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Rio-2016 não é cara, mas legado deixa a desejar

Especial para o UOL

27/07/2016 06h00

Muito se tem falado sobre o legado olímpico para o município, para o Estado do Rio de Janeiro e para o Brasil. Um legado é tudo o que uma geração de cidadãos, políticos e contribuintes de uma dada época transmitem à seguinte. O legado é material e abstrato, simultaneamente. Logo, ele pode ser tangível e intangível.

Estádios, arenas, piscinas e velódromos são bens materiais tangíveis e serão utilizados fisicamente, como legados (enquanto durarem e forem mantidos), por cidadãos do presente e do futuro. Memórias olímpicas, imagens de grandes feitos, sons e músicas que serão cantaroladas após os Jogos pelas ruas, a imagem que os estrangeiros farão dos cariocas, dos brasileiros e do Brasil e da infraestrutura hoteleira e da organização dos Jogos, entre outros, serão legados intangíveis.

Ao incluir-se um imenso conjunto de obras e estruturas físicas que serão utilizadas, quem sabe, por décadas, no conceito de legado, independentemente de um evento que durará apenas 19 dias corridos –os Jogos Olímpicos, sem contar as Paralimpíadas– cria-se uma confusão medonha na cabeça dos cidadãos e contribuintes.

Obras do metrô, novas linhas de ônibus, despoluição da Baía de Guanabara e a reforma de seis estações de trem, citando parte dos 27 projetos taxados de “olímpicos”, não são destinados para a prática e espetacularização esportiva. Logo, não são um legado olímpico.

Por essas razões, é compreensível o furor popular com a arrogância governamental, que afirmou, entre 2007 e 2016, que essas obras foram para produzir esporte e lazer. Grave e grosso equívoco, que se aumenta quando afirmam as autoridades que a Olimpíada de 2016 custará pelo menos R$ 39 bilhões. A considerar o legado “puro”, dos centros esportivos (R$ 7,1 bilhões) e da realização do megaevento (R$ 7,4 bilhões), a verdadeira Matriz de Responsabilidade e de Custos será de cerca de R$ 14,5 bilhões. Ou seja, R$ 24,5 bilhões serão os gastos infraestruturais urbanos e em segurança, não olímpicos, mas necessários para a evolução citadina.

Como de fato há verbas públicas federais nos jogos, mais correto seria estimar o custo do evento para todos os brasileiros. O legado físico ficará, sobretudo, no Rio de Janeiro, que compadece grave crise socioeconômica e política desde 1960, quando deixou de ser a capital do Brasil.

Os R$ 14,5 bilhões, em face dos 205 milhões de brasileiros, custaram R$ 70,73 em Jogos Olímpicos e legados físicos diretos; pouquíssimo diante de tantas potencialidades esportivas no Rio e carências de infraestrutura. E se analisássemos pela PEA (População Economicamente Ativa), 68,8% dos brasileiros, ou 141 milhões de trabalhadores, pagarão R$ 102,84 cada um.

Disso depreende-se que os Jogos Olímpicos não são “caros”, per se, em seu valor explícito e intrínseco financeiro. E o legado urbano infraestrutural fica para usufruto das próximas gerações.

Todavia, os R$ 14,5 bilhões aplicados em esporte de elite para promover o legado intangível da boa imagem do Brasil no exterior não financiam a educação, saúde ou a segurança pública, dramaticamente carentes de verbas e qualidade. A escolha da prioridade esportiva relegou a um segundo plano atividades públicas cujo legado pode superar aqueles gerados pela Rio-2016.

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