desprezo. Para ele, a opinião pública flerta com o cinismo.

O planeta está fritando e as pessoas querem uma boa notícia dizendo 'vai dar tudo certo'. Muito provavelmente em 2030 os eventos climáticos extremos vão estar matando gente no planeta inteiro. Não vou dizer para as pessoas 'fiquem tranquilas em casa'
Ailton Krenak

O ambientalista acredita que as pessoas preferem viver em uma ilusão do que encarar a realidade. Ele também critica a falta de compromisso das empresas.

"Não há mudança no comportamento das grandes empresas. Você deve ter visto um ou outro grande CEO, gerente de corporação, anunciando essas medidas, e algumas até vão se comprometer em fazer adequações... Tem gente que está devendo há 15, 20 anos, chega no balcão, paga e quer um prêmio. Esses caras não têm que receber prêmio, têm que tomar vergonha", afirmou o ativista.

Recolonização

Ao falar da invasão dos territórios dos povos originários, Krenak faz uma alusão ao colonialismo. Para ele, estados do Sul e Sudeste do país vão até o Norte, principalmente a Amazônia, para colonizar essas regiões.

Os brancos do Sudeste vão para a Amazônia para domesticar o povo nativo. Eles fazem a mesma coisa que os bandeirantes faziam no século XVII. É uma falta de respeito interna. A gente não precisa ser recolonizado por estrangeiro, porque já fazemos esse serviço sujo dentro de casa
Ariel Krenak

O ativista vê essa situação como falta de respeito com a pluralidade cultural do país. Ele diz que há um desrespeito com a cultura dos povos originários, principalmente da Amazônia.

"Os brancos do Brasil acham que têm que acabar com quem não é branco. Acham que aquele povo que vive na Amazônia não sabe cuidar daquele território. Então, eles vão lá e tomam o território deles para fazer uma planície do agronegócio", disse Krenak.