Berço de Ciro e Alckmin, cidade em SP rejeita divisão e "namora" Bolsonaro

Janaina Garcia

Do UOL, em Pindamonhangaba (SP)

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    21.set.2018 - Ciro ao lado da mulher, Giselle Bezerra (c), e da prima, Luciane Branco (e)

    21.set.2018 - Ciro ao lado da mulher, Giselle Bezerra (c), e da prima, Luciane Branco (e)

Citada sílaba por sílaba nos discursos de seu filho político mais ilustre, o ex-governador e candidato à presidência Geraldo Alckmin (PSDB), Pindamonhangaba, no interior de São Paulo, vive situação inédita em sua história durante a atual campanha presidencial. Além do tucano, também é de lá o candidato Ciro Gomes (PDT), embora a carreira política do pedetista tenha surgido e prosperado no Ceará, para onde foi ainda na infância.

No entanto, a cidade situada no Vale do Paraíba parece longe de estar dividida entre Alckmin e Ciro na medida em que, diante das últimas pesquisas de intenção de voto, se projeta um segundo turno entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). Nas ruas de "Pinda", não faltam eleitores indecisos, sem opinião sobre o pedetista, refratários ao tucano, chamado lá de Geraldinho, ou adeptos da candidatura do capitão reformado do Exército.

A apatia do eleitor comum da cidade de dois presidenciáveis contrasta apenas com a torcida de suas respectivas famílias, as quais, com laços de décadas, se dizem, hoje, no máximo "cordiais" uma com a outra. Alckmin tem duas irmãs em Pindamonhangaba; Ciro, uma prima de primeiro grau.

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Vizinha de Maria Aparecida, uma das irmãs do tucano, no bairro do Cardoso, a desempregada Maria Helena Azevedo, 67, é um desses casos de quem diz não saber em quem votar – mesmo que, garante, ela conheça Geraldinho de longa data: há mais de três décadas.

"Quando ele era prefeito, conseguiu uma ambulância para levar meu marido, que estava muito doente, até Taubaté (SP). Ele sempre está por aqui, sempre do mesmo jeitinho. Tenho boas lembranças e sou muito grata a ele", afirma. 

Indagada sobre a estagnação do ex-governador nas pesquisas, Maria Helena dá um longo suspiro: "É que o povo não está muito de acordo com as pessoas que acompanham os políticos, né? O povo está muito desacreditado. Eu mesma não sei em quem votar. E me parece que esse rapaz tem muita chance, né?", diz, referindo-se a Bolsonaro.

Para a desempregada vizinha dos Alckmin, a violência, depois do desemprego, é o que mais assombra. "Esses dias teve jogo do Corinthians e aconteceu até tiroteio aqui. A droga acabou com o nosso sossego, já entrou bandido no meu quintal mais de uma vez. Mas quem sabe Deus não dá uma forcinha ao Geraldinho, né? Esse rapaz que estava aqui hoje [sexta-feira, 21] não parece ser má pessoa, mas não liga muito para Pinda", disse.

O rapaz que ela mencionou é Ciro, que, aproveitando agendas em Aparecida, na mesma região, esticou até a cidade natal. A previsão inicial era uma panfletagem no mercadão da cidade, mas, ainda em Aparecida, comunicou sua assessoria: "Não, vamos para a praça". Lá, foi recebido por uma turma de pelo menos 20 correligionários. Nas palavras do próprio Ciro, seria uma "visita afetiva".

Taxista na cidade há décadas – ele diz ter "mais de 70 anos de idade", apenas --, José Bráulio da Silva conta que faz questão de ir votar, ainda que esteja na faixa etária em que o comparecimento à urna é facultativo, mas diz não se iludir com a origem dos candidatos.

"Todo esse pessoal que disputa hoje a Presidência apoiou algum governo. Tem gente que fala que é daqui, mas que pouco ou nada fez por Pinda", diz. "O negócio está feio". Outro taxista, do mesmo ponto, reforça, pouco antes de entrar no carro para uma corrida: "Geraldinho fala que é daqui, Ciro fala que é daqui, mas o que eles fizeram para a gente? Nada", encerra.

Sobrinha de Alckmin vê Ciro como "radical"

Para os familiares dos dois presidenciáveis na cidade, não resta dúvida de que a eleição será bastante acirrada.

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Myriam Alckmin, prima de Geraldo Alckmin (PSDB)

"Sou de uma geração mais nova, então, não tenho qualquer vínculo com a família de Ciro. Nem ele, na realidade, tem muito vínculo com a cidade. Geraldo tem esse vínculo, já que tem duas irmãs nela – uma delas, minha mãe –e Thomaz, que está sepultado aqui", disse a administradora de empresas Myriam Alckmin, 41, presidente do PPS em Pinda e sobrinha do ex-governador de SP. Ela se referiu ao caçula de Alckmin, Thomaz, morto em um acidente de helicóptero em 2015.

Terceira colocada na disputa municipal de 2016, Myriam minimiza a estagnação do tio nas pesquisas: "As pessoas começam a se definir na reta final; às vezes, nos dois ou três últimos dias. Na situação em que estamos, não dá para testar, arriscar – não é momento de radicalismos", disse.

Questionada se também Ciro teria esse verniz radical –já que, sobre Bolsonaro, o próprio Alckmin o define assim -, foi enfática: "Sim, porque ele sempre esteve associado à esquerda".

Berço de Ciro é mantido em casa da família

Pelo lado de Ciro, Luciane Branco, 53, professora da rede municipal em Pinda, e Diogo Silva, 49, que hoje mora em São Paulo, ambos primos do pedetista, organizaram uma espécie de coordenação informal de campanha na casa onde o pedetista passou parte da infância, a cerca de 500 metros da praça central onde foi recebido nessa sexta por correligionários.

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Os irmãos Diogo Silva e Luciane Branco ao lado do berço que era usado por Ciro quando criança na casa da família, em Pinda

Na casa, que Luciane espera alugar ano que vem, "depois da campanha", a maioria dos cômodos está vazia (só de quartos, são sete), mas o principal item da mobília de décadas foi mantido já na sala: o berço que embalou os primeiros dias do presidenciável e de outras crianças da família.

"O problema aqui é o voto rebelde", avalia, referindo-se aos eleitores de Bolsonaro. "Já votei em Lula e em Dilma, mas jamais no PSDB. Como professora, nem poderia. Mas nossas famílias têm uma relação cordial, tanto que minha mãe deu aula para dona Lu Alckmin [mulher do tucano] e eu sou amiga de uma das irmãs de Geraldo."

Irritado após ser abordado por um simpatizante de Bolsonaro que o filmava, enquanto recebia o primo na praça central, Diogo Silva disse acreditar ser mais fácil trazer ao pedetista o voto do eleitor de Alckmin, que o do candidato do PSL.

"Acho que, com os eventos do dia 29 [de mulheres contrárias a Bolsonaro], vai ficar mais difícil declarar voto em Bolsonaro. E Alckmin se aliou ao centrão."

Dias conta que dá aulas preparatórias a concursos da polícia em São Paulo. Indagado se vê nos alunos algum tipo de inclinação a Ciro, ele admite que isso é bem tímido.

"Nunca a polícia esteve com tanta defasagem de gente e de salário, e isso talvez ajude a explicar a grande tendência desse pessoal em votar no Bolsonaro. Mas o que me anima é ver que há centrais sindicais, à exceção da CUT, apoiando meu primo", diz.

Entre Haddad e Bolsonaro, primo de Ciro escolhe "Uruguai"

Na eleição presidencial de 2002, quando disputou pelo PPS, Ciro obteve pouco mais de 11% dos votos em Pinda. Naquele ano, elegera a cidade natal para o lançamento nacional de sua candidatura. "Ele apanhou muito em 2002, e agora sofreu esse golpe do PT porque o partido inviabilizou a aliança do PSB com o PDT", lembra Silva.

E se o segundo turno ficar entre Bolsonaro e Haddad? "Nesse caso, é bom a gente pensar em se mudar para o Uruguai", brincou. Mais sério, repetiu palavras do próprio Ciro, de dias atrás: "Se for esse mesmo o cenário, eu sento e choro. Mas ainda aposto em fuga de extremismos –e nisso, meu primo leva vantagem."

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