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Novo Código de Processo Civil não ataca a lentidão processual

Especial para o UOL

19/09/2016 06h00

O novo Código de Processo Civil Brasileiro, que entrou em vigor em 18 de março de 2015, é produto das aspirações contemporâneas do direito, da necessidade de acompanhar a evolução social, tecnológica e científica, e da importância de se harmonizar a legislação infraconstitucional com a Constituição democrática e com a jurisprudência, entre outros fundamentos facilmente enumerados.

Ao estabelecer no inciso LXXVIII do art. 5º a razoável duração do processo, a Constituição Federal também reconheceu que a todos são assegurados os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, de modo que a razoável duração do processo deve ser conjugada com o fenômeno da aceleração. Término razoável de um processo não significa, para o legislador constituinte, duração do processual “na medida do possível” ou “demora tolerável” do processo, mas busca de eficiência e rapidez na tramitação dos casos.

Por outro lado, celeridade a que alude a cartilha republicana não quer dizer pressa a qualquer preço, com abusos e atropelamentos do direito de defesa. Ao contrário, requer que os aplicadores e intérpretes não meçam esforços para contornar óbices burocráticos e excluir formalidades inúteis em prol da brevidade das causas, pelo uso da técnica e da ética, visando atender às aspirações dos jurisdicionados, que anseiam por uma justiça rápida e efetiva e não por uma justiça presa no cipoal de fórmulas, excesso de recursos e ineficiência no cumprimento de ordens judiciais.

No seu texto, o novo Código de Processo Civil sinaliza a obediência ao princípio da razoável duração do processo (art. 4º) e dispõe que “o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidas na Constituição da República Federativa do Brasil” (art. 1º).

Além de reiterar princípios constitucionais, procura dar tratamento adequado aos casos repetitivos, com a criação do incidente de resolução de demandas similares e com a remodulação dos recursos repetitivos; restringe o âmbito do recurso do agravo de instrumento; impõe condenações judiciais em multas e honorários contra condutas e recursos protelatórios; estimula a autocomposição e os benefícios da mediação e da conciliação; impõe ao juiz compromisso com a celeridade, responsabilizando-o pela desídia na providência que deva cumprir de ofício e estabelece que os juízes observem que os processos mais antigos devam ser julgados preferencialmente antes dos novos.

Esses esforços legislativos, além de outros, visando ao fim da procrastinação, que já era escopo da comissão de juristas do anteprojeto do código, não se afiguram, a priori, suficientes para se almejar à celeridade, que também depende de outros fatores como gestão de tribunais e mudança de cultura forense.

Por outro lado, pode-se apontar que o CPC/2015 poderia ter contribuído com mais profundidade para a realização de um processo mais simples e mais rápido. Embora não tenha descurado da celeridade, não tratou a lentidão como grande inimiga a ser eliminada, deixando de ir –ao que parece, ainda mais por se cuidar de um texto recente– a fundo para agir diretamente contra a lerdeza processual. Ao dar mais atenção ao contraditório real, não previu ritos céleres alternativos, contentando-se com um único procedimento, que na verdade é o antigo rito comum ordinário, caracterizado pela grande quantidade de atos nas fases processuais.

O código também deixou de prever hipóteses variadas de resolução rápida do conflito, não diminuiu os complexos procedimentos especiais, manteve quase o mesmo regime recursal com embargos de declaração interruptivos e deixou nos tribunais a sombra dos embargos divergentes, agora disfarçados. Preocupou-se mais com a tutela provisória, que mereceu um livro próprio, ao passo que a tutela definitiva, esta sim em que se pode dizer ao jurisdicionado que seu processo findou, sequer recebeu um título legislativo ou previsão de meios alternativos de abreviação.

Em linhas gerais, democrático e altamente técnico-jurídico o CPC de 2015 empreendeu modificações muito importantes no direito processual. Inclusive, fez melhoramentos conceituais e trouxe institutos novos. Entretanto, não declarou guerra à lentidão e combate-a normativamente sem comprometimento e sem atender completamente ao princípio constitucional da razoável duração do processo, na parte em que abrange o uso dos meios que garantam a celeridade da tramitação dos processos.

Sendo um código superior ao precedente, porque afinado com os novos tempos, aberto ao diálogo, operativo e obediente ao devido processo legal, à razoabilidade e à autonomia da vontade das partes, não se pode negar que os seus sujeitos processuais possuem condições jurídicas de extrair o melhor proveito de suas normas visando à eficácia e à efetividade em benefício do jurisdicionado.

Podem ainda somar esforços para adequação e maior utilidade das novas regras, não perdendo de vista que as partes possuem o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída aí a atividade satisfativa, e que esse prazo razoável precisa ser acrescido do fator celeridade, que também possui status constitucional.

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