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Cobrança por sacolinhas contraria o Código do Consumidor

Especial para o UOL

17/04/2015 06h00

Se não tem caminhão de coleta seletiva em bairros como São Mateus, Artur Alvim, Guaianazes, São Miguel, Itaquera, Cidade Tiradentes, Jardim Ângela, Jardim Miriam, Heliópolis, Parada de Taipas, Freguesia do Ó, Ermelino Matarazzo, Paraisópolis, por que o consumidor está obrigado a comprar as “sacolinhas do Haddad” nos supermercados, para separar o lixo?

O povo vai gastar dinheiro comprando as sacolinhas, vai gastar seu tempo separando lixo e o caminhão da coleta comum vem e mistura tudo, levando para o aterro sanitário.

Pois bem: essa lei da cobrança das sacolas na cidade de São Paulo não é definitiva. O STF ainda dará a última palavra, e o consumidor deve guardar os comprovantes de que pagou pelas sacolas – pois quando do julgamento final o consumidor poderá exigir do supermercado e da prefeitura a restituição em dobro o que pagou pelas “sacolinhas do Haddad”.

Se não conseguir receber, o consumidor pode ingressar com ação no Juizado Especial da Fazenda, e processar tanto o supermercado quanto a Prefeitura de São Paulo. Esse processo é gratuito, e se o valor não ultrapassar 40 salários mínimos não precisa de advogado.

Não sei e não tenho ideia de quem está ganhando com a implantação da cobrança! Mas sei quem está perdendo: o consumidor! É ele que está pagando caríssimo pelas tais sacolinhas inventadas por um prefeito – que acha que uma atitude simplória de fazer o consumidor pagar de 8 a 10 centavos por cada sacolinha padronizada salvará o planeta.

Se é o consumidor quem vai bancar todo o sistema, ele deveria ter sido ouvido. Nenhuma entidade de defesa do consumidor, nem mesmo Procon, Ministério Público do Consumidor ou Defensoria Pública do Consumidor foram chamados pelo prefeito para discutir o assunto. E isso é muito sério. E, para esse tipo de coisa, o consumidor tem memória de elefante quando quer encontrar água.

Nem eu, nem os quase 15 milhos de consumidores-eleitores da cidade de São Paulo, somos contra a preservação do meio ambiente. Todos somos a favor das sacolinhas padronizadas, desde que o consumidor não tenha que pagar sozinho a conta.

Desde o ano de 2012 venho brigando contra a Apas (Associação Paulista de Supermercados) e contra as maiores redes de supermercados de São Paulo para que não cobrem pelas sacolinhas, porque o preço delas já está embutido no preço dos produtos. Portanto elas não são de graça. E agora, cobrar mais 10 centavos por elas significa cobrar em duplicidade, o que contraria o Código do Consumidor.

Prejuízo ao consumidor

O consumidor já está sofrendo com o aumento da conta da água, da conta da luz, telefone e gêneros alimentícios, e agora vem o prefeito e traz mais essa despesa para o carrinho de compras do paulistano.

Ao que parece, o povo não está gostando. Pesquisa Datafolha mostra que 80% dos paulistanos são contra o consumidor ter de pagar por sacolas para transportar suas compras. Na opinião de 79% dos entrevistados, esse custo deveria ser bancado pela prefeitura de São Paulo e pelos supermercados. E 79% acreditam que terão maior gasto com a compra de saco de lixo.

E é verdade. Se o prefeito inventou a tal sacolinha padronizada, que custa mais para os supermercados, ele também deveria arcar com parte dessa despesa. Mas ele diz que deixou os supermercados livres para cobrar.

Eis a palavra mágica que a Apas tanto queria ouvir. E soou como música aos seus ouvidos: o consumidor vai pagar pelas sacolas! Bastou ouvir isso para que supermercados se apressassem em abrir suas caixas de maldades de Pandora e partissem para lucrar mais ainda em cima do consumidor, cobrando 8, 10 e até 15 centavos pelas sacolinhas.  

Todos nós temos a responsabilidade de transformar São Paulo em uma cidade sustentável, porque isso é um direito previsto no Estatuto da Cidade. E isso não é nada do que os eco-chatos, bucólicos do tipo carvalianos, em seus devaneios saudosistas imaginam. Eles vivem num mundo de Alice.

E nós, paulistanos vivemos com os pés fincados no chão. Queremos sim deixar uma cidade melhor para nossos filhos e netos, mas não precisa tirar o pão de nossa mesa para colocar na mesa dos empresários supermercadistas lucrarem.

Somos todos pelas “medidas mitigadoras que visam uma melhor pegada ecológica urbana, como o menor consumo de energia, adoção de matriz de energias renováveis, reciclagem de lixo urbano, aumento do gradiente verde das cidades e reúso de águas” (Carlos Leite, em Cidades sustentáveis? Desafios e oportunidades”).

Essa lição de casa nós já estamos fazendo. Mas cobrar do consumidor a conta da sustentabilidade inventada por Haddad, quando o consumidor não é o único que vive na cidade, é, no mínimo, desrespeito aos cidadãos.

Pois bem: nos idos anos 1980, quando o preço da carne subiu, os consumidores simplesmente fizeram boicote. A carne apareceu e os preços voltaram ao normal. Agora é hora: Se 80% dos consumidores não aceitam pagar pelas sacolinhas, que as boicotem, não aceitem pagar.

Desafio o prefeito a ter a coragem de, enquanto não tiver coleta seletiva em toda a cidade, desobrigar os supermercados de regiões não servidas pela coleta de seguir a norma. A lei de resíduos sólidos não obriga o cidadão a separar lixo usando o sistema de “sacolinhas do Haddad”, ainda mais se na cidade não houver coleta seletiva.

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