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Marco Civil da Internet beneficia especialmente os usuários

Especial para o UOL

13/07/2014 06h00

Passa a valer o Marco Civil da Internet consagrando aspectos que antes, por falta de previsão legal, amparavam-se em recomendações do Comitê Gestor da Internet (CGI), leis estrangeiras, interpretações de nossos tribunais e, em alguns casos, disposições legais esparsas.

O Marco Civil, por seu pioneirismo em amplitude de escopo e de aplicações, destaca um grande avanço do Brasil, especialmente por seu caráter inovador, servindo inclusive como inspiração para demais países da América Latina.

A partir de agora, o Brasil possui uma legislação ampla, que estabelece não apenas a atuação do poder público, como também obrigações e direitos, identifica termos técnicos, agentes, procedimentos sobre uso e armazenamento de dados, assim como sanções.

Provedores de internet passaram a ser identificados em 2 categorias: os de conexão, cuja função é autoexplicativa, e os de aplicações, que representam os prestadores de todos os demais serviços, que não seja a própria conectividade.

Estão sujeitas ao Marco Civil quaisquer operações de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de dados pessoais e de comunição digital em que pelo menos um dos atos ocorra em território nacional. Também se aplica a lei às empresas com sede no exterior, desde que prestem serviços ao público brasileiro ou haja integrante do mesmo grupo com estabelecimento no Brasil.

Dentre os princípios do Marco Civil, merecem destaque a garantia da neutralidade da rede, através do qual provedores de conexão não podem realizar qualquer forma de distinção por conteúdo, origem ou destino para transmissões, e a garantia à proteção de dados pessoais.

A coleta e uso de dados dependerá do expresso consentimento do usuário, cujo formato aceitável ainda não foi definido. Resta a dúvida se bastará incluir políticas de uso em websites, com botões “eu aceito” (opt-in) e, para provedores de conexão, se deverá haver assinatura de contrato impresso para formalização do consentimento. De toda forma, dados obtidos pelos provedores só poderão ser disponibilizados mediante ordem judicial.

Também de enorme relevância foi o estabelecimento do prazo de guarda de dados. Antes da nova lei, recomendava-se seguir as instruções do CGI, com armazenamento por 3 anos. Agora, provedores de conexão devem manter registros por 1 ano, já os de aplicações deverão manter os dados por 6 meses.

Outra dúvida finalmente sanada e ponto de destaque no Marco Civil está relacionada à responsabilidade dos provedores por conteúdo de terceiros. Seguindo a tendência jurisprudencial e prática internacional, o provedor de aplicações somente poderá ser responsabilizado por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial, ou da notificação em caso de material reproduzindo sexo ou nudez, não tomar as medidas necessárias para tornar indisponível o conteúdo indicado como infringente.

Infrações às obrigações de sigilo de dados pessoais ou de comunicação poderão levar os provedores ao recebimento de advertências, multa, suspensão temporária de suas atividades ou até mesmo a proibição do seu exercício.

Não passou sem observação legal a associação do direito consumerista às relações digitais, sendo incluído o respeito à defesa do consumidor como um dos fundamentos para uso da internet no Brasil, assim como uma garantia para os usuários.

Havendo essa associação expressa, um ponto a ser debatido é a possibilidade de interpretar que um usuário da internet seja uma pessoa jurídica, e, nessa qualidade, que seus dados não públicos eventualmente armazenados por um provedor também sejam informações sujeitas à proteção dada pelo Marco Civil.

Ainda por vir, aguardaremos a promulgação de decreto presidencial que regulamentará procedimento de apuração de infrações, norma que indique exceções para discriminação do tráfego de informações na internet, assim como lei específica sobre a responsabilidade do provedor de aplicações por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros relacionados a direitos autorais e conexos.

Como toda nova lei,  em especial uma com foco tão moderno, dinâmico e repleta de termos técnicos até então pouco usuais em leis brasileiras, diversos aspectos ainda precisarão ser observados pela doutrina e pelos tribunais para que haja melhor interpretação de seus termos.

Apesar das pendências, muitas são as conquistas e resoluções de aspectos até então imprecisos, que se alongaram durante a história da internet no Brasil. Com o fim de tantas dúvidas, ganha o judiciário, ganham os provedores e, principalmente, ganham os usuários.

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