Adversários devem reduzir crítica a Bolsonaro após ataque? Analistas opinam

Guilherme Azevedo e Juliana Carpanez

Do UOL, em São Paulo

  • Dario Oliveira/Estadão Conteúdo

    O candidato Jair Bolsonaro (PSL) está internado no hospital Albert Einstein, em SP

    O candidato Jair Bolsonaro (PSL) está internado no hospital Albert Einstein, em SP

O episódio da facada no candidato Jair Bolsonaro (PSL), nesta quinta-feira (6), deve fazer com que outros presidenciáveis amenizem em suas campanhas as críticas ao candidato ferido, segundo três especialistas ouvidos pelo UOL. Porém, há quem considere essa possibilidade arriscada e defenda a implementação de um plano estratégico para posicionar e direcionar as campanhas.

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"É um momento quase de luto, haverá mais cuidado entre aqueles que o criticam. Terão de dosar um pouco mais essas críticas. Principalmente Geraldo Alckmin [PSDB], que vinha disputando eleitores diretamente com ele", afirmou o cientista político Fernando Abrucio, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas). "Mas o embate existirá, não tem como escapar dele, levando em conta que Bolsonaro está na frente."

Reportagem da Folha de S.Paulo indica que as peças publicitárias do tucano –criadas para desconstruir o adversário-- serão repensadas. O jornal afirma ainda que não houve tempo de fazer mudanças imediatas para a TV, pois o plano de mídia havia sido entregue ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na quinta-feira (6) e, por causa do feriado, não poderia ser alterado até segunda-feira (10). No rádio, as propagandas foram retiradas até domingo (9).

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O cientista político Antonio Carlos Mazzeo, da USP (Universidade de São Paulo) e PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), aposta que as críticas personalizadas ao candidato ferido vão diminuir. As políticas não. "Vão apontar a falta de um projeto político, a falta de sua capacidade de governança. Essas críticas devem continuar sendo feitas. Mas só saberemos nas próximas pesquisas os efeitos desse ataque no plano eleitoral." 

Esses levantamentos de intenção de votos serão divulgados na semana que vem: segunda-feira (10) será o Instituto Datafolha e, na terça-feira (11), está previsto o estudo do Ibope.

Abrucio concorda que ainda é difícil avaliar o impacto desse acontecimento na corrida eleitoral. Mas considera que talvez estabilize ou diminua a velocidade da rejeição de Bolsonaro: pesquisa divulgada na quarta indica que essa medição foi de 37% para 44% em duas semanas.

Bolsonaro fala pela primeira vez após ataque

"Campanha é campanha"

Especialista em marketing político na internet e professora da FGV, Luciana Salgado classifica como temporária essa pisada no freio dos adversários políticos. "Eles podem pegar leve agora, mas depois voltam com tudo. Campanha é campanha", resumiu.

Segundo ela, todo ato de violência gera uma comoção e o fato de os outros candidatos terem se manifestado na quinta-feira, repudiando o ataque e prestando solidariedade, acabou funcionando também como uma estratégia por parte deles.

"Todos se viram na obrigação de se posicionar de alguma forma. E o Bolsonaro terá menos tempo para fazer campanha, mas esse também é um fato político, considerando que o atentado fere a democracia do país", continuou Salgado.

Para ela, aquilo antes tratado pelos candidatos como ataque direto pode dar lugar à chamada proposta propositiva --apresentando algo de forma positiva. "Em vez de ser uma crítica direta a alguém que defende o armamento, o adversário pode mostrar que violência gera violência, por exemplo. Nesse contexto, explica que em países onde policiais não andam armados os índices de criminalidade são baixíssimos."

Há duas coisas que os políticos devem descartar em toda essa história, ainda segundo Salgado. A primeira é usar a tragédia alheia como palanque eleitoral --associando de alguma forma sua imagem à de Bolsonaro, nesse contexto da facada. A segunda é ligar o ataque em Juiz de Fora (MG) ao posicionamento do candidato do PSL em relação a armas. "Alguns grupos têm opiniões radicais e fazer uso desse discurso pode ser um tiro no pé."

Importância de estabelecer uma estratégia

Se os cientistas políticos sugerem uma revisão das ações dos candidatos e partidos adversários no curto prazo, para o professor de filosofia e ética Roberto Romano, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a questão está mesmo colocada no plano estratégico, no direcionamento e posicionamento geral claro da campanha.

"Voltamos ao jogo da estratégia e da tática. Muito vai depender da capacidade de estratégia, prudência, imaginação e inteligência de todos os partidos políticos. Se os partidos ficarem no setor tático [reações apenas momentâneas, sem objetivos], vão perder muito."

Romano exemplifica seu pensamento com a campanha de Alckmin, que poderá ter prejuízo se se afastar da crítica forte a Bolsonaro e se oferecer apenas como "grande empreendedor do diálogo, da pacificação".

"Isso não vai dar certo, porque vai ser rejeitado tanto pela esquerda quanto pela direita. [Essa posição] Pode servir para os setores que não querem a radicalização, ao mercado, por exemplo, mas não às massas, que se aglomeram à direita e à esquerda."

O professor frisa que Lula e o PT têm grande parte da opinião pública a favor, assim como o candidato do PSL tem outra grande parte. Essa projeção e penetração popular, entretanto, o filósofo não observa nas candidaturas de Henrique Meirelles (MDB) e Alckmin, por exemplo. "Vêm de cima para baixo, sem sustentação popular."

Para Romano, "no fundo, está se desenhando para outubro o choque de dois setores da sociedade".

"Se o PT tiver inteligência, apesar de ter esticado a corda em demasia com Lula, pode chegar ao segundo turno com Haddad [Fernando Haddad, ex-ministro da Educação de Lula e ex-prefeito de São Paulo, que deve assumir a cabeça da chapa após a Justiça eleitoral ter barrado o registro da candidatura de Lula com base na Lei da Ficha Limpa]. Mas não há uma coesão interna das hostes petistas, enquanto o setor da direita está cada vez mais coeso."

Romano aponta ainda o fato de Haddad ser pouco conhecido no nível nacional, ao passo que o tempo espontâneo de mídia obtido por Bolsonaro agora está levando o nome dele para a boca de mais de 200 milhões de brasileiros, um novo trunfo eleitoral.

"Está compensando seu pouco tempo de TV e rádio com essa enorme divulgação que a mídia está dando ao seu caso. Não tem programa oficial [o horário eleitoral gratuito, em que o capitão reformado tem apenas oito segundos] que compense as 24 horas de atenção da mídia e da sociedade, debruçando-se sobre o caso."

E os presidenciáveis Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede)?

Para o filósofo, as campanhas de Ciro e Marina podem deslanchar se de fato se colocarem como terceira via entre PT e Bolsonaro, mas o próprio especialista diz acreditar que isso será "muito difícil".

"Eles não têm mostrado capacidade estratégia ordenada. Marina, apesar de críticas a Lula, é liderança quase única de suas hostes. E Ciro tem o problema de sua personalidade, explosiva, que não se submete a plano racional. A campanha dele é errática e rapsódica, depende de cada momento e não é arquitetada no longo alcance."

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