Topo

Lei brasileira de gestão de resíduos é avançada, mas municípios evitam cumpri-la

Especial para o UOL

17/08/2014 06h00

O sistema de gestão de resíduos de um país é um dos principais componentes que garantem sua proteção ambiental e também a preservação de recursos naturais que, como sabido, são finitos.

No Brasil, a Constituição garante, desde 1988, o direito da coletividade por um meio ambiente equilibrado e impõe como dever de todos a sua defesa para atuais e futuras gerações.

A lei nº 6.938, que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente em 1981, definiu o conceito de poluição e poluidor e determinou as penalidades aplicáveis nos casos de degradação ambiental. Já a Lei de Crimes Ambientais, sancionada em 1998, elevou os danos ao meio ambiente à condição criminal e estabeleceu penas para os transgressores.

A partir das informações do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2013, publicado pela Abrelpe (associação de empresas de limpeza pública), constata-se que a gestão de resíduos sólidos tem trazido graves prejuízos ambientais e econômicos para o Brasil, pois ela ainda é deficitária e não tem avançado de maneira uniforme nas diversas regiões do país.

Conforme os dados mais recentes, em 2013 foram geradas 76,4 milhões de toneladas de lixo, que ainda carecem de uma coleta universalizada, pois cerca de 100 gramas por habitante por dia sequer são coletados. Além disso, um percentual elevado dos resíduos coletados (42%) ainda é encaminhado para destinos inadequados, utilizados por mais de 3300 municípios, em sua maioria de pequeno porte.

A coleta seletiva, por sua vez, ainda não se tornou uma prática no país, apesar de ser um elemento indispensável para viabilizar a recuperação dos materiais descartados e seu posterior encaminhamento para processos de reciclagem e aproveitamento.

Essa situação traz perdas consideráveis para o Brasil, pois o sistema adotado é economicamente ineficiente e desperdiça o potencial de recursos materiais e energéticos presentes nos resíduos descartados.

O ano de 2014 impõe-se como um marco para o setor de resíduos sólidos no Brasil. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela lei nº 12.305/2010, concedeu prazo até o mês de agosto para que a destinação final ambientalmente adequada dos resíduos e rejeitos fosse implantada no país.

No entanto, essa lei é muito mais abrangente do que apenas a obrigatoriedade de fechamento dos lixões e demais locais assemelhados. Reduzir a PNRS a esse único ponto é o mesmo que deixá-la em estado vegetativo. Ou seja, as funções continuam ativas, porém sem inteligência alguma.

Destinação adequada

As soluções e os caminhos para o problema dos resíduos são amplamente conhecidos: eliminação de lixões, implantação de aterros sanitários, efetivação dos sistemas de coleta seletiva, estabelecimento de sistemas de logística reversa – com responsabilidade dos produtores, e também viabilização de plantas de recuperação e aproveitamento dos resíduos.

Vários países já estabeleceram parâmetros e percorreram os caminhos que possibilitaram o equacionamento das diversas situações para solução dos problemas causados pelos resíduos sólidos, com a interação entre os principais envolvidos, sejam eles de direito público ou privado.

Até o momento, nenhum esforço claro foi feito no país para assegurar a aplicação e a efetividade da lei. Exceto por algumas iniciativas pontuais, desde a sanção da PNRS as discussões foram muito mais no sentido de contestá-la e postergar sua execução, movimento que ganha força com o encerramento da moratória graciosamente concedida pelo Legislativo em 2010.

Vale ressaltar, porém, que esse movimento e as iniciativas dele decorrentes não terão nenhum efeito prático, nem para estimular ou garantir as mudanças necessárias para a superação do deficit atual, nem para isentar os administradores municipais dos possíveis processos e penalidades previstas no ordenamento jurídico brasileiro.

Isso porque, como mencionado acima, há um conjunto de instrumentos legais, além da PNRS, que reúne uma série de disposições direcionadas à proibição e punição de práticas que atentem contra o meio ambiente. Acima de todas elas está a Constituição, sobre a qual não pairam dúvidas acerca da expressa aplicabilidade nesse tema.

Discutíveis, assim, as ações que vêm atender interesses de última hora em detrimento de direitos consolidados da sociedade.

O Brasil, a despeito de contar com uma das legislações mais avançadas sobre o tema, ainda carece de uma evolução institucional e priorização desse assunto, mediante o comprometimento da sociedade, que não percebeu os riscos de sua omissão. 

  • O texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
  • Para enviar seu artigo, escreva para uolopiniao@uol.com.br