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Com marco civil da internet, tutela à honra não se torna censura

Especial para o UOL

19/09/2015 06h00

O marco civil da internet (Lei Federal 12.965/14) busca tutelar o direito de todo cidadão à sua honra e privacidade, frequentemente ameaçado em um ambiente que estimula e propicia com rapidez e amplitude a disseminação da informação e a manifestação do pensamento, por qualquer pessoa, muitas vezes sob pseudônimo ou aparente anonimato.

Todavia, não se perde de vista que tal tutela não pode implicar sacrifício a outro valor igualmente caro a uma sociedade democrática: a liberdade de manifestação do pensamento e da informação, consagrada como um pilar do estado de direito e, por isso mesmo, alçada à categoria de garantia constitucional –como se lê do artigo 220 de nossa Constituição Federal.

O marco civil da internet, sabiamente, não descuida do direito à livre manifestação do pensamento e à informação, adotando regras para que a tutela à honra e à privacidade não descambe para a mais execrável censura. Não só se determina que todo e qualquer conteúdo da internet só pode ser compulsoriamente removido mediante ordem judicial, como dispõe que tal ordem judicial seja específica, com indicação clara dos locais em que se encontra o material já publicado e considerado ofensivo.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com muito acerto, deu recentemente prestígio a tal regra do marco civil ao reformar, parcialmente, decisão judicial que havia determinado a um provedor de conteúdo que ele se abstivesse de veicular informações sobre determinada pessoa, obrigando-o, ainda, a remover toda e qualquer mensagem que fosse postada a respeito de tal pessoa.

Entendeu-se, com muita razão, que tal ordem judicial implicava “censura prévia”, e que a remoção de qualquer informação só seria possível “na medida em que os links das páginas que a contenham sejam fornecidos”, com a indicação das chamadas URLs (endereços das páginas). 

É evidente que, para a realização de valores que, não raro, se encontram em conflito –o direito de um cidadão à sua honra e privacidade versus o direito de outro cidadão à livre manifestação de seu pensamento e à informação–, é necessário um processo que os constitucionalistas denominam de “ponderação”, recorrendo-se, para tanto, a outros valores igualmente importantes: os da proporcionalidade e razoabilidade. Ou seja, cada princípio ou valor pode e deve ser realizado na medida em que, para tanto, não seja necessário produzir prejuízo desproporcional ou desrazoável de outro valor ou princípio.

Tal processo de ponderação é constantemente feito pelos juízes no julgamento das mais diversas causas. Mas é especialmente mais necessário e adequado na elaboração das leis, nas quais são criadas as regras que devem ser observadas por todos e que servem à concretização dos valores e princípios que estão na base e na vida de nossa sociedade. No caso particular do marco civil da internet, as regras por ele dispostas foram objeto de longo e amplo debate no Congresso Nacional, com fecunda participação de diversos setores da sociedade brasileira.

Assim, não só porque decorre de expressa previsão legal, como, também, porque resulta de um valoroso processo de ponderação de princípios e valores, espera-se que outras decisões judiciais sigam a mesma linha de entendimento que foi adotada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento acima mencionado.

Ou seja, repudiando-se toda e qualquer tentativa de censura prévia e exigindo-se, sempre, a indicação precisa dos links das páginas da internet onde se encontram os materiais tidos como ofensivos, inclusive com a indicação das respectivas URLs.

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