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Marco Civil tira Brasil da insegurança jurídica na internet

Stelleo Tolda

Especial para o UOL

05/04/2014 06h00

A aprovação do Marco Civil na Câmara dos Deputados é uma vitória da democracia. O projeto de lei, que agora segue para o Senado, coloca a sociedade brasileira em uma nova realidade quando o assunto é conteúdo na internet.

Depois de mais de 10 anos de dúvidas e anseios de quem provê espaços para criação e exposição de conteúdo gerado por terceiros - e também para quem julga processos sobre o assunto -, contaremos com uma lei que define as responsabilidades e os papéis de cada participante deste processo. Podemos todos conversar sobre liberdade de expressão na Internet com mais clareza e segurança jurídica.

O processo de consulta pública do Marco Civil inovou ao permitir que, através de uma página na própria internet, qualquer pessoa pudesse participar com ideias e opiniões. De forma ampla, diversos setores da sociedade contribuíram para a elaboração do texto do Marco Civil, incluindo a empresa que represento, o MercadoLivre. Para  marketplaces que oferecem um ambiente de anúncios de produtos, ou seja, que expõem conteúdo criado pelos usuários, o Marco Civil é de suma importância.

É necessário definir quem pode ou não ser responsabilizado pelos conteúdos gerados por terceiros – e em que casos o conteúdo deve ou não ser removido. O processo de notificação e remoção (notice and take down) é o que defendemos desde o início, por ser um avanço real em termos de segurança jurídica. E sempre defendemos também a não censura prévia, ou a liberdade de expressão na internet.

A intensa participação da sociedade nos debates sobre censura prévia, notificação e remoção de conteúdo na internet, além das consultas públicas para a criação do Marco Civil, me remetem a uma disciplina que estudei em meu curso de MBA: “Administração em Ambientes de Não Mercado”. Para um estudante de administração, esta disciplina parecia na época sem muito propósito, pois me interessava estudar o que se relacionava com o mercado, como economia, estratégia, marketing e operações.

No ambiente de não mercado são discutidos arranjos sociais, políticos e jurídicos que regulam as interações entre participantes do mercado. Foi um ledo engano pensar que as empresas não têm um papel a desempenhar na formatação da governança de seus setores. Considerando a internet e o comércio eletrônico, seria um engano ainda maior, tratando-se de um setor novo no qual a governança era uma página em branco.

O cenário que vivemos até a aprovação do Marco Civil foi exatamente este. Por meio da união de forças de vários setores (incluindo o governo), criamos esta governança. Depois de muito diálogo, agora estamos próximos de transformar em lei para o uso e o conteúdo da Internet. Para lidar com o vácuo de governança que havia antes do Marco Civil ser aprovado, empresas criaram políticas e regras próprias para evitar a censura prévia e, ao mesmo tempo, proteger os direitos autorais e a propriedade intelectual de marcas.

No MercadoLivre, criamos o Programa de Proteção à Propriedade Intelectual, já em linha com o “notice and take down”. O PPPI é, até hoje, um canal de comunicação com pessoas físicas e jurídicas, titulares de um direito de propriedade intelectual, para realizar denúncias de forma rápida e eficiente quando há necessidade de remoção de determinado conteúdo. Por meio do PPPI, fizemos nossa parte enquanto estávamos sem um marco regulatório claro. 

Dialogando com representantes do governo, empresários e acadêmicos, ajudamos a trazer o assunto ao cenário político e à pauta legislativa. Agora, estamos todos um passo à frente: o Brasil sairá da posição de incerteza jurídica para a segurança de dispor de uma lei para o uso da internet. Poderemos inclusive servir de exemplo, pois outros países da América Latina têm acompanhado de perto a discussão do Marco Civil e estão atentos à sua aprovação.

Temos orgulho de  participar como um dos protagonistas desse processo democrático e desta nova fase do país.

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