Ato anti-PT tem apoio de 44% ao PSL e idade média de 44 anos, diz pesquisa

Do UOL, em São Paulo

  • RENATO S. CERQUEIRA/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

    Evento na avenida Paulista reuniu manifestantes contra o PT e a favor de Bolsonaro

    Evento na avenida Paulista reuniu manifestantes contra o PT e a favor de Bolsonaro

Uma pesquisa realizada com os manifestantes que participaram do ato contra o PT, no último domingo (21), na Avenida Paulista, em São Paulo, aponta que 44% dos presentes afirmaram ter o PSL, do candidato a presidente Jair Bolsonaro, como partido político preferido. O levantamento foi realizado por pesquisadores do Monitor Digital, da USP (Universidade de São Paulo), e do Núcleo de Etnografia Urbana, da Fesp-SP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo).

De acordo com o estudo, a maior parte dos entrevistados se identificou como branca (67%), e a escolaridade predominante foi o curso superior (71%). A idade média foi de 44 anos, semelhante à observada pelos pesquisadores nas manifestações pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff entre 2015 e 2016.

A pesquisa comparou os resultados com o perfil observado na manifestação "Ele Não", contra Bolsonaro, realizada no último dia 29. Os dados apontam que o ato anti-PT reuniu um público menos escolarizado e com renda um pouco mais elevada. Na manifestação contra Bolsonaro, 86% diziam ter curso superior completo ou incompleto -- no ato anti-PT, foram 71%. No protesto "Ele Não", 65% dos entrevistados com idade entre 35 e 54 anos disseram ter uma renda acima de cinco salários mínimos. Na mobilização antipetista de domingo, esse número foi de 73%.

O levantamento também aponta a evolução da preferência partidária dos manifestantes convocados para o ato anti-PT deste domingo, em comparação com os resultados observados no protesto contra a corrupção realizado em 31 de março de 2017. O PSL, partido mais citado no último domingo, sequer foi lembrado no ano passado, quando Bolsonaro ainda pertencia ao PSC. Ao mesmo tempo, o total que dizia não ter nenhum partido de preferência caiu de 70% para 34% do ano passado para cá.

O estudo também aponta quais os fatores que foram mais determinantes para que os manifestantes comparecessem ao ato anti-PT de domingo. O aspecto mais citado foi a corrupção (60%), seguido pelo apoio a ditaduras (18%), a situação da economia (14%), o suposto risco de distribuição do chamado "kit gay" nas escolas (5%) e a falta de rigor na punição de criminosos (3%).

O estudo foi coordenado pelos pesquisadores Marcio Moretto e Pablo Ortellado, do Monitor Digital/USP, e Isabela Oliveira Kalil, do Núcleo de Etnografia Urbana/Fesp-SP. Veja abaixo o relatório da pesquisa.

Pesquisa no ato "PT Nunca Mais" (21/10/18)

Este relatório apresenta os resultados da pesquisa realizada em 21 de outubro de 2018, na cidade de São Paulo, durante as manifestações PT Não/PT Nunca Mais, último domingo antes do segundo turno das eleições. A pesquisa foi realizada entre 14 horas e 18 horas, na avenida Paulista. Foram realizadas 432 entrevistas do questionário de natureza quantitativa e 20 entrevistas semi-estruturadas, além da observação de campo de natureza etnográfica.

A manifestação foi convocada por diversos grupos antipetistas e de apoio a candidatura de Bolsonaro, entre eles grupos que se projetaram no movimento anticorrupção como MBL, Nas Ruas e Vem Pra Rua. Para as entrevistas do questionário quantitativo, fizemos abordagens aleatórias em toda a extensão da manifestação, das 14h às 17h30 horas. A pesquisa tem margem de erro de 5% com um intervalo de confiança de 95%.

Visão geral da manifestação

A manifestação ocorreu na avenida Paulista, entre as avenidas Consolação e alameda Joaquim Eugênio de Lima. Ao longo da avenida, foram posicionados seis carros de som, representando diferentes frentes e movimentos. Como a manifestação aconteceu durante um domingo, na avenida Paulista, que é lugar de passeio nos fins de semana, é difícil estimar o número de manifestantes, mas eles devem ter sido da ordem de dezenas de milhares.

