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Priorizar venda de commodities enfraquece economia brasileira

Especial para o UOL

12/05/2014 06h00

Não havia dúvidas de que, em alguns aspectos, a economia brasileira caminhava bem, com seu crescimento puxado pelo forte consumo do mercado interno.

Também é preciso reconhecer que, nos últimos anos, o país obteve resultados expressivos no que diz respeito às políticas sociais, tendo tirado mais de 20 milhões de brasileiros do estado de miséria, e elevado mais de 30 milhões à classe média. 

Por outro lado, alguns indicadores ainda nos envergonham e mostram que estamos muito distantes do mínimo necessário para nos considerarmos uma nação em desenvolvimento.

Como exemplo, podemos citar um quesito fundamental à saúde, que é o saneamento ambiental, cujos indicadores são alarmantes: aproximadamente 36 milhões de pessoas não têm acesso à água potável, 56% da população urbana brasileira não têm esgoto coletado etc..

Para universalizar o saneamento no Brasil seriam necessários investimentos de R$ 296 bilhões até 2025. Ou seja, o equivalente ao que gastamos com o pagamento de juros da dívida pública em aproximadamente um ano. Em saúde, educação, ciência e tecnologia a situação não é diferente. Nesses itens, o país gasta menos de um terço do que dispende com pagamento de juros e com o custo de carregamento das reservas. 

No que se refere à política industrial a situação também é extremamente preocupante, pois o atual modelo econômico nos empurra para uma "primarização" da economia. O fato é que o Brasil está priorizando a exportação de commodities em detrimento das vendas de bens de maior valor agregado.

Falta de competitividade

A título de ilustração, desde o século 19 o Brasil é o maior produtor mundial e exportador de grãos de café, mas o maior exportador de café industrializado é a Alemanha, que não possui um pé de café. Cerca de 75% da soja produzida no país é destinada ao mercado externo, enquanto as exportações de derivados de soja, que possuem maior valor agregado, caem ano a ano. 

Cabe lembrar que não existe nenhum país desenvolvido que seja basicamente exportador de commodities, mas existem países ricos e desenvolvidos que são fornecedores de máquinas e equipamentos para a industrialização de produtos primários.

O minério de ferro, que é o insumo utilizado para produzir aço, é um dos principais itens da nossa pauta de exportações. Por outro lado, a balança comercial dos setores que possuem o aço como principal matéria-prima (automóveis, máquinas, equipamentos etc.) é totalmente deficitária. No caso específico do setor de máquinas e equipamentos, o deficit acumulado de 2004 a 2013 é superior a US$ 60 bilhões.  

Temos mostrado, através de estudos bem fundamentados, que o Brasil é que não é competitivo. A falta de incentivo aos investimentos, o câmbio atual, a taxa de juros mais alta do mundo, o custo Brasil, a alta carga tributária e a ineficiência em nossa infraestrutura impõem à indústria brasileira de transformação uma perda de competitividade que pode vir a resultar na extinção de uma indústria que produz bens de alto valor agregado e conteúdo tecnológico, e que é responsável pela geração de milhões de empregos que exigem qualificação e que, portanto, pagam melhores salários.

Os números acima requerem uma reflexão por parte dos nossos governantes sobre a atual política macroeconômica, no sentido de projetar que tipo de país nós queremos e quais serão os efeitos desta política a médio e longo prazos. 

Um país com dimensões continentais e populoso como o Brasil precisa de muito mais. Tem que pensar e agir de forma grandiosa para vir a ser, de fato, um país mais justo, que gera e distribui riquezas, que educa e cuida da saúde do seu povo. Não me canso de repetir que não existe país desenvolvido que não tenha uma indústria de transformação forte.

"É evidente que nada contribui mais para promover o bem-estar público do que a exportação de bens manufaturados e a importação de matéria-prima estrangeira”. Esta frase, tão atual, foi parte de pronunciamento feito no parlamento britânico, em 1721. Esse pronunciamento mostra que o Brasil está indo na contramão do que os países ricos e desenvolvidos fizeram e continuam fazendo há mais de dois séculos. 

O Brasil pode e precisa caminhar em outra direção, estruturando políticas claras que possam contribuir para fazer do nosso país uma nação verdadeiramente desenvolvida, em todos os aspectos (cultural, social, educacional e econômico). É preciso simplificar e desburocratizar, criar condições para que o setor produtivo possa, de fato, se desenvolver e ter musculatura para ser competitivo nos mercados interno e externo. 

Não somos contra a produção e exportação de commodities, mas estamos convictos de que somente isso não será suficiente para gerar o superavit necessário na balança de pagamentos e a quantidade de empregos que uma nação tão populosa como a nossa necessita.

É possível fazermos as duas coisas (commodities e indústria), mas o governo tem que ter senso de urgência, precisa implementar medidas em caráter emergencial, pois corremos o risco de perder a maior, e talvez única, oportunidade da nossa história, para fazer do Brasil uma nação desenvolvida. 

Do contrário, retrocederemos no tempo - época do Brasil colonial - em que exportávamos pau-brasil e café para importarmos espelhinhos e bijuterias. Ainda dá tempo, é possível reverter o atual quadro de desindustrialização, mas os nossos governantes precisam comunicar imediatamente que tipo de Brasil desejam: rico e desenvolvido ou eternamente uma colônia pobre?

As opções existem. Nós, da Abimaq, continuaremos lutando por um Brasil que se transforme em uma potência econômica, com uma indústria de transformação forte, afastando o risco de nos tornarmos um Brasil-Colônia. 

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