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Recursos no país não são escassos, são mal administrados

Especial para o UOL

29/06/2015 06h00

Por que há filas imensas nos hospitais públicos? Por que nossa educação não ensina como deveria e não produz inovações? Por que motivo nossas estradas, portos e aeroportos não tem a qualidade dos países mais avançados? Por que as despesas públicas exigem uma das cargas tributárias mais altas do planeta?

O Tribunal de Contas da União tem buscado contribuir com a administração pública na identificação das causas primárias desses problemas. E o debate passa necessariamente pela discussão da governança pública, entendida como os mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a atuação da gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade.

Em 2014, o TCU realizou, sob minha relatoria, e em conjunto com a maioria dos tribunais de contas do país, um inédito trabalho para diagnosticar a situação da governança em aproximadamente oito mil organizações nas esferas federal, estadual e municipal.

Para tanto, foi estabelecido um índice de governança pública, conhecido por iGG, que contempla uma série de boas práticas recomendáveis afetas ao tema, como, por exemplo, a escolha dos líderes com critérios, a capacitação e avaliação das lideranças, a existência de plano estratégico, a participação da sociedade e partes interessadas nas decisões, a implantação de controle interno e auditoria interna independentes e a transparência e prestação de contas.

O resultado obtido demonstrou significativas deficiências na administração pública. O iGG indicou que 48% dos respondentes encontram-se em estágio inicial de governança, enquanto apenas 16% estão em estágio aprimorado.

A situação avança se consideradas apenas as organizações federais, vez que a maioria já se situa em estágio intermediário (56%), enquanto 26% já teriam alcançaram o estágio aprimorado.

Entre as regiões do país, percebe-se que as organizações estaduais da região Sul apresentaram o melhor índice médio de governança (55%). A maior diferença entre os índices de organizações municipais e estaduais pertencentes à mesma região ocorre na região Sudeste, em que os municípios estariam com o indicador de 40% e os estados 52%.

Por sua vez, as organizações municipais e estaduais das regiões Nordeste e Norte apresentaram os índices mais baixos comparativamente às demais organizações respondentes, o que demanda uma atuação urgente na melhoria dos componentes de governança se o Brasil quiser superar as atuais desigualdades regionais.

O resultado alcançado explica uma das principais causas dos atuais problemas nacionais. O TCU se depara semanalmente com irregularidades na aplicação de recursos federais, a exemplo de obras com superfaturamento, serviços públicos com má qualidade, falhas de planejamento em políticas públicas relevantes e prestações de contas deficientes por estados e municípios.

A sociedade, por seu turno, tem manifestado, em diversos meios e veículos, sua insatisfação com a baixa qualidade de serviços nas áreas da saúde, da educação, da mobilidade urbana, de saneamento básico, da segurança, bem como seu inconformismo com os diversos casos de corrupção investigados pelos órgãos competentes e veiculados pela mídia.

O levantamento realizado apresentou números que confirmam um mantra que temos repetido ao longo dos últimos anos: que uma das causas primárias de todos os problemas percebidos é a baixa qualidade da governança pública conduzida por todos os entes da federação.

É, portanto, urgente que os agentes do Estado se sensibilizem para a necessidade da adoção de boas práticas administrativas que assegurem a entrega de resultados efetivos à sociedade.

Com certeza, não será tarefa simples; muito menos rápida de ser executada. Mas, estou plenamente seguro que o sistema Tribunais de Contas planta uma primeira semente para que os gestores públicos e a sociedade lancem um novo pensar sobre a atuação do Estado e os requisitos necessários para que o Brasil possa alcançar patamares de primeiro mundo em um futuro breve.

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