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Com pena de morte, Indonésia está na contramão da história

Especial para o UOL

17/01/2015 06h00

Marco Archer se tornará o primeiro brasileiro a ser executado por um governo estrangeiro. Ele foi condenado ao pelotão de fuzilamento na Indonésia e seus apelos jurídicos foram negados. A Anistia Internacional repudia a pena de morte em qualquer circunstância e lançou uma mobilização para que a sentença não seja aplicada, e para que o Estado indonésio apresente uma forma alternativa de punição, que não passe por esse assassinato a sangue frio, conduzido por agentes públicos. 

É uma forma de castigo cruel, desumana e degradante, uma violação do direito à vida. Sua aplicação recai de modo desproporcional sobre os grupos mais vulneráveis em cada sociedade: pobres e minorias étnicas/religiosas.

Marco teve sua execução agendada para este fim de semana, junto com outras cinco pessoas, da própria Indonésia e da Holanda, Nigéria e Vietnã. Todos foram condenados por tráfico de drogas. Os fuzilamentos fazem parte de uma política do novo presidente do país de aumentar a aplicação da pena de morte, usando as vidas dos prisioneiros como um instrumento de propaganda.

A Indonésia está na contramão da história. Cerca de 140 países não têm mais a pena de morte ou não a aplicam na prática. Há quatro tratados internacionais (ONU, Organização dos Estados Americanos e dois da União Europeia) que estipulam sua abolição total ou parcial, e resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas recomendando a moratória em seu uso.

Opinião - anistia - Divulgação - Divulgação
Marco Archer Cardoso Moreira (dir.) está condenado à morte na Indonésia
Imagem: Divulgação

Há poucos países que resistem a isso, como China, Arábia Saudita, Irã e Iraque. Estados Unidos e Japão são as únicas nações ricas que ainda a utilizam, embora diversos Estados americanos tenham abolido essa forma de punição.  

O Brasil aboliu a pena de morte para crimes comuns na primeira Constituição republicana, em 1891. Manteve-a apenas em tempo de guerra. Na prática, não a aplicava desde o fim do império, após Pedro II ter ficado chocado com um caso de erro judiciário no qual um inocente foi executado por assassinato. A ditadura militar a reestabeleceu, mas não a usou oficialmente. Os opositores que assassinou foram mortos em execuções extrajudiciais, sem passar por processos jurídicos.

O medo diante do crime às vezes leva as pessoas a apoiarem a pena de morte como uma suposta solução mágica que as deixaria seguras. Isso é uma ilusão. O caminho rumo a políticas eficazes de segurança é longo e difícil e passa por medidas como a construção de forças policiais bem entrosadas com a comunidade, um judiciário eficiente e a eliminação de condições de pobreza e discriminação que fomentam a violência. No próprio caso do tráfico de drogas – tema central nas execuções na Indonésia – diversos países experimentam alternativas à abordagem da repressão total, passando por distintas formas de tratá-las como uma questão de saúde pública, e não de crime.

O governo brasileiro agiu corretamente, com esforços para proteger Marco e impedir sua execução. É uma tarefa difícil pela intransigência das autoridades indonésias e pela manipulação política do tema naquele país.

Além das execuções agendadas para este fim de semana, há 160 pessoas no corredor da morte da Indonésia, incluindo outro brasileiro, Rodrigo Gularte, cujo caso é bastante parecido com o de Marco. Já perdemos muitos compatriotas na violência insana que leva milhares de vidas a cada ano. Podemos e devemos evitar a morte de outros.

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