Fortes indícios de abuso desmantelam a imagem do Carf
Nesse momento em que o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) passa a ganhar notoriedade, não pelos grandes serviços prestados à sociedade, mas em razão de uma operação policial batizada de Zelotes, é preciso muita reflexão e alguma dose de parcimônia.
Decisões tomadas no calor das discussões, em regra, acabam se mostrando precipitadas e causam prejuízos que poderiam ser evitados. Não se nega que a hora é de repensar o órgão, mas não de assassiná-lo, o que certamente trará prejuízos que serão sentidos pela própria sociedade no futuro.
É preciso, em primeiro lugar, elogiar a atuação da Polícia Federal e do MPF, órgãos que vêm se destacando por atuações sérias e de resultados concretos. Portanto, não se pode negar a importância da Operação Zelotes, não apenas por revelar crimes cometidos no passado, mas também por suscitar o debate acerca de mudanças que certamente devem ser implementadas.
É justamente esse o ponto que se pretende aqui abordar, sem a pretensão de indicar soluções ou de condenar ideias. O objetivo é apenas e tão somente contribuir para o debate.
O maior destaque do Carf, me parece, é a sua composição paritária. O órgão é conhecido pela proficuidade de suas discussões, que envolvem fisco e contribuintes em quase paridade de armas. Digo quase porque o voto de qualidade (ou de desempate) é proferido pelo fisco, consequência lógica da natureza do Tribunal que atua como instância de revisão do ato administrativo.
As decisões lá proferidas são, portanto, administrativas. Justamente por isso a Fazenda não pode se socorrer do poder Judiciário para buscar a reforma de uma decisão proferida no Carf. Não se concebe o órgão sem essa paridade.
Transformá-lo em uma segunda instância de revisão terá apenas o efeito de criar uma fase formal anterior ao Judiciário, que se verá obrigado a decidir questões técnicas e complexas - não que os Juízes Federais não disponham dessa competência -, que poderiam ter se encerrado sem que a máquina pública fosse novamente movimentada.
Em que pese a relevância da instituição, não há como evadir-se de uma triste realidade. Os fortes indícios de abusos que circundam o órgão desmantelam a sua imagem e reduzem a sua estima. Assim como antes de se reformar um edifício tem que se apurar a extensão dos danos à sua estrutura, não há como falar em repensar o Carf sem que a Operação Zelotes seja levada a cabo.
Os responsáveis pelo esquema de sonegação fiscal devem ser devidamente processados e punidos. Somente assim poderemos ponderar com clareza e calma as possíveis alterações na estrutura do órgão.
É preciso endurecer os critérios para a seleção de conselheiros? Certamente. Mas será que transformar essa função em pública e remunerada atrairia representantes dos contribuintes com a mesma capacidade técnica de vários dos atuais conselheiros? Tenho minhas dúvidas.
Talvez o primeiro passo seja mais transparência, mais publicidade. Se o Carf for obrigado a escancarar as suas portas e dar ampla publicidade aos seus atos, acredito que veremos grande parte dos problemas atuais se resolverem, sem que para tanto seja preciso “assassinar” o órgão.
Devemos prestar mais a atenção nas manifestações de apoio ao Carf vindas da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) e de renomados juristas. Não se pode ignorar o peso das opiniões de quem conhece a fundo o órgão. E aguardemos uma manifestação firme do próprio Carf, que certamente virá a público defender as bases sólidas da instituição.
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