Caráter punitivo da Lei de Cotas esconde talentos de deficientes
No Brasil, ainda é um desafio cumprir a Lei de Cotas para empregar pessoas com deficiência (PcD). Em abril, comemoramos a conscientização sobre o autismo e, especialmente neste momento, vale a pena lembrar o tema de discussão estabelecido pela ONU para o ano de 2015: o emprego.
O artigo 27 da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiências (PcD) reconhece o direito ao trabalho de pessoas com deficiências nas mesmas bases que para todas as pessoas. A Organização Internacional do Trabalho, por sua vez, publicou em 2014 o estudo “Business as unusual: Making workplaces inclusive of people with disabilities”.
De acordo com o documento, a inclusão de PcD no mercado de trabalho representa um diferencial competitivo para as empresas. “Não é a coisa mais certa a ser feita, é a coisa mais inteligente”. Uma das falas retiradas de estudos de casos de grandes empresas como IBM, L’Oréal e Novartis provoca aqueles empresários que pouco se dispõem a investir, aprender e até se surpreender com resultados inesperados da inclusão de PcD nos ambientes de trabalho – como melhora no clima organizacional e melhor aceitação da marca pelo público que, de um modo geral, é sensível às causas humanas.
No Brasil, muitos empresários reclamam que não encontram pessoas com deficiências capacitadas e perdem a oportunidade de perceber que a ideia não é encontrar os campeões que superaram suas deficiências de modo a serem equiparados aos “normais”, mas de ajudar a construir as pontes para aqueles que estão fora da sociedade e que, de alguma forma, também podem contribuir. Não é caridade. É um modelo de sociedade.
O emprego e inclusão social de PcD são parte de um processo, portanto, que começa com a quebra de mitos e crenças equivocadas, fase na qual o conhecimento das organizações e associações de PcD pode ajudar muito. Mas, infelizmente, não é o suficiente. Medidas como incentivos às ações de responsabilidade social das empresas e a Lei de Cotas, por exemplo, são as que produzem impacto mais direto.
Um estudo da FGV, de 2003, revelou que no Brasil apenas 2% do total da força de trabalho possuía algum tipo de deficiência. Dos 27 Estados e Distrito Federal, apenas 5 tinham mais PcD empregadas do que a média nacional. Eram eles: Rio Grande do Sul (3,1%), São Paulo (2,73%), Distrito Federal (2,19%), Espírito Santo (2,19%) e Paraná (2,13%). Os que se posicionavam com percentuais mais baixos que a média nacional eram Rondônia (0,57%), Tocantins (0,55%) e Piauí (0,63%).
A Lei de Cotas cria um impacto direto sobre a oferta de emprego para PcD, porém seu caráter punitivo coloca em risco a principal ideia de que elas devem ser contratadas pelas mesmas razões que se contrata qualquer pessoa: suas habilidades e talentos.
Muitos empresários admitem que, se não houvesse a Lei de Cotas, nem teriam começado a pensar no assunto. Hoje eles enfrentam esse tipo de exigência da sociedade e, aos poucos, vão se adaptando e quebrando as inúmeras barreiras que as pessoas com deficiência enfrentam todos os dias, até mesmo antes de cogitar ter um emprego.
Se todos os argumentos, políticas e legislação para oferecer uma vida digna às pessoas com deficiência não forem suficientes, dados apresentados na Newsletter da Global Business & Disability Network, da Organização Internacional do Trabalho, afirmam que existem 1,3 bilhão de pessoas com deficiências no mundo, e que 2,2 bilhões de familiares e amigos controlam cerca de US$ 8 trilhões por ano em renda disponível. Definitivamente, organizar as empresas para acomodar, incluir e acolher pessoas com deficiências é uma atitude inteligente, além de ser economicamente atraente.
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