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Gestantes devem opinar sobre procedimentos médicos do parto

Especial para o UOL

21/06/2014 06h00

O nascimento de um filho é um momento inesquecível na vida de toda mulher. E para que esse acontecimento ocorra com segurança para a saúde da mãe e do bebê, a mulher deve ser a protagonista do próprio parto, de maneira a impor seus desejos e expor suas angústias.

O chamado parto humanizado define a mulher como personagem principal do evento e, por isso, cabe a ela a decisão sobre qualquer ato médico: qual procedimento será feito, quem irá acompanhá-la, se haverá uso ou não de medicamentos analgésicos.

Em 28 de maio foram comemorados o Dia Internacional de Ação pela Saúde das Mulheres e o Dia Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Infantil. Porém, não há o que celebrar para as brasileiras.

Segundo levantamento da Fundação Perseu Abramo, em 2010, 25% das mulheres que tiveram filhos pelas vias naturais na rede pública e particular de saúde sofreram violência obstétrica. Entre os pontos citados pelas vítimas como abuso está a falta de informação sobre algum procedimento médico que seria realizado.

Impedir a presença de acompanhante no momento do parto, deixar de oferecer métodos naturais para aliviar a dor, acelerar o parto sem necessidade, realizar exames de toque sucessivos e por diferentes pessoas, e dificultar ou retardar o contato do bebê com a mulher logo após o parto são algumas das ações nos hospitais consideradas violência obstétrica.

Comentários agressivos, ameaças, tortura psicológica, discriminação racial e socioeconômica são outros relatos denunciados pelas gestantes brasileiras.

Diante desse cenário vergonhoso contra a saúde da mulher, é clara a necessidade de iniciativas que preservem o direito da mãe em opinar sobre cada procedimento do parto.

No ano passado, apresentei à Assembleia Legislativa de São Paulo um projeto de lei sobre o parto humanizado (PL 738/2013), que visa a instituir em todo o Estado o Programa de Orientação em Saúde e Atendimento Social às Gestantes, e implantar medidas de informação sobre a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal.

O texto prevê a obrigatoriedade de a gestante ser informada por um médico obstetra de que ela tem direito à elaboração de um “Plano Individual de Parto”.

Nesse plano é relacionado o que ela gostaria ou não que acontecesse durante seu trabalho de parto, o pós-parto, além de cuidados com o recém-nascido. A gravidez é o momento mais especial na vida de uma mulher, onde suas vontades devem ser respeitadas.

Felizmente, a necessidade de cuidado com a saúde da gestante brasileira foi atendida pelo Ministério da Saúde, que recentemente lançou uma portaria com novas regras para o incentivo financeiro federal por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Agora, o hospital que oferecer, no momento do parto, métodos para o alívio da dor que não sejam apenas medicamentos (como massagens, banheira e bola de pilates) e evitar situações como episiotomias (corte do períneo), a indução do parto e o parto cesariano, entre outros critérios, terá acréscimo no pagamento feito pelo SUS. Além da possibilidade de receber a classificação de Hospital Amigo da Criança.

Outras exigências para que o hospital receba maior contrapartida financeira do SUS são: garantia de acesso dos pais ao bebê recém-nascido durante as 24 horas do dia, incentivo para que a mãe escolha a posição em que quer ter o filho (a não ser que haja indicação médica em contrário) e a autorização para que uma doula acompanhe o parto, desde que seja uma rotina daquele local.

Cesáreas

Medidas que incentivem o cuidado com a gestante e com seu bebê no momento do parto devem ser prioridades para aqueles que atuam na administração pública. A iniciativa do Ministério da Saúde é positiva, mas ainda não é suficiente. Devemos sempre estar atentos para ações que visem o bem-estar da sociedade feminina e ajudem a combater os erros e abusos médicos nesse momento tão especial para a mulher.

Dados revelados pelo ministério em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz indicam que a porcentagem de cesáreas em relação ao número total de partos no Brasil quase quadruplicou nas últimas quatro décadas - de 14,5%, nos anos 1970, para 52%, em 2010.

Na rede privada de saúde, este índice é ainda maior: 88% do total de partos são cesáreas, enquanto a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de um máximo de 15%.

Estudos internacionais vêm demonstrando os riscos da cesariana desnecessária para o recém-nascido e seu impacto na saúde reprodutiva futura da mulher, como o aumento da mortalidade neonatal, hemorragias, infecções e danos a órgãos internos da gestante.

A desvalorização do parto humanizado ainda é uma realidade no Brasil, e precisamos mudá-la. É essencial o apoio da população a propostas que visem à prioridade de escolha pela mulher de todo o procedimento do parto.

E meu projeto de lei tem como objetivo garantir que as mães possam desfrutar com tranquilidade e dignidade desse momento único. É preciso continuar evoluindo nos cuidados com a mulher gestante. Para isso, o poder público e a vontade da sociedade devem caminhar juntos. Como deputada por São Paulo e como mãe, garanto que não me faltarão forças para continuar nessa batalha.

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