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02/04/2005
Guerra aberta à "teologia da libertação"
Wojtyla condenou ao ostracismo teólogos que defendiam os pobres

Juan Arias

Um dos pecados do longo pontificado de João Paulo 2º foi a luta sistemática e contínua contra a teologia da libertação e seus principais líderes. Para essa guerra, serviu-se do cardeal alemão Joseph Ratzinger, filho de um policial, a quem o papa Wojtyla entregou a Congregação da Fé, o antigo Santo Ofício, por sua vez herdeiro do Tribunal da Santa Inquisição.

Um dos frutos do Concílio Vaticano 2º, que com João 23 e Paulo 6º tentou reconciliar a Igreja com o mundo moderno, foi o nascimento da teologia da libertação, elaborada no Terceiro Mundo e principalmente na América Latina, com a colaboração dos teólogos europeus mais progressistas, desde Rahner até Metzs. Uma teologia que tentava dar um passo a mais desde a chamada "teologia política" até a "teologia dos pobres e excluídos dos bens da terra". Sem dúvida, o esforço teológico mais original que conheceu a história da Igreja.

A teologia da libertação -- desde seu fundador, o sacerdote peruano Gustavo Gutiérrez, até o franciscano brasileiro Leonardo Boff e os jesuítas Jon Sobrino e Ignacio Ellacuría, entre muitos outros -- tentou fazer uma nova leitura da fé cristã à luz das injustiças estruturais do capitalismo, criador de imensos bolsões de pobreza, voltando ao conceito bíblico de que os pobres ocupam o lugar preferencial na Igreja do crucificado Jesus de Nazaré. E que os pobres são o sujeito, e não só o objeto, da fé cristã.

A teologia da libertação devolveu o interesse pela teologia e pela Igreja, inclusive a intelectuais até então distanciados da fé católica. Foi a primeira tentativa de fazer, a partir da fé, uma leitura da história com os instrumentos da economia e da sociologia. E levou em conta a análise marxista da sociedade e de suas estruturas de injustiça.

Foi o medo do papa polonês anticomunista de que a teologia se contaminasse de marxismo que o fez lançar seus cânones contra ela. O Vaticano começou a acusar de marxistas os teólogos que elaboraram a nova teologia da libertação, lembrando-lhes que a fé católica pede que se libertem as pessoas "do pecado". Com a diferença de que, para a teologia da libertação, o verdadeiro pecado é a injustiça, que engendra pobreza e dor. O curioso é que Roma sempre defendeu -- e o papa Wojtyla repetiu isso em todas as suas viagens ao Terceiro Mundo -- a preferência da Igreja pelos pobres. Ele mesmo se definiu durante uma viagem como "teólogo da libertação". Mas sempre afirmou que é preciso libertar os cristãos, antes de mais nada, de seus pecados, para que voltem à fé praticada. Tudo o mais -- a luta contra as estruturas injustas, contra os tiranos, defendida por Paulo 6º em casos de "injustiça extrema"; a organização dos pobres como sujeitos da história para defender seus direitos -- foi considerado por João Paulo 2º e por Ratzinger uma concessão ao marxismo e um desvio teológico.

O golpe mortal à teologia da libertação foi dado por João Paulo 2º ao assinar o documento elaborado pelo cardeal Ratzinger em que se condenava radical e definitivamente essa teologia. Foi em 1984, e o documento se intitulava "Instrução sobre alguns aspectos da teologia da libertação".

A partir desse momento começou a caça aos teólogos que elaboravam e defendiam essa teologia. O primeiro a desfilar diante do ex-Santo Ofício foi o brasileiro Leonardo Boff, um franciscano adorado pelos mais pobres da América Latina, que foi interrogado por Ratzinger e condenado várias vezes ao silêncio, até que decidiu se secularizar.

Em vão os cardeais brasileiros que se solidarizavam com Boff tentaram que o papa recuasse. O único que conseguiram foi que Wojtyla lhes dissesse que "seu" cardeal "era mais severo que ele". A perseguição estendeu-se a todos os países. Superiores de congregações e ordens religiosas, bispos e cardeais que não comungavam com essa teologia aproveitaram a dureza do Vaticano para deixar no ostracismo os teólogos mais vivos e mais presentes na luta em favor dos pobres, que eram acusados de solidariedade com as guerrilhas da América Latina.

A queda do Muro de Berlim e do comunismo aguçou ainda mais a luta contra a teologia da libertação, que chegou a ser considerada morta. É verdade? Boff disse há pouco tempo que ela está morta só para o Vaticano. Mas que continua tão viva ou mais que antes, e está florescendo com novos matizes. "Enquanto existir um só pobre e excluído, continuará viva", disse Leonardo Boff. A teologia da libertação está se revestindo de novas formas, que incluem todos os excluídos: desde os índios até os negros, os gays, os doentes de Aids, os imigrantes e refugiados, etc. É a teologia que começa a se ocupar primeiro do ser humano, com suas necessidades terrenas, e só depois, ou simultaneamente, de sua alma.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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