Onda Bolsonaro muda rotina de condomínio e leva a peregrinação em portaria

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

  • Hanrrikson de Andrade/UOL

    Eleitor tira foto prestando continência em frente à fachada do condomínio onde Bolsonaro mora com a família, no Rio

    Eleitor tira foto prestando continência em frente à fachada do condomínio onde Bolsonaro mora com a família, no Rio

A portaria do condomínio Vivendas da Barra, onde Jair Bolsonaro (PSL) mora com a família, na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio de Janeiro, transformou-se em um "hospício a céu aberto", como definiu, em tom de brincadeira cordial, uma moradora abordada pela reportagem em 7 de outubro, durante a apuração do primeiro turno da corrida presidencial.

Desde então, o local, situado na badalada avenida Lúcio Costa, em frente à praia da Barra, tem sido frequentado por apoiadores e eleitores do candidato, turistas, comerciantes e até os "peregrinos" --simpatizantes que viajam de outros estados em busca de um encontro com o candidato.

Leia também

Alguns personagens ficaram tão conhecidos que, na última sexta-feira (26), houve comemoração de um aniversário, com direito a bolo, salgadinhos e refrigerante, no canteiro próximo à entrada da propriedade.

A movimentação intensa afetou a rotina do condomínio, que reforçou a segurança --chegou a contratar uma empresa privada-- e colocou grades para delimitar espaços na calçada. Carros da Polícia Militar se posicionam nos arredores diariamente, e veículos da Polícia do Exército realizam rondas pela região. A Guarda Municipal foi acionada para isolar vagas de estacionamento, limitando-as.

Hanrrikson de Andrade/UOL
Grades foram instaladas para delimitar espaços no acesso ao condomínio

No sábado (27), moradores receberam um comunicado da administração que orientava que eles votassem neste domingo (28) o mais cedo possível.

A preocupação, tanto com os bens patrimoniais quanto com a integridade do próprio Bolsonaro, foi tamanha que uma câmera foi colocada no canteiro frontal à entrada do condomínio. A administração e a Polícia Federal, esta última responsável pela escolta do candidato, não explicaram as circunstâncias da instalação do equipamento. O pesselista está submetido a forte esquema de segurança desde que foi vítima de um ataque a faca durante atividade de campanha em Juiz de Fora, em Minas Gerais, no dia 6 de setembro.

Após passar por duas cirurgias e receber alta do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, Bolsonaro voltou para casa, no Rio, em 29 de setembro. Sem poder se deslocar, ele montou em seu próprio apartamento o quartel-general da campanha, recebendo diariamente visitas de políticos e apoiadores.

A movimentação atraiu a presença da imprensa e dos curiosos. Começava ali uma maratona diária que, ao que tudo indica, deve se estender caso o político seja eleito presidente neste domingo.

Hanrrikson de Andrade/UOL
Alexandre Goulart e seu fiel escudeiro, o gato Chiquinho, também passaram pela portaria. O felino ficou famoso no ano passado após aparecer na TV

Romaria em frente à fachada

A portaria passou a atrair ainda mais pessoas depois que, em 7 de outubro, eleitores se aglomeraram no local à espera de uma vitória no primeiro turno --o que acabou não se confirmando. Na ocasião, dezenas de pessoas chegaram, em alguns momentos, a interromper o trânsito para festejar e aguardar a saída do candidato, que era esperado para uma entrevista coletiva de imprensa no hotel Windsor, vizinho ao condomínio.

Bolsonaro, no entanto, decidiu ficar em casa e se pronunciar por meio de uma transmissão ao vivo nas redes sociais.

Nas três semanas de campanha do segundo turno, a cena mais comum presenciada nas imediações da propriedade era a de pessoas (turistas ou não) tirando selfies em frente ao letreiro na fachada.

Além disso, na esteira da principal estratégia de comunicação do concorrente do PSL, realizavam "lives" em redes sociais como Facebook e Intagram, ou até mesmo faziam chamadas de vídeo para parentes e contavam com orgulho que estavam conhecendo a portaria do "condomínio do Bolsonaro".

Sempre com o celular a postos, eleitores e apoiadores do pesselista também filmavam o trabalho dos jornalistas, quase sempre posicionados nos canteiros laterais, e alguns chegavam a se aproximar de maneira hostil.

Em 7 de outubro, durante a apuração do primeiro turno, uma equipe de reportagem da TV Globo foi expulsa do local por militantes mais exaltados.

Hanrrikson de Andrade/UOL
Christian, conhecido como "Papito", comemora aniversário em frente ao condomínio
Um dos personagens mais populares da portaria do condomínio Vivendas da Barra é o comerciante Christian, que se apresenta apenas como "Papito".

Ao observar a intensa movimentação no local, ele teve uma ideia bem lucrativa: começou a vender camisas com a estampa do rosto de Bolsonaro, bandeiras do Brasil e outros artigos com mensagens de apoio ao capitão reformado do Exército.

Com o fenômeno eleitoral concentrado na candidatura de Bolsonaro e a ausência de concorrentes, Christian prosperou. Contudo, sempre que era questionado pelos jornalistas sobre as vendas, em tom de brincadeira, Papito limitava-se a responder: "Hoje está fraco. Mas vai melhorar!".

O convívio diário fez surgir uma relação de amizade entre o comerciante e os jornalistas que faziam diariamente plantão na porta do condomínio. Na última sexta (26), Papito comemorou o seu aniversário junto aos profissionais da imprensa. Levou refrigerante, bolo, salgadinhos e outros aperitivos para o local. Questionado se gostaria de conceder uma entrevista ao UOL, esquivou-se: "Eu não! Não quero ficar famoso!".

Os peregrinos

Hanrrikson de Andrade/UOL
Dona Lourdes persistiu até conseguir um encontro com o candidato Jair Bolsonaro (PSL)

Durante as últimas três semanas, muitos simpatizantes de Bolsonaro viajaram de outros estados e se dirigiram à portaria do condomínio. A reportagem do UOL presenciou casos de pessoas que saíram da Paraíba, do Maranhão, de Minas Gerais e de São Paulo na expectativa de um encontro com Bolsonaro. Nem todos conseguiram.

Não foi o caso, por exemplo, da dona de casa Maria de Lourdes Gonçalves, 55, natural de Medina (MG), na divisa entre Minas Gerais e Bahia. Ela levou 18 horas de ônibus em viagem ao Rio de Janeiro somente para conhecer o candidato a presidente.

Aproximou-se, para tal, de dois candidatos a deputado na capital mineira, que possibilitaram que ela chegasse ao contato do deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS), anunciado ministro da Casa Civil caso Bolsonaro seja eleito hoje.

"Eu já estava quase desistindo, mas conheci dois deputados lá de Belo Horizonte e contei para eles que estava aqui. Um deles falou com o Onyx e disse para eu vir aqui [na portaria]. Só no terceiro dia que eu consegui. Um dos assessores do Bolsonaro disse que não seria possível, mas o Onyx falou com o Bolsonaro e ele me recebeu", relatou Lourdes. O encontro ocorreu na última terça-feira (23).

Questionada sobre o motivo da devoção ao político, a dona de casa respondeu que Bolsonaro seria o que melhor se encaixa em dois anseios já explorados à exaustão pelo candidato em sua plataforma de campanha: o combate à corrupção e a segurança pública.

"Eu sou evangélica. