Evangélicos puxam alta de 11% do número de candidaturas com nome religioso

Leandro Prazeres

Do UOL, em Brasília

  • Lalo de Almeida/ Folhapress

    Deputados da bancada evangélica do Congresso Nacional participam de culto na Câmara

    Deputados da bancada evangélica do Congresso Nacional participam de culto na Câmara

As candidaturas com nomes religiosos cresceram 11% em 2018 em relação a 2014. Esse aumento é superior ao crescimento do volume de candidatos no período, que foi de 7,4%. O levantamento feito pelo UOL tem como base os dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e analisou as candidaturas cujo "nome de urna" continha termos associados a religiões de diversas matrizes.

Esse aumento foi puxado pelas candidaturas de evangélicos e de integrantes de religiões de origem africana e pode ser ainda maior porque nem todos os candidatos indicam em seus "nomes de urna" sua identidade religiosa.

Para chegar a esses dados, o UOL verificou 49.972 registros de candidaturas feitos em 2014 e em 2018 armazenados na base de dados do TSE e selecionou aqueles cujo nome de urna continham termos comumente associados a integrantes de religiões cristãs e de matriz africana: pastor (a), irmão (ã), padre, frei (a), apóstolo (a), missionário (a), pai, mãe, babalorixá, entre outros. 

Outra forma de verificar a evolução das candidaturas de religiosos é observar as ocupações registradas pelos candidatos ao TSE. Neste ano, 116 pessoas indicaram ter como ocupação serem membros de entidade religiosa. Em 2014, esse número foi de 115. A reportagem optou por fazer o levantamento com base no nome de urna porque é dessa forma que a maioria dos religiosos se apresenta aos eleitores.

O levantamento considerou quatro dos maiores grupos religiosos brasileiros, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística): católicos, evangélicos, espíritas e adeptos de religiões de origem africana. A reportagem não identificou

Maioria dos candidatos com nome religioso é evangélica

O levantamento constatou que, entre 2014 e 2018, o número de candidatos com nomes religiosos saiu de 511 para 568, um aumento de 11,15%.

Nesse grupo, as candidaturas evangélicas são a maioria. Das 568 registradas neste ano, 524 são de evangélicos, o equivalente a 92,2% do total.

Do restante, 24 são de religiões de origem africanas (umbanda e candomblé, por exemplo) e 20 são de católicos.

Na comparação com as eleições de 2014, as candidaturas evangélicas tiveram um crescimento de 8,2%, saindo de 484 para 524. As candidaturas católicas tiveram uma queda de 4,7%, saindo de 21 para 20.

O maior crescimento percentual foi registrado entre os candidatos de religiões de matriz africana. Elas saíram de 6, em 2014, para 24, em 2018, um crescimento de 300%.

Deputado vê "crescimento natural" de evangélicos

Um levantamento recente indica que a bancada evangélica no Congresso Nacional é composta por pelo menos 84 parlamentares82 deputados federais e dois senadores. Esse número é o equivalente a 14% dos 594 congressistas (513 deputados federais e 81 senadores).

Segundo o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), esse número é mais do que o dobro dos parlamentares evangélicos eleitos em 2006.

Atualmente, a bancada evangélica é considerada uma das mais influentes e bem articuladas do Congresso Nacional.

Foi graças a essa influência que, em 2015, uma comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou o Estatuto da Família, um projeto de lei que, entre outras coisas, delimitava que a família é formada a partir da união de um homem e de uma mulher, noção criticada por diversos setores da sociedade como as organizações em defesa da comunidade LGBT.

O presidente da Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional, Hidekazu Takayama (PSC-PR), diz que o crescimento no número de candidaturas de evangélicos neste ano acompanha o aumento no número de fiéis.

"É um crescimento natural. Quanto mais aumenta o número de fiéis, mais aumenta o número de candidatos. Não há um movimento orquestrado para que a gente aumente nossa representação política", diz Takayama.

O deputado, que foi um dos criadores da Frente Parlamentar Evangélica, avaliou como normal o crescimento do número de candidaturas de religiosos de origem africana.

"A legislação brasileira permite esse tipo de candidatura. Acho que isso é normal. Da mesma forma como o povo evangélico se lançou na política para defender seus valores, é normal que eles também o façam", afirmou.

Takayama, no entanto, negou que a bancada evangélica tenha atacado outras religiões. "De forma nenhuma. Nossa atuação não persegue ninguém. O que alguns setores têm dificuldade de entender é que, apesar de o Estado ser laico, o Brasil é um país cristão. Nossa representação, nossa atuação, também é cristã", disse o parlamentar.

Identidade religiosa é capital eleitoral, diz socióloga

André Melo/Futura Press/Agência Estado
Adeptos de religiões de origem africana fazem protesto contra intolerância religiosa no Rio

Para a socióloga Christina Vital, uma das principais estudiosas da relação entre religião e política no Brasil, o crescimento no número de candidatos religiosos no país tem sido uma tendência, que ocorre desde os anos 1980, chamada de confessionalização da política. 

"A confessionalização da política é um processo no qual os candidatos usam uma identidade religiosa para compor o seu capital eleitoral na disputa. É a forma como eles tentam se diferenciar dos demais candidatos", afirma Christina.

A socióloga diz que o crescimento de candidatos que se assumem como integrantes de religiões de origem africana é uma novidade, resultado do quadro de intolerância religiosa que vem atingindo a comunidade desde os anos 1990.

Uma pesquisa realizada pelo MDH (Ministério dos Direitos Humanos) indicou, que entre 2015 e 2017, o Brasil registrou uma denúncia por intolerância religiosa a cada 15 horas e que 39% delas eram referentes a atos hostis a adeptos ou a templos de religiões de matriz africana.

"Esse aumento é uma resposta à intolerância religiosa que afeta essas religiões. Há um trabalho, que começou nos anos 1990, e que começa a dar resultado agora, no sentido de que religiosos da umbanda e do candomblé assumam essa identidade na disputa eleitoral para ocupar espaços de poder", afirmou Christina.

A candidata a deputada federal Flávia Pinto (PDT-RJ), cujo nome de urna é "Mãe Flávia Pinto", diz que, além de uma reação aos episódios de intolerância religiosa, o aumento no número de candidatos que representam o chamado "povo de axé" é resultado da maturidade política da comunidade.

"A gente percebeu que, diante da atuação de bancadas como a evangélica, a única resposta é ocupar espaços na política. Sem isso, eles continuarão livres para votar o orçamento, decidir por concessões de TV, além de outras medidas que podem prejudicar o nosso povo", afirmou.

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