"Nem sei se vou sair para votar": o que pensam os eleitores indecisos?

Mirthyani Bezerra e Aliny Gama

Do UOL, em São Paulo, e Colaboração para o UOL, em Maceió

  • Getty Images/iStockphoto

A auxiliar de produção Diana Tavares Braga, 36, está tão em dúvida em qual candidato à Presidência vai depositar o voto e a confiança que está até cogitando repetir o que fez em 2014: não comparecer sequer à sessão eleitoral onde vota em Porto Velho (RO). "Enfrentar fila para votar para depois levar rasteira de candidato? Por isso eu não votei em 2014", explica.

Cogita ausentar-se, embora o voto seja obrigatório no Brasil -- quem não exerce o dever cívico paga multa de R$ 3,51 para cada turno que faltar --, mas ainda não se decidiu. Diz ter simpatia pela "mulher de 'oculinhos'". "Como é mesmo o nome dela? Eu sou tão ruim de nome. Isso mesmo, a Marina [Silva]", responde após ouvir da reportagem o nome da candidata da Rede. "Nela [Marina] eu até poderia pensar em votar. Mas estou indecisa", conclui.

Arquivo Pessoal
A auxiliar de produção Diana Tavares Braga, 36, de Porto Velho
Assim como Diana, 37% do eleitorado brasileiro ainda não sabe em quem vai votar para presidente, segundo pesquisa publicada no início da semana pelo Datafolha, e faltam apenas três semanas para o primeiro turno. O número é mais alto do que o verificado no mesmo período de 2014, quando 29% diziam estar com o voto indefinido.

Alessandra Aldé, cientista política e professora da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), diz que o período mais curto de campanha eleitoral deste ano -- apenas 45 dias -- explica o número alto de indecisos. Ela acredita que as definições só começarão a tomar forma às vésperas do primeiro turno. "Três semanas é muito tempo para quem cobre política ou quem está acompanhando isso o tempo inteiro. Parece que o assunto já está em voga há muito tempo. Mas para boa parte dos eleitores só nas últimas semanas é que se começa a prestar atenção", explica.

Vera Chaia, cientista política da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), afirma que as indefinições sobre candidaturas também têm influência sobre o número. "No caso do Lula, nós não sabíamos se ele poderia ser candidato ou não. [Houve] A entrada do Fernando Haddad no lugar do Lula. As indefinições é que levaram a essa incerteza com relação ao voto de modo geral e principalmente ao voto das mulheres", acredita.

Segundo o Datafolha, a maior fatia do eleitorado que não sabe quem deve ser o chefe do Executivo federal é mulher, tem mais de 35 anos, estudou até o ensino fundamental, ganha até dois salários mínimos por mês e mora em cidades de até 500 mil habitantes. O número de indecisos é praticamente o mesmo em todas as regiões do país, oscilando numericamente entre 35% e 38%.

Tanto para Aldé quando para Chaia, o voto das mulheres pode ser fundamental para definir quem subirá a rampa do Palácio do Planalto em 1º de janeiro de 2019.

Sem a pretensão de ser uma mostra científica como o Datafolha, a reportagem do UOL conversou com seis mulheres de várias regiões do Brasil que se encaixam de alguma forma no perfil dos indecisos demonstrado pelo instituto de pesquisa para saber os porquês de elas ainda estarem indecisas. Todas deram como motivo o descrédito em relação à política causada pelos de corrupção que vieram à tona nos últimos anos.

Até o fim das eleições, as eleitoras contarão ao UOL como está sendo o processo de escolha, de que maneira elas buscam estar bem informadas sobre o pleito e quais expectativas elas têm em relação às opções que aparecerão na urna eletrônica no dia 7 de outubro.

Informação é chave contra falta confiança na classe política

"Essa indecisão é por conta da quantidade de corrupção. O Brasil já está afundando porque acreditamos em promessas e elas foram mentiras. Estou com medo de votar", desabafa a costureira Maria Solene da Silva Nascimento, 44, de Caruaru (PE).

Arquivo pessoal
A relações públicas Andreia Cristina Rodrigues, 48, de Ibertioga (MG)
A exposição das relações promíscuas entre partidos, políticos e empresas, reveladas pela Operação Lava Jato, mostrou que "a classe política é cheia de conchavos" para a relações públicas Andreia Cristina Rodrigues, 48, de Ibertioga (MG). Ela acredita que a corrupção é o "principal problema do país". "Eu acho que a classe política é cheia de conchavos. Vota em mim que você ganha isso ou aquilo", diz.

A decepção é a causa da indecisão de Andreia, que ainda avalia votar no candidato do Novo, João Amôedo. "Estou observando o critério de quem nunca esteve na política e tem ficha limpa. Tenho tendência a votar no [João] Amoedo", conta.

Nenhum candidato conseguiu convencer a cabeleireira Sandra Alves Bispo, 38, de Arapiraca (AL), que se considera bem informada sobre as opções disponíveis. Segundo ela, "eles mentem demais". Usando critério de eliminação, no entanto, ela já sabe em quem não vai votar: no candidato do PSL, Jair Bolsonaro. "Antes eu era 'maria-vai-com-as-outras' e agora estou decidindo em quem vou votar. Não quero um homem como Bolsonaro governando nosso país e não vejo ponto positivo em nenhum dos demais para votar", pondera.

A diarista Sandra Maria Aparecida de Oliveira, 65, de Itanhaém (SP), estava quase decida a votar em Bolsonaro, mas voltou atrás depois que "ouviu umas coisas sobre ele". "Os que aparecem de bom, de repente aparece as falcatruas deles. Eu pensava em votar no Bolsonaro, mas estou ouvindo umas coisas sobre ele que também estão me deixando indecisa", conta.

Não basta ser ficha limpa para a pedagoga Eliana Canedo, 47, de Catalão (GO). "Não tem candidato que seja livre de problemas com a Justiça e, ao mesmo tempo, tenha uma base de apoio. A Marina [Silva] não tem processos, mas também não tem base de apoio para governar o país. Por isso fico dúvida ainda, porque não basta eleger um presidente, tem que ter uma base de sustentação que o permita governar", diz.

Arquivo Pessoal
A pedagoga Eliana Canedo, 47, de Catalão (GO)

O cenário de desconfiança em relação à classe política tem, de fato, um efeito desmobilizador, segundo Alessandra Aldé. Ela afirma que os ataques permanentes da mídia e dos próprios políticos colocaram a corrupção como uma questão central da política, e isso é ruim para democracia.

Para ela, é preciso que os eleitores indecisos procurem se informar sobre as opções colocadas, e não só para os cargos majoritários, como o de presidente da República.

"É muito importante que as pessoas prestem atenção nos candidatos para o Congresso. Deputados e senadores têm um enorme poder em definir onde vai ser investido o dinheiro do povo. Se a gente abre mão da política por desconfiar da classe política inteira, é possível que a gente acabe deixar isso na mão dos piores políticos", diz.

E completa: "Não é corrupção que vai fazer a diferença na hora em que os deputados votarem projetos no Congresso e sim a afinidade com certos projetos".

Das seis mulheres entrevistadas pelo UOL, só duas disseram se considerar bem informadas sobre o pleito. Todas já viram de alguma forma a propaganda eleitoral gratuita na televisão, só uma delas disse ter assistido a debates eleitorais na televisão. O fator tempo e horário dos debates é o principal empecilho, mas também falta interesse. "A maioria dos trabalhadores realmente não tem acesso, não tem interesse e nem tempo para ver debates", diz Aldé, afirmando que o tempo de televisão tem muito mais visibilidade que debates.

Indecisas relatam as propostas que faltam aos candidatos

Arquivo pessoal
A costureira Maria Solene da Silva Nascimento, 44, de Caruaru (PE)
No geral, as eleitoras usam os programas jornalísticos da televisão e os portais de notícias na internet para conseguir se informar sobre os candidatos. Do que conseguem acompanhar, as entrevistadas disseram que querem ver mais propostas concretas sobre geração de empregos e investimentos em segurança pública nas campanhas eleitorais dos presidenciáveis.

Maria Solene, por exemplo, está sentindo na pele os efeitos da crise econômica que o Brasil enfrenta. Está desempregada há quatro meses e diz que nunca viveu uma situação dessas na vida. Ela conta que não consegue enxergar com clareza nas propostas dos candidatos ideias concretas para resolver o drama que está vivendo.

Costureira, ela vive em Caruaru uma região conhecida como um importante polo têxtil no estado de Pernambuco e mesmo assim não consegue emprego. "Nunca vi uma crise tão apertada como agora, não existe emprego, as coisas aumentam todo dia. Não vejo propostas concretas para melhorar a condição do brasileiro. Eu sou a prova disso: estou desempregada, aluguel atrasado, vivendo de ajuda de familiares e vou ter de ir morar com minha família porque a situação só piora", contou.

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A cabeleireira Sandra Alves Bispo, 38, de Arapiraca (AL)

Como cabeleireira autônoma, Sandra Alves Bispo disse que candidato à Presidência que tiver propostas para gerar empregos e, se eleito, tirá-las do papel, vai conseguir "melhorar para todo do mundo", inclusive para ela. "A questão financeira é problema para todo mundo. Eu sou autônoma e não existem propostas para diminuir o desemprego. As pessoas estão sem dinheiro e cortam gastos. Eu estou nesta área de corte de gastos, porque trabalho com beleza", conta.

De fato, o tempo de televisão é bastante curto para alguns candidatos, que não conseguem aprofundar suas propostas nessa mídia o que acaba trabalhando a campanha, segundo Vera Chaia. "Alguns tem usado os programas para chamar os eleitores a acompanhar as propostas na internet, seja nas redes sociais ou nos sites. Quem tem feito muito isso é [Guilherme] Boulos [PSOL] e [João] Amôedo [Novo]. Mas não é todo mundo que vai lá acessar depois do programa eleitoral. Ainda falta essa ligação entre programa eleitoral e outras mídias", diz Chaia.

Cadê as propostas para diminuir a violência?

Apesar da crise, Diana conseguiu manter-se empregada. Ela trabalha em uma gráfica em Porto Velho e diz estar com muito trabalho nos últimos meses justamente porque a empresa está produzindo material usado nas campanhas. Mas diz conhecer muita gente que não consegue arrumar um emprego, que tem recorrido a trabalhos informais para conseguir sobreviver.

"Tem muita gente que está trabalhando sem carteira assinada, aí tem uma renda muito baixa. Isso faz com que as pessoas entrem no mundo errado, sabe? Que queiram ganhar dinheiro mais fácil. E consegue, se não tem emprego, se abre porta para criminalidade. Aí não tem nem como condenar a pessoa", acredita.

O último Atlas da Violência divulgado pelo Ipea mostrou que o Brasil registrou 62.517 mortes violentas intencionais, alcançando a marca histórica de 30 homicídios por 100 mil. O número é 30 vezes que a taxa de assassinatos da Europa. Os presidenciáveis têm usado esses números para falar sobre segurança pública em debates, sabatinas, entrevistas, mas, para Eliane Canedo, eles ainda não conseguiram deixar claro o que pretendem fazer para mudar essa realidade.

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A diarista Sandra Maria Aparecida de Oliveira, 65, de Itanhaém (SP)

"Não consegui entender ou encontrar alguma coisa de fato a respeito da segurança [pública]. Eles falam 'vamos criar', 'vamos implementar'. Mas o que de fato? O que de fato vai acontecer? Para mim, todas as propostas são muito abstratas ainda", diz Eliana.

Sandra, de Arapiraca, e Andreia também acham todo o discurso dos candidatos muito abstrato. "Tudo o que eles falam é genérico. Parece que treinam as respostas das perguntas e as perguntas que fazem aos outros [nos debates]", diz Sandra.

"A segurança se torna urgente no Brasil e não vejo propostas claras e, na verdade, envolve um investimento maior na educação nas crianças. Como uma criança que dorme ouvindo tiro não tem como se envolver com a criminalidade?", acredita Andreia.

Sandra, de Itanhaém, também quer ver mais propostas sobre segurança pública, mesmo que na cidade onde ela mora "nem esteja tão violento". "Mas por aí a segurança está bem abandonada. Mata quem quer matar e ninguém paga por nada", disse.

Para Alessandra Aldé, alguns candidatos têm programas mais claros; outros têm ideias muito genéricas. "Eu acho que vale a pena as pessoas buscarem informação tanto pela internet, no site dos candidatos, alguns tem programas mais detalhados que outros lá, quando através do próprio horário eleitoral", aconselha.

Além disso ela reforça a atenção especial que é preciso ser dada aos candidatos ao Legislativo federal. "Vale a pena ver o histórico dos deputados que estão concorrendo à reeleição, como eles votaram em votações que são importantes. Ai as pessoas podem ter uma noção se elas vão ajudar a reeleger alguém que votou contra os seus interesses ou a favor dos seus interesses", adverte.

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