Programa de Lula recicla há 29 anos promessa de taxar rico e aliviar pobre

Rodrigo Mattos

Do UOL, no Rio

O programa de governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) inclui proposta de reforma tributária favorável à população de menor renda similar à promessa feita em sua primeira campanha em 1989. Essa ideia foi repetida em três outros programas do PT durante esses 29 anos. No governo por quase 14 anos, o PT nunca apresentou um projeto que, de fato, reduzisse a carga tributária de mais pobres e taxasse os mais ricos.

O partido inscreveu a candidatura de Lula que está preso condenado por corrupção e terá seu registro julgado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Seu programa foi elaborado pelo PT e continuará válido se ele for impedido de concorrer: será substituído pelo vice Fernando Haddad.

Na proposta da eleição presidencial atual, o partido defende "um sistema que opere com eficiência arrecadatória e justiça social". Em seguida, o texto diz que a reforma tributária "será orientada pelos princípios da progressividade, simplicidade, eficiência e da promoção da transição ecológica".

O partido propõe que todos os que ganham até cinco salários mínimos sejam isentos de imposto de renda, o que se condiciona "ao aumento das alíquotas para os super ricos", além de tributação maior sobre lucros e dividendos.

Em 1989, quando perdeu no segundo turno para Fernando Collor, Lula tinha em seu programa uma promessa bem similar. Afirmava que "a carga tributária brasileira, que sempre penalizou o trabalho e não a riqueza, tornou-se ainda mais desigual". E criticava a prioridade a impostos indiretos sobre consumo em vez de focar nos diretos sobre propriedade e renda. A proposta petista daquele ano era de um aumento de impostos direto sobre riqueza e "alívio de carga sobre rendimentos do trabalho", e empresas pequenas.

As campanhas de Lula em 1994 e 1998 tiveram promessas de taxação sobre grandes fortunas e heranças. Sua candidatura vencedora de 2002 voltava a fazer proposta de redução da carga tributária "que recai sobre os setores médios assalariados" e sobre "bens de consumo de massa". Ali, também se propunha a criação do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), imposto único sobre consumo.

No poder, os governos de Lula e depois da sucessora Dilma Roussef fizeram três propostas de reforma tributária para serem votadas no Congresso --nenhuma delas previa a redução da carga tributária sobre camadas mais baixas da população, nem a taxação de super ricos ou grandes fortunas.

Os governos petistas também deixaram de reajustar a tabela do Imposto de Renda nos patamares da inflação. Isso significou, na prática, um aumento de impostos sobre assalariados das camadas mais baixas e médias da população. Nunca foi proposto o imposto único para consumo.

Proposta atual favorece aprovação, diz economista do PT

Um dos responsáveis pela elaboração da parte econômica do programa do PT, o economista Guilherme Mello, da Unicamp, reconheceu que a proposta de reforma tributária da candidatura atual de Lula tem princípios gerais parecidos com as ideias originais de 1989. Mas ressalta que há novidades principalmente em relação a mecanismos de como conseguir aprovar as ideias no Congresso, onde sempre houve resistência.

"Segue princípios gerais [de 1989]. A ideia de progressividade e a ideia de simplificação, e a ideia de privilegiar atividades produtivas, e taxar renda e patrimônio. Princípios são gerais. Agora as circunstâncias mudaram. A proposta atual traz uma série de inovações. Ela traz com ela uma tecnologia para fazer como aprovar essa proposta", contou.

O que ele chama de "tecnologia" é uma garantia de que não haverá aumento da carga tributária, que terá um teto. Outra aposta é criar um mecanismo pelo qual estados e municípios tenham certeza de que não terão perda de receita. Com isso, o PT entende que derrubará a resistência a uma reforma no Congresso.

"[O PT] Não propôs porque havia a resistência. Havia a leitura de que não tem como passar porque havia a resistência do Congresso. Agora você está dando as garantias de aprovar. Naquele momento histórico, havia um caminho mais simples", disse ele, referindo-se ao aumento do gasto público para reduzir a desigualdade social.

Segundo Mello, não há mais espaço para crescimento do gasto público e, portanto, se eleito, o partido terá de fazer a reforma tributária para promover maior igualdade.

A advogada tributarista Fabiana Tomé, doutora pela PUC-SP, entende que os princípios das propostas do PT são iguais desde 1989, e que nada foi feito enquanto o partido e Lula estavam no poder.

"[Candidatos sempre repetem] Essas propostas que o eleitor gostaria de ouvir, que envolvem tributação mais justa. Apesar de ser o discurso, não é o que tem sido feito", analisou a advogada.

"O discurso sempre fala em reduzir tributação indireta e fazer uma tributação mais direta. Não é o que se tem verificado na prática. Pensa-se em aumentar a arrecadação [com propostas]. Imposto de renda nunca é a preocupação."

E completou: "Temos a isenção até os 15%. Depois o maior patamar é de 27,5%. Foi proposto um novo patamar de 35%, mas que não seria suficiente [para taxar os mais ricos]. Nunca se propôs a progressividade de fato. O assalariado é o mais tributado enquanto a pessoa jurídica tem menor tributo", disse Fabiana, que ainda vê pouca preocupação em se reduzir o PIS e o Cofins que oneram empresas e a produção.

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