Da Consolação em direção à Alameda Joaquim, os carros estavam identificados como 1) Nas Ruas, 2) MBL (Movimento Brasil Livre), 3) Avanço Brasil, 4) Vem pra Rua, 5) Vem pra Rua, 6) Despertar Patriótico. Três carros adicionais aguardavam na avenida Consolação na expectativa de se posicionarem na Paulista.

Ao observar os discursos proferidos pelos carros de som, foi possível notar um gradiente das posições políticas, partindo de um discurso mais moderado no primeiro carro, até chegar em discursos e posições de maior radicalidade e agressividade no último carro. No primeiro carro, as falas defendiam o acolhimento das minorias sociais chegando a contar com intervenções de mulheres feministas e representantes LGBT. Também estavam presentes falas pedindo a solidariedade à população nordestina, lembrando a importância desta população na construção da cidade de São Paulo e apontando para o sofrimento de migrantes. O tom do primeiro carro era mais próximo da campanha presidencial oficial, com ênfase na figura de Jair Bolsonaro, especialmente ao tentar construir uma imagem mais "politicamente correta" do candidato.

Já os carros do MBL, do Vem Pra Rua, Avança Brasil (dos dois carros do Vem Pra Rua, um apenas replicava o áudio) estavam apoiando a candidatura de Bolsonaro, mas explicitando pautas próprias e com maior ênfase em uma posição contra o PT (Partido dos Trabalhadores). Estes carros contavam com um menor número de pessoas, em comparação com o primeiro. Já o último carro era o que expressava as posições mais agressivas contra o PT com o funk "Proibidão Bolsonaro" com a letra: "dou pra CUT pão com mortadela / e pras feministas, ração na tigela / as mina de direita são as top mais bela / enquanto as de esquerda tem mais pelo que cadela". Outra música entoada pelos seguidores do último carro foi "tropa de elite é osso duro de roer / pega um, pega geral / também vai pegar o PT".

O mesmo tom esteve presente nas falas de Jair Bolsonaro durante o evento. O candidato não esteve na avenida Paulista, mas participou através de uma transmissão em vídeo em que saudava os manifestantes. O vídeo foi exibido em um telão da avenida Paulista no caminhão de som do grupo "Nas Ruas". Em sua fala: "Só que a faxina agora será muito mais ampla. Essa turma se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria. Nós acreditamos no futuro do nosso Brasil e juntos, em equipe, construiremos o futuro que nós merecemos. Temos o melhor povo do mundo, a melhor terra do planeta, e vamos com essa nova classe política construir realmente aquilo que nós merecemos. Estou aqui porque acredito em vocês e vocês estão aí porque acreditam no Brasil".

Caracterização demográfica

A manifestação foi marcada pela presença das famílias, algumas com os filhos. A idade média foi de 44 anos, como nas manifestações pelo impeachment. A maior parte dos entrevistados se identificou como branca (67%), a escolaridade predominante foi o curso superior (71%). Comparando com a manifestação "Ele Não", anti-Bolsonaro, de 29 de setembro, chama a atenção que essa, anti-PT, é menos escolarizada e com renda um pouco mais elevada.

Comparação de renda por faixa etária nas manifestações

(Idade 35 a 54)

  • Até 2 salários mínimos: 7% (Ele Não), 5% (PT Não)
  • 2 a 3 salários mínimos: 5% (Ele Não), 5% (PT Não)
  • 3 a 5 salários mínimos: 23% (Ele Não), 17% (PT Não)
  • 5 a 10 salários mínimos: 35% (Ele Não), 41% (PT Não)
  • 10 a 20 salários mínimos: 24% (Ele Não), 21% (PT Não)
  • Mais de 20 salários mínimos: 6% (Ele Não), 11% (PT Não)

Comparação de escolaridade nas manifestações

(Superior completo e incompleto)

  • Ele Não: 86%
  • PT Não: 71%

Identidades políticas e histórico de mobilização

Buscamos também verificar a diversidade política dos manifestantes por meio de um questionário sobre identidades políticas (conservadora, feminista e antipetista), sobre preferência partidária e sobre participação em outros protestos. Há grande contraste entre a identidade política desta manifestação e a que medimos nas manifestações anticorrupção de 2015 a 2017 convocadas pelos mesmos grupos (MBL, Vem Pra Rua, Nas Ruas).

