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Fechamento de maternidades torna sonho de dar à luz em pesadelo

Especial para o UOL

10/10/2014 06h00

A falta de leitos em maternidades é um mal crônico e crescente em todo o Brasil, trazendo prejuízo a futuras mães, recém-nascidos e familiares. Recentemente a maior unidade para neonatos do Piauí virou notícia em todo o país por amontoar vários bebês em um só berço.

A superlotação se repete há anos em todo o território nacional, inclusive provocando tragédias, como a que ocorreu em Alagoas, quando a UTI neonatal do Hospital Universitário de Maceió foi fechada por conta de oito mortes causadas pela superbactéria Acinetobacter.

O mais grave é que não existe uma só evidência de que o cenário poderá melhorar, nem a médio prazo. Pelo contrário, o caos só aumenta em virtude do fechamento de maternidades em diversas regiões e estados.

Um levantamento divulgado em setembro de 2013 pelo Conselho Federal de Medicina apontou a redução de 3431 leitos obstétricos do Sistema Único de Saúde desde 2010.

Nem São Paulo, o Estado mais rico do país, apresenta um quadro adequado para a segurança de gestantes e crianças. Nos últimos cinco anos, 17 maternidades fecharam, tornando o sonho de dar à luz em pesadelo. Já há relatos de grávidas que são obrigadas a percorrer centenas de quilômetros para parir, pois suas cidades encerraram esse tipo de serviço.

Extremamente preocupante no SUS, a perda de vagas para gestantes é ainda mais alarmante no sistema suplementar. São Paulo é exemplo concreto de tal fenômeno: das unidades fechadas em meia década, somente uma (do hospital Stella Maris, em Guarulhos) prestava atendimento a pacientes da rede pública, sendo as demais exclusivas para pacientes de planos de saúde e particulares.

Nesse caso específico, pasmem, o importante problema de saúde materno-infantil é tratado como coisa menor. O que abala boa parte dos hospitais é o aspecto econômico. Maternidade não gera lucro, pois o tempo de internação é curto, além de os pacientes não necessitarem, em regra, de procedimentos e medicamentos caros.

Outro agravante são as remunerações pagas pelos planos de saúde, que são irrisórias e transformam toda operação em uma semeadura de deficits.

Hoje, vemos leitos de maternidades fechados para possibilitar a abertura de outros mais rentáveis, como os oncológicos. É a saúde tratada meramente sob a ótica mercantilista, que deixa vulneráveis os pacientes e seus familiares que, diante de problema de tal magnitude, sofrem sequelas de todo o tipo em função da grande ansiedade que envolve tal carência.

Já que está explícito que a atenção materno-infantil é financeiramente desinteressante, cabe-nos um chamado à consciência de nossos gestores, aos donos de hospitais particulares e aos planos de saúde.

É de grande relevância considerar que o bom atendimento pediátrico, iniciado nas maternidades, acarreta na redução de custos com internações e procedimentos diagnósticos e terapêuticos no futuro.

Sob o ponto de vista humanístico e assistencial (o que de fato deve prevalecer), é essencial levar em conta que, em se tratando de gestantes, a demora para realização de exames e de condutas sequenciais pertinentes é muito preocupante, e pode resultar em risco à saúde e à vida.

O adequado atendimento obstétrico e pediátrico representa, acima de tudo, investimento na qualidade de vida durante a infância e de toda a população em idade produtiva, beneficiando a coletividade.

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