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Limite de velocidade em SP baseia-se no 'funciona lá, funcionará aqui'

Especial para o UOL

27/08/2015 06h00

No Brasil, a quantidade de vítimas decorrentes de acidente de trânsito é uma realidade assustadora e que requer medidas adequadas da administração pública. Segundo o DPVAT, em 2014 houve 763.365 vítimas decorrentes de acidentes de trânsito, o que representa um aumento de 20% em relação a 2013. Dessas vítimas, 52.226 perderam a vida e 595.693 foram indenizadas por invalidez permanente.

É verdade que as estatísticas mostram que a adoção de equipamentos e políticas de segurança – tais como uso do cinto, airbag, freio ABS, redução da velocidade nas vias e a Lei Seca – já trazem resultados positivos para a diminuição das mortes. No entanto, constata-se que na categoria dos motociclistas ainda há um aumento de indenizações por invalidez permanente a cada ano. Do total de acidentes ocorridos em 2014, 76% envolveram motocicletas.

Quando se aborda o tema acidente de trânsito, devem ser analisados os três principais atores, ou seja, o motorista, a via e o veículo. No Brasil, qual desses é o principal ator, qual participa de maneira mais efetiva para a ocorrência dos acidentes?

Há quem diga que são os motoristas, em virtude da sua negligência, imperícia ou imprudência; outros dirão que são as vias, em virtude do estado de conservação bastante questionável; finalmente, há os que afirmam serem os veículos, uma vez que não existe um programa de fiscalização das condições de segurança para o tráfego anual e nem a previsão de uma vida útil determinada para eles, como em outros países.

O pior de tudo, ainda não foi apresentado em nosso país um programa de pesquisa técnico-científica elaborado para determinar as verdadeiras causas dos acidentes de trânsito a nível nacional. Tal como ocorre na Europa, nos Estados Unidos e em países vizinhos como o Chile, onde o tema é tratado de maneira bem mais eficiente.

No Brasil não se sabe, tecnicamente, os motivos da ocorrência dos acidentes, e isto não se dá por falta de capacidade ou negligência, mas sim, por falta de pessoal adequado nas instituições envolvidas com esse problema.

Bem, é necessário um remédio para o problema, mas não se sabe ao certo qual é o problema, então corre-se atrás de soluções que tiveram êxito em outros locais com realidades diferentes. Porém, os números mostram que, como esperado, o resultado dessas medidas deixa a desejar.

Na contrapartida dessa realidade temos o exemplo do Distrito Federal, onde o número de mortes decorrentes de acidente de trânsito era alarmante: em 1995 havia 14,9 mortes para cada 10 mil veículos enquanto o valor aceitável pela ONU para países em desenvolvimento é de 3,0 mortes para cada 10 mil veículos.

Assim, criaram um programa com bases técnicas no intento de solucionar o problema. Esse programa determinou os pontos críticos com maior incidência de acidentes; foram encaminhadas equipes técnicas aos locais para determinar os motivos técnicos das ocorrências; estudaram as medidas técnicas adequadas para cada circunstância e executaram tais medidas. O resultado foi que em 2011 atingiram o valor de 3,1 mortes para cada 10 mil veículos.

É verdade que essa estratégia, além do tempo necessário para sua execução, tem valor monetário envolvido, uma vez que se tomam medidas quanto aos três atores, inclusive obras em vias públicas, passarelas, lombadas eletrônicas etc., mas, obteve-se um resultado expressivo.

Na cidade de São Paulo, pela sua grandiosidade, a quantidade de vítimas do trânsito é um problema igualmente grave. A pesquisa desses números para a cidade de São Paulo no ano de 2014 não apresentou resultados que permitam um estudo mais abrangente, a CET detalha precisamente informações sobre vítimas fatais (1249 mortes), não exibindo estudo sobre os demais tipos de vítimas.

No site da Secretaria de Segurança Pública verifica-se o número de vítimas lesionadas decorrentes de acidente de trânsito (25.003 lesionados). Vem sendo tomadas medidas de ajuste como, por exemplo, a redução da velocidade máxima para trafegar nas vias urbanas e nas rodovias marginais.

Tais medidas surtirão o resultado esperado? São as melhores medidas a serem tomadas? Infelizmente, em face da ausência de um trabalho técnico específico, não se pode afirmar nada com convicção a respeito dos resultados.

Até agora, o que foi exposto foram comparações de resultados com medidas tomadas em cidades de diversas partes do mundo; funcionaram lá, devem funcionar aqui também. Não foi apresentado nenhum trabalho com casuística adequada, com estudos técnicos específicos, apontando a verdadeira causa dos acidentes e demonstrando que a redução de 10 ou de 20 km/h realmente irá diminuir em determinada porcentagem o número de vítimas de acidente de trânsito em São Paulo.

Pode-se até acreditar que a redução de velocidade irá reduzir o número de vítimas, mas será que realmente é a melhor medida a ser tomada? Não existem outras melhores, pontuais e específicas? Fico na torcida para que estes estudos existam e venham a atingir os resultados esperados. Apenas é de se lamentar a falta de transparência (nenhum estudo técnico foi apresentado) e a falta de oportunidade de participação da comunidade na tomada de medidas que envolvem um tema de tamanha importância em nossas vidas. 

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