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Governo dá fôlego à criminalidade ao ignorar segurança de fronteiras

Especial para o UOL

02/06/2015 06h00

O projeto Sisfron (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras) é um sistema de vigilância e monitoramento contínuo. Ele foi concebido para atender ao apelo da sociedade brasileira a uma maior vigilância da fronteira terrestre como parte da solução para a redução da criminalidade no Brasil.

Essa é a resposta do Exército para toda extensão de nossa fronteira terrestre, do Oiapoque ao Chuí, da Amazônia, passando pelo Pantanal, aos Pampas. O sistema vinha sendo desenvolvido dentro de um planejamento estruturado para ser concluído até 2022, contando com uma cobertura de 16.145 km, com dez países, ao longo de 11 estados e 588 municípios, sendo 11.500 km desses na região amazônica.

Inicialmente, e para garantir a necessária eficácia, o projeto tem uma fase piloto prevista para os primeiros três anos e desdobrada nos 650 km da fronteira Oeste, no Estado do Mato Grosso do Sul, em área de responsabilidade da 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada.

A escolha dessa região se justifica, já que é uma das principais portas dos ilícitos transfronteiriços com o Brasil e que, por outro lado, permite um acompanhamento adequado das correções que possam ser necessárias a partir do emprego do projeto com uma tropa experiente, relativamente próxima das necessidades de coordenação com a empresa que implanta o Sisfron.

O contingenciamento imposto ao Ministério da Defesa inviabiliza a continuidade do projeto em seu nascedouro, já que foram cortados R$ 324 milhões, de um total de R$ 495 milhões previstos para o ministério. O próprio projeto piloto já impõe um prazo maior para implementação do sistema, e o corte realizado pelo governo só retarda ainda mais o desenvolvimento de um monitoramento eficaz de nossas fronteiras.

É preciso que o governo entenda que projetos de alta complexidade em áreas estratégicas como saúde e defesa, por exemplo, não são "estandardizados", não se encontram na prateleira e, além do seu prazo de maturação e por seu ineditismo, exigem um meticuloso desenvolvimento e ajuste na sua implantação. Uma vez interrompido, o projeto será muito mais oneroso quando retomado.

Um programa como o Sisfron traz para seu desenvolvimento inúmeros profissionais especializados em tecnologia avançada e em sistemas de alta complexidade, com capacidade para criar e adaptar soluções nunca antes utilizadas e que exigem pesquisa e desenvolvimento. Esses técnicos, uma vez demitidos, dificilmente retornarão ao projeto quando for retomado, se for retomado.

Da parte do Exército, o Sisfron foi concebido para ser a espinha dorsal de um todo muito maior, um "sistema de subsistemas". Ao sistema, quando pronto, poderão ser acoplados diversos subsistemas de interesse da sociedade, todos eles baseadas no seguinte ciclo: coleta de dados; transformação de dados em conhecimento; decisão e atuação.

O exemplo mais latente de um subsistema é o da segurança pública, mas existem muitos outros que podem ser desenvolvidos e acoplados ao sistema maior. É o caso do acesso à internet de banda larga para educação à distância,  controle da evasão fiscal, segurança vegetal e animal, como o controle da aftosa. Enfim, com o grande sistema desenhado e colocado em prática, cada um dos demais setores poderá desenhar seu próprio subsistema e acoplá-lo ao Sisfron.

O Sisfron é bem mais que um sistema de defesa/segurança, é um inovador projeto de engenharia social, dentro da filosofia de que não existe defesa sem desenvolvimento econômico e social. Na realidade, o Sisfron está muito mais para Plano Marshall do que para Muro de Berlim.

Ao retardar o projeto Sisfron sem data para retomada , o governo retarda o desenvolvimento social regional em afastados e esquecidos rincões do Brasil, garante a manutenção de uma elevada taxa de evasão fiscal e dá à criminalidade, que cada vez mais se desenvolve no Brasil, um novo e crescente fôlego por pelo menos mais uma década.

O Sisfron é importante para o Brasil e sofreu um pesado golpe nesse momento. Recuperá-lo será uma árdua e extremamente dispendiosa tarefa. Sem dúvida esse projeto deveria estar inscrito entre aqueles realmente estratégicos que não podem ser interrompidos e tratados como coisa descartável.

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