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Lei seca é ineficaz para cassar carteira de motoristas infratores

Especial para o UOL

15/09/2015 06h00

Quando ocorre um acidente com vítima fatal ou com vítimas que ficam enfermas e inválidas, muito se fala sobre a lei seca, dos riscos de dirigir embriagado e dos resultados danosos – sobretudo quando a bebida é causa fundamental desses trágicos acontecimentos.

A legislação brasileira sempre puniu tais condutas, como no artigo 34 da Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/41), e, posteriormente com o conturbado tipo penal previsto no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) –que teve sua redação de 1997 revista em dois outros momentos históricos (em 2008 e 2012), quando houve um aumento significativo do número de acidentes com vítimas fatais causados por motoristas embriagados.

A base dessa legislação, salvo a contravenção penal extinta, estipula sempre um índice de tolerância para quem bebe ou dirige. Em outras palavras, apesar de saber que a sociedade não tolera mais a conduta de dirigir embriagado o Estado insiste em dizer que se você bebeu “só um pouquinho” (até 0,2 g/l de sangue ou 0,13 d/l de ar alveolar) você pode dirigir sim, e com o beneplácito do Estado.

A solução para isso é uma legislação que estabeleça tolerância zero e puna definitivamente quem bebe e dirige. O artigo 165 do CTB faz isso e, felizmente, estabeleceu a tolerância zero prevendo uma infração administrativa para essa conduta. Isso faz com que a população tenha a certeza da punição, tanto no bolso (pelo elevado valor de multa), como na suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo.

Em linhas gerais, esta última seria a punição ideal para permitir a conscientização daquelas pessoas que insistem em não querer aprender pela educação de trânsito, e sim só pela punição.

Ocorre que, apesar da multa ser implacável –pois muito embora se tenha direito ao recurso, a grande maioria é indeferida–, a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação para dirigir não é tão eficaz, isto porque ela não é automática.

O procedimento administrativo da suspensão também merece maior agilidade, ainda que seja preciso garantir ao infrator o contraditório, a ampla defesa, o duplo grau de jurisdição e o devido processo legal.

Tal procedimento é longo, e por vezes demorado, ante a ausência de elemento humano para dar conta do julgamento dos inúmeros procedimentos de suspensão. Alguns chegam a levar mais de um ano, até que efetivamente aquela decisão venha a transitar em julgado –isto é, não caiba mais recurso.

E quando isso ocorre, o Estado espera a boa vontade do infrator para devolver a sua carteira de habilitação, e só a partir daí começar a cumprir o prazo da suspensão ou da proibição de dirigir veículo.

Como o infrator não é obrigado a devolver a carteira, normalmente ele continua dirigindo com a habilitação suspensa. Isso é crime previsto no artigo 309 do CTB, mas enquanto não for flagrado pela polícia, o motorista ostenta o beneplácito da impunidade dada pelo Estado.

Sobre essa necessidade é que temos que nos debruçar e encontrar uma solução, dentro da lei, para que o infrator devolva a sua habilitação ao Estado e que efetivamente cumpra a punição, não dirigindo mais.

Muito embora se possa notificar o infrator para devolver a habilitação, este muitas vezes não o faz, já que para isso não existe punição, a não ser o crime de desobediência (artigo 330 do Código Penal).

O grande desafio do Estado no efetivo cumprimento da lei seca é fazer com que, na prática, o infrator fique com a sua habilitação suspensa e deixe de dirigir.

Se o Estado conseguir encontrar uma maneira efetiva de cumprir com a suspensão ou proibição de se obter a permissão para dirigir, dará um grande passo na luta contra a embriaguez ao volante, gerando na população a certeza da punição.

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