Organização política formal se afasta brutalmente dos jovens
Cerca de dois anos e meio após as manifestações de junho de 2013, vivemos as reverberações do sismo principal pelo qual a sociedade brasileira passou quando 6,5 milhões de jovens ocuparam as ruas em manifestações por todo o país. Se aquelas primeiras ondas se dissiparam em meio as mais diversas causas –que foram muito além dos vinte centavos– a demanda evidente por novas formas de representatividade e participação política ficou marcada. Diferentes esferas do governo e de instituições políticas falharam em implementar nesse período reformas significativas e hoje é possível observar as consequências desse distanciamento.
A organização política formal se afasta brutalmente do interesse dos jovens. É possível observar ano a ano na última década a redução de afiliados jovens nos partidos políticos e na crença nessas organizações como representantes das aspirações políticas da juventude.
Segundo o estudo “Sonho Brasileiro da Política”, de 2014, grande parte dos jovens entrevistados considera que são expressões políticas o ato de votar, mas também fiscalizar o poder público (65%), participar de assembleias públicas (54%), defender uma causa, bandeira ou luta específica (51%), atuar em um movimento social (45%) e participar ou assinar petições online (42%).
Segundo essa mesma pesquisa, 45% dos jovens se aproximaria mais da política se o processo político fosse mais transparente e confiável; 35% se os políticos representassem melhor seus interesses e ideais; 24% se tivessem maneiras mais fáceis de apresentar suas opiniões e 22% se soubessem mais sobre como funciona a política no Brasil.
A crise de representação política se faz mais evidente ao notarmos uma tendência decrescente no tamanho do eleitorado jovem brasileiro (considerado aqui o intervalo entre os 16 a 34 anos de idade) entre outubro de 2008 e o mesmo mês de 2014, segundo o TSE. No último ano, o total de eleitores jovens representava 38% do total enquanto em 2008 era 42%. No mesmo período o eleitorado total aumentou ano a ano de 135,8 milhões a 143,4 milhões –um aumento de 5,65% em relação a 2008.
Quando se comparam os dados referentes a candidaturas aptas de 2014 em âmbito nacional –considerando-se os cargos elegíveis por faixa etária (deputado estadual, deputado distrital e deputado federal com idade mínima no momento da posse de 21 anos, e governador e vice-governador 30 anos) –, a representatividade é mínima. Candidatos jovens para governador e vice-governador representam, respectivamente, 3,7% e 11%.
Já para os cargos de deputado estadual encontramos 14,93% de candidatos entre 20 e 34 anos, para deputado distrital 11,68% e para federal 13,77% do total. Entre as eleições de 2008 e 2012 cresceu 25% o número absoluto de candidatos a prefeito e vereador entre 18 e 34 anos, mas sem alterar significativamente a proporcionalidade do total entre os candidatos.
Brasileiro cordial
Prestes a completar 80 anos, o livro Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, é contemporâneo para o entendimento de nossa sociedade e traz a infeliz constatação que ainda é necessário que “os detentores de posições públicas de responsabilidade compreendam a distinção fundamental entre os domínios do público e privado”.
Ele lembra também sobre “o predomínio constante das vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos fechados e pouco acessíveis a uma ordenação impessoal”. Pois se nossos partidos políticos carregam em seu DNA a herança das famílias patriarcais onde vínculos sentimentais, afetivos e biológicos estão acima de interesses e ideais, como é possível que eles dialoguem e principalmente, representem as novas gerações?
Estaríamos como país fadado ao desacerto social, econômico e político por conta da configuração institucional que recebemos como herança ibérica conforme o modelo teórico de Douglass North?
De acordo com North, “o grande papel das instituições em uma sociedade é reduzir a incerteza estabelecendo uma estrutura estável (mas nem sempre eficiente) para a interação humana”. As instituições contemporâneas precisam melhor dialogar com os anseios e demandas da juventude e da sociedade como um todo. É importante deixar de lado a velha tradição dos personalismos, clientelismos, patrimonialismos e caminhar rumo a uma participação social efetiva nos espaços de diálogo e de tomada de decisão que poderá moldar a práxis política e o papel de cada ator nessa trama.
A saída pode estar nos mecanismos de transparência e instrumentos de democracia participativa, no diálogo direto online (usar a internet em canais já existentes, como vote na web e collab) e na sistematização de informações nas ações off-line (escolas de formação, virada política).
A velha política está mais que ultrapassada para os jovens que liderarão o processo de mudança do país. A revolução, a nova política não esperará reformas institucionais das pessoas que buscam sustentar seus interesses. Ela tomará as redes e as ruas. Fica a esperança de que, finalmente, a cordialidade possa então dar espaço ao desenvolvimento de nossa sociedade.
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