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Só o fim da reeleição pode devolver dignidade aos cargos políticos

Especial para o UOL

16/09/2014 06h00

Qual a relação entre reeleição e corrupção? Parecem temas distintos, mas no Brasil não são. O último relatório da Fiesp (federação das indústrias de São Paulo), de 2012, anunciou que o custo médio da corrupção no país em 2010 ficou entre 1,38% e 2,3% do PIB - R$ 50,8 bilhões a R$ 84,5 bilhões. Dinheiro que construiria centenas de hospitais, escolas e moradias, ou seja, o que realmente precisamos. Acreditem, a roubalheira pública, a disseminação da impunidade e o nepotismo estão enraizados e multiplicados por um sistema político corrompido que não se renova.

A cada eleição, que também custa milhões aos cofres públicos, recolocamos as mesmas pessoas e perpetuamos o processo viciante da política brasileira. Um sistema que degenera com o tempo, em razão dos seus abomináveis e seculares vícios, gerados pela corrupção, que começa pela deturpação dos seus princípios. “A corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus princípios” (Barão de Montesquieu).

O fim da reeleição é a única maneira de restabelecer a dignidade dos cargos políticos, com gente competente e preparada, que saiba enfrentar adequadamente os problemas do país.

Não é a dilatação do prazo que vai fazer com que uma administração desastrada ou desonesta se conserte. Todo programa de governo previamente planejado deve ser executado no período legal do mandato.

A não reeleição evita que o político faça conchavos e acertos escusos para se perpetuar no poder. A política, para ser saudável e sustentável, não pode ser profissão, muito menos perpétua.

A proibição da reeleição favorece o princípio republicano da renovação e alternância do poder. É preciso continuamente abrir espaço para o surgimento de novas lideranças políticas, acabando-se com o feudalismo vigente na estrutura dos partidos, cujos fundadores ou chefes fazem deles propriedade particular. Na democracia, quanto mais renovação nos comandos, menos espaço se proporciona ao continuísmo ditatorial ou feudal.

O político - seja ele do Executivo ou do Legislativo - que não executa seus projetos ou ideias dentro do prazo legal do mandato revela, desde logo, um péssimo planejamento ou incompetência para o exercício da função pública.

O Parlamento e o Executivo, nos regimes democráticos, devem ser exercidos sempre de forma transitória. O fim do político profissional não significa acabar com o profissionalismo necessário do serviço ou do servidor público, cuja expertise deve ser aproveitada da melhor forma possível na realização dos programas de cada governo ou de cada mandato.

A não reeleição dos políticos, ademais, viria acabar com todas as intermináveis discussões judiciais sobre as inelegibilidades geradas pela Lei da Ficha Limpa, que foi uma conquista muito relevante, mas insuficiente para promover a necessária limpeza e renovação constante dos políticos. Como exige a verdadeira democracia, que jamais pode servir de trampolim para carreiras ditatoriais, coronelistas ou feudais nem tampouco para gerar ganhos ilícitos em favor de alguns setores dos donos do poder.

Fim do político profissional

Nenhuma nação tem prosperidade enquanto governada por pessoas despreparadas ou contaminadas, que querem se perpetuar no poder apenas para manter suas regalias, mordomias e privilégios. São teratológicos casos como de José Sarney, Paulo Maluf, Renan Calheiros, Fernando Collor e tantos outros, que estão na política há mais de quatro décadas.

Perplexo com o que vivemos, criamos um movimento de iniciativa popular que defende a necessidade urgente de uma ampla reforma política (fimdareeleição.com.br). Nele, basicamente defendemos o fim da reeleição para todos os cargos eletivos. Nenhum político pode abandonar sua profissão particular e a possibilidade de destituição pelo povo do político incompetente ou desonesto, mesmo antes do fim do mandato.

Vamos levar nosso pedido ao Congresso Nacional e exigir, com a força da população, que seja aprovada uma Emenda Constitucional que elimine a reeleição. Parafraseando Martin Luther King, “O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que me preocupa é o silêncio dos bons”. Nesse equívoco não podemos cair.

Desejamos que o político seja um excelente e honrado servidor público, mas que não se perpetue no cargo eletivo, criando raízes com o nepotismo, patrimonialismo, fisiologismo, clientelismo e a corrupção.

Todos os mandatos deveriam ter o mesmo tempo de exercício (4 ou 5 anos, no máximo), sem nenhuma possibilidade de reeleição. Esse período é mais do que razoável para o político colocar em prática suas ideias e promessas e mostrar sua competência, seriedade e exemplaridade.

Os bons políticos, depois do mandato, podem até se converter em políticos orgânicos (internos dos partidos), mas não institucionais. É preciso romper o enraizamento do político com a máquina pública corrompida que aqui se instalou desde 1822. Quanto mais tempo o político exerce cargo público, maior o risco de contaminação, sobretudo com seus financiadores, que nunca fazem “doações”, mas sim “investimentos”.

O fim da reeleição no Brasil é o início de uma política mais transparente e cidadã, que visa a servir a população e não os interesses privados.

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