Comparando com os dados da manifestação anticorrupção de 31 de março de 2017, vemos um deslocamento muito grande da identidade política, de "nada disso", para direta; de "pouco conservador" para "muito conservador" e da preferência partidária em nenhum partido para o PSL de Jair Bolsonaro. Quanto ao histórico de mobilização, mais de dois terços participou das manifestações que pediram o impeachment de Dilma Rousseff e mais de um terço participou dos protestos de junho de 2013.

Preferência partidária

  • PSL: 44%
  • Novo: 13%
  • PSDB: 2%
  • DEM: 1%
  • Rede: 1%
  • PT: 0%
  • Outros: 6%
  • Nenhum: 34%

Identificação no espectro esquerda-direita

  • Esquerda: 0%
  • Centro-esquerda: 1%
  • Centro: 2%
  • Centro-direita: 14%
  • Direita: 72%
  • Nada disso: 9%
  • Não sei: 2%

Conservadorismo

  • Muito conservador: 74%
  • Pouco conservador: 23%
  • Nada conservador: 2%
  • Não sei: 1%

Feminismo

  • Muito feminista: 8% (geral), 9% (mulheres)
  • Pouco feminista: 15% (geral), 19% (mulheres)
  • Nada feminista: 70% (geral), 70% (mulheres)
  • Não sei: 7% (geral), 2% (mulheres)

Antipetismo

  • Muito antipetista: 91%
  • Pouco antipetista: 5%
  • Nada antipetista: 3%
  • Não sei: 1%

Participação em outras manifestações

  • Junho de 2013: 35%
  • Contra aumento das passagens: 18%
  • Pró-impeachment: 68%
  • Anti-impeachment: 1%
  • Parada LGBT: 5%
  • Marcha da maconha: 1%

Motivação dos manifestantes

Investigamos também a motivação dos manifestantes. Tentamos medir entre diversas características atribuídas à campanha do PT, como o apoio a ditaduras, a corrupção no partido, sua incapacidade na gestão da política econômia, sua leniência no combate ao crime e o fato de Haddad ter distribuído o chamado "kit gay" nas escolas, quais tinham sido as mais determinantes para os manifestantes tomarem as ruas.

O resultado mostra que a corrupção segue o tema mais relevante, mas também a má condução da política econômica e o apoio a ditaduras como na Venezuela foram relevantes.

Confiança na imprensa

Por fim, investigamos o grau de confiança em três veículos da chamada "grande imprensa" e três sites da imprensa alternativa de direita que tem grande difusão no Facebook. Os resultados mostram um grau bastante baixo de confiança na grande imprensa e um grande desconhecimento dos sites alternativos – provavelmente seu grande alcance se deve mais ao conteúdo da manchete do que à marca. Apesar do alto índice de desconhecimento, os sites alternativos tiveram um índice de confiança superior ao dos grandes meios.

Veículos da grande imprensa

  • Folha de S. Paulo: 93% não confiam, 7% confiam
  • Globo: 90% não confiam, 10% confiam
  • Veja: 82% não confiam, 14% confiam, 4% não conhecem

Sites alternativos

  • Notícias Brasil Online: 18% confiam, 20% não confiam, 62% não conhecem
  • Política na Rede: 15% confiam, 25% não confiam, 60% não conhecem
  • Imprensa Viva: 11% confiam, 15% não confiam, 74% não conhecem

Entrevistas semi-estruturadas

Nas entrevistas semi-estruturadas procurou-se responder a duas questões: 1) Qual seria a maior ameaça contra o Brasil hoje? 2) Qual seria a solução? As 20 entrevistas foram realizadas em diferentes carros de som, buscando manter a diversidade de idade, sexo, raça e identidade de gênero.

Dentre as percepções, uma entrevistada transexual afirmou que Bolsonaro não representaria um risco às pessoas trans e que não imagina que haverá redução nos direitos, citando especificamente os tratamentos hoje oferecidos pelo SUS para redesignação sexual. Outro entrevistado apontou a necessidade de que os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) sejam "concursados" e não escolhidos pelos presidentes. De acordo com esta perspectiva, o STF estaria sendo "conivente com a corrupção petista".

Um dos elementos mais comuns entre os entrevistados foi a defesa do voto em cédula. Outro elemento presente nas falas da maior parte das pessoas ouvidas foi a percepção de que elas "foram de graça" em referência às denúncias de que empresários apoiadores de Bolsonaro teriam pago de forma ilegal por uma série de disparos de mensagens pelo WhatsApp durante a campanha. Este sentimento também foi expresso a partir de falas e cartazes "eu sou o caixa 2 de Bolsonaro". Estas posições estavam em consonância com os discursos dos carros de som apontavam que o PT estaria culpabilizando o WhatsApp por uma eventual derrota eleitoral.

