A Tailândia não está entre os países do sul global mais afetados pela atual crise de alimentos agravada pela guerra russa e pela pandemia. Na verdade, o setor produtivo do país prevê que a atual conjuntura internacional pode ajudar os tailandeses a ir do 13° para o 10° lugar entre os exportadores de comida até o final de 2022. Uma parte desta segurança vem da emergência recente de sistemas de produção mais justos e resilientes, com destaque para o modelo agroflorestal. O país asiático viveu uma intensa turbulência política e econômica no primeiro ano da pandemia, com massivos protestos nas ruas contra o governo militar e a monarquia. Observadores nacionais e do exterior avaliam que a desilusão econômica dos jovens é a causa principal das tensões. Esta é também a razão que tem levado trabalhadores urbanos ao meio rural em busca de uma vida com mais sentido e valor. Jon Jandai fez este caminho há quase duas décadas. Ele partiu de Bangkok para o campo e lá aprendeu como as plantas interagem entre si em um sistema florestal, diminuindo naturalmente o impacto de pragas e eventos climáticos extremos sobre cada cultivo. Hoje ele ensina milhares de tailandeses e estrangeiros sobre os potenciais da agrofloresta tropical, com foco na auto suficiência. O Pun Pun Center for Self-Reliance, que ele ajudou a fundar em 2003, já formou mais de 100 mil trabalhadores em parceria com a iniciativa Thamturakit (negócio justo em tailandês). A unidade apoia de modo permanente cerca de 2 mil famílias camponesas. "Nós produzimos mais - com mais diversidade - do que a agricultura convencional. Temos grãos, temos peixe, temos frutas, temos ervas, temos árvores", explica Jandai à coluna. "A grande diferença é que nunca vamos perder nosso dinheiro. Se você tiver seca, na agricultura convencional você perde seu investimento. Na orgânica, você não perde nada porque tudo volta para o solo. Você não precisa vender barato, mas você pode até doar." O centro promove um modelo de precificação que leva em conta o tempo do agricultor, custos de administração e transporte. Fora da conta ficam os custos de produção, que são minimizados ao máximo com o emprego do menor número possível de insumos externos. "É difícil comparar nosso desempenho com a agricultura convencional, que só usa uma cultura - só milho, só trigo. Quando falamos em 'orgânico', não estamos nos limitando a apenas deixar de usar químicos, mas trabalhar com a diversidade, que nos permite ter comida sempre", compara Jandai. "Com a biodiversidade, uma coisa ajuda a outra. Não precisamos trabalhar tanto, nem precisamos comprar insumos. Se a gente usar químico, matamos o solo, e teríamos que usar cada vez mais químicos para corrigir." A atual crise de alimentos está expondo os limites do modelo de monocultivos regados a agrotóxicos e fertilizantes, que encarecem a produção. O Brasil, que é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, é um caso exemplar. Apesar do ótimo desempenho do agronegócio industrial, o país não consegue garantir a segurança alimentar nem da metade de sua própria população, com a fome sendo ainda mais aguda exatamente entre os trabalhadores rurais. Os impactos climáticos tornarão este quadro pior no futuro. Por essas limitações, o agronegócio industrial teme a ascensão de modelos de produção alternativos. Tanto que investe em campanhas globais de comunicação para demonizar a produção orgânica. Jornalistas e influenciadores que fazem parte deste lobby usaram, por exemplo, a crise alimentar no Sri Lanka para atacar a cultura orgânica em si em vez da forma como a política foi implementada naquele país. "A mentalidade das pessoas foi treinada para acreditar que se você não tem máquinas, não tem fertilizantes, não tem produtos químicos, não há agricultura. Isso é realmente um pensamento limitado, e é por isso que estamos em crise agora", afirma Jon Jandai. |