Análise: após Ciro ocupar vácuo, Lula e fidelidade a PT devem ajudar Haddad

Luiz Alberto Gomes

Do UOL, em São Paulo

  • Montagem UOL/Folhapress/Estadão Conteúdo

    Haddad (e) e Ciro estão numericamente empatados no último Datafolha

    Haddad (e) e Ciro estão numericamente empatados no último Datafolha

Após chegarem a conversar sobre uma eventual chapa combinada e serem chamados de "dream team", Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) agora são adversários diretos por uma vaga no segundo turno da eleição presidencial de 2018. O último Datafolha, divulgado na sexta-feira (14), mostra os dois candidatos numericamente empatados na segunda colocação, com 13% das intenções de voto cada um, atrás do líder Jair Bolsonaro (PSL, 26%) e tecnicamente empatados com Geraldo Alckmin (PSDB, 9%).

Recém-indicado pelo PT como seu presidenciável, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad luta diretamente com Ciro pelos votos dos eleitores que ficaram viúvos sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antes apontado como favorito absoluto nas pesquisas e vetado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com base na Lei da Ficha Limpa.

Ex-ministro da Integração Nacional no governo Lula, Ciro fez uma trajetória política que o levou de partidos como PDS e PSDB à esquerda e hoje busca se firmar como o nome desse campo político. Com a indefinição do PT, que buscava manter a candidatura do ex-presidente mesmo com diversas derrotas na Justiça e só anunciou Haddad após três semanas de campanha, o pedetista cresceu nas pesquisas.

Para cientistas políticos ouvidos pelo UOL, Ciro Gomes se aproveitou bem do vácuo político deixado pelo PT no início da campanha.

"O Ciro tinha a grande vantagem de só ele estar falando com a esquerda, estava brincando sozinho", analisa Carolina de Paula, coordenadora do Iesp-Uerj (Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro) nas eleições.

O professor de políticas públicas do Insper e cientista político Leandro Consentino reforça a tardia nomeação de Haddad como ponto fundamental para o crescimento de Ciro.

"Essa demora de o Lula sair de cena levou o campo de esquerda ter outro adversário que está comendo pela beirada, que de alguma forma pode não trazer todo potencial que o Haddad imaginaria. Esse campo já não está mais tão unificado."

Lula como cabo eleitoral e fidelidade ao PT

Menos conhecido do público, Haddad deve ter como trunfos na briga com o ex-governador do Ceará a estrutura partidária do PT, o tempo maior de TV e rádio, o voto fiel na legenda e, sobretudo, a indicação direta de Lula, principal cabo eleitoral nesta eleição.

"O grande trunfo do Haddad é o Lula. O PT precisa ser capaz de fazer essa ligação de que ele é o candidato do ex-presidente. A eficiência dessa estratégia é que vai determinar as chances do candidato", avalia Glauco Peres da Silva, professor do Departamento de Ciência Política da USP (Universidade de São Paulo).

O papel de Lula como puxador de voto não é algo novo no partido e o próprio Haddad já fez uso da estratégia em 2012, quando deixou o Ministério da Educação para concorrer à Prefeitura de São Paulo. Porém, o desafio do petista é maior em 2018. Ele conta com seu principal cabo eleitoral preso desde 7 de abril em Curitiba, condenado na Lava Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Fábio Vieira/FotoRua/Folhapress
Haddad faz campanha em Osasco (SP) com camisa com desenho do ex-presidente Lula
A estratégia de ligar Lula a Haddad vem sendo adotada pelo PT desde o início oficial da campanha. A associação parece surtir efeito, com Haddad subindo nove pontos percentuais em três semanas e quatro pontos em três dias como candidato oficial.

Além da força do ex-presidente, o voto fiel do PT pode ser um ativo importante, analisa Leandro Consentino.

"A vantagem é que o Haddad tem o eleitorado petista, que é cativo. Perdeu alguma coisa no governo Dilma, no processo do impeachment, mas que recuperou", afirma o professor do Insper. Segundo o Datafolha, o PT é o partido preferido da maioria do eleitorado brasileiro, com 24%. O índice é o mais alto desde 2014 e mostra uma força da legenda principalmente no Norte e no Nordeste. O PDT de Ciro, por outro lado, é a sigla favorita de apenas 1% dos eleitores.

Outra vantagem para Haddad em sua "guerra" contra Ciro pode ser o tempo de propaganda no rádio e na TV. O PT conta com o segundo maior tempo, com 2 minutos e 22 segundos e 5,3 inserções – as propagandas que passam durante os comerciais - por dia. Já Ciro tem o quinto maior tempo, com 40 segundos nos blocos fixos e 1,5 inserção por dia. Esse espaço maior será essencial para comunicar o eleitor, principalmente os mais pobres e que moram longe dos grandes centros urbanos, avaliam os cientistas políticos ouvidos pelo UOL.

A estrutura maior do PT em relação ao PDT e os palanques fortes, sobretudo no Nordeste, são outro ponto que podem ajudar Haddad. O partido conta com governadores em três dos nove estados da região, lidera a corrida eleitoral no Rio Grande do Norte e tem mais três estados onde aliados são os favoritos. O PT ainda conta com governadores no Acre e em Minas Gerais, que costuma ter papel importante na eleição para presidente. Já o PDT conta com dois chefes nos Executivos estaduais, um no Amapá e o outro no Amazonas.

A pesquisadora Carolina de Paula ressalta ainda que Haddad contará com uma força maior na internet, onde o PT já tem uma rede de apoiadores mais consolidada que Ciro. "A esquerda trabalha bem esse modo de campanha online e o Haddad e a Manuela D'Ávila [vice na chapa petista] herdam essa rede. A militância e as lideranças vão entrar e vão começar a compartilhar conteúdo. Isso forma uma rede muito forte."

Campanha "menor" e investigações

Mesmo com as vantagens apontadas, Haddad enfrentará dificuldades que podem beneficiar o candidato do PDT. Além do desconhecimento nacional e as limitações enfrentadas por Lula, ele terá um tempo curto de campanha. Enquanto Ciro começou a rodar o país em uma campanha informal já em 2016 e faz propaganda oficial desde 16 de agosto, o nome do PT terá apenas 28 dias até o 1º turno, já que só foi oficializado em 11 de setembro.

Gabriela Biló/Futura Press
Haddad, na época prefeito de São Paulo, em cerimônia com Dilma em 2013
O professor Glauco Peres da Silva também aponta que Haddad tem o ônus de não trazer o eleitor do seu próprio "quintal" e o passivo de uma derrota ainda no 1° turno em 2016. O petista terá ainda de explicar o governo e o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Além disso, o próprio candidato viu seu nome ligado a acusações de corrupção nas últimas semanas. Ele foi denunciado pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo) por corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro com base em delação do presidente da UTC Engenharia Ricardo Ribeiro Pessoa. Na contramão, Ciro não é alvo de investigação na operação Lava Jato.

Com sua campanha ainda no início, Haddad também já virou alvo de Ciro Gomes, que disse que o petista seria "presidente por procuração" de Lula e que o Brasil "não aguenta outra Dilma", em referência a uma suposta inexperiência dos dois políticos. De olho no voto antipetista, Geraldo Alckmin (PSDB) também já fez ataques e acusou o PT e o ex-prefeito de tentarem enganar o eleitorado.

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