Dentre as ameaças, aquelas mais apontadas são "o Brasil se tornar uma Venezuela", criminalidade e corrupção. Algumas pessoas expressaram medo de redução no salário para um eventual aumento de impostos pelo PT, outras falaram sobre o medo de ter que dividir suas casas com pessoas estranhas. Foram apontados também receio de cortes no SUS (Sistema Único de Saúde) pelo PT, riscos da doutrinação marxista (especialmente no ambiente escolar) e riscos do comunismo. Um entrevistado apontou como ameaça uma eventual reação dos "petistas" nas ruas, caso Bolsonaro seja eleito. Esta ameaça é expressa pelo receio de que os militantes de esquerda possam tomar as ruas com manifestações ou atos de vandalismo. Para isso, de acordo com o entrevistado, a solução seria aumentar o policiamento para evitar a atuação política da esquerda e dos movimentos sociais nas ruas.

As percepções sobre as possíveis soluções para as ameaças apontadas pelos entrevistados apontam ainda para a necessidade de serem tomadas medidas para superar o que é definido como instituições enfraquecidas. As respostas variam entre perspectivas que apontam para o endurecimento das penas para os cidadãos comuns visando reduzir a criminalidade e a corrupção até mudanças no próprio código penal. Em várias entrevistas e de formas variadas, foram apresentadas críticas ao poder judiciário brasileiro. Em uma das falas, foi enfatizado que no Brasil a Constituição Federal tem "muitos direitos e pouco deveres, é preciso inverter". Esta percepção é reforçada e encontra respaldo em um dos cantos presentes na manifestação: "o PT é imoral, não a CF [Constituição Federal] nacional". A referência seria uma crítica à possibilidade de que o PT pudesse vir a alterar a Constituição federal, o que para determinados grupos seria um risco ao Estado de direito.

Especificamente sobre como os entrevistados avaliam a figura de Bolsonaro, para parte das pessoas ouvidas, o candidato não é visto como a solução para todos os problemas. Bolsonaro é visto como uma solução para recuperar o "patriotismo" perdido do brasileiro. Bolsonaro também é apontado como uma figura importante na defesa da "família tradicional" e uma espécie de barreira contra pautas consideradas fora da moralidade e, portanto, da "ética e a moral". Bolsonaro é visto como o representante do "novo", o início de um processo mais amplo de mudança no país. Desta perspectiva, o PT é visto como uma ameaça à Constituição Federal e à democracia e Bolsonaro é visto como uma primeira solução contra o PT, o primeiro passo de uma série de mudanças.

Em uma das entrevistas, Israel é apontada como a "nação escolhida por Deus" e o Brasil poderia se tornar também a "terra de Deus". Na manifestação foram visíveis em diferentes carros  de som e com transeuntes a bandeira do estado de Israel. Também estavam presentes a bandeira monarquista, a bandeira da Liga Cristã Mundial, a bandeira dos Estados Unidos, além das bandeiras do Brasil e do estado de São Paulo. Várias pessoas usavam máscaras de papel com o rosto de Bolsonaro. Uma dos adereços mais usados foram as camisetas com estampas diversas em apoio ao candidato, tanto camisetas pretas com o rosto do candidato até aquelas com as cores verde e amarela como os dizeres "Meu Partido é o Brasil" com a indicação da facada sofrida por Bolsonaro.

Estavam presentes em campo repertórios vistos nas manifestações de junho de 2013 e nas manifestações pelo impeachment, em 2016. No primeiro caso, slogans como "O gigante acordou" ou "o Brasil acordou" foram as referências retomadas das manifestações de 2013. De 2016, a perspectiva do "Meu Partido é o Brasil", expressa em um dos cartazes com os dizeres de "não só o PT / são todos os partidos / por isso pedimos intervenção já" um sentimento contra todas as instituições políticas e seus representantes, presente nas manifestações de 2016. Em uma das falas entre os carros de som, a referência a 2016 foi "São Paulo libertou o Brasil com o impeachment da Dilma e vai libertar o Nordeste da necessidade do Bolsa Família".

O relatório também pode ser encontrado no site do Monitor Digital, da USP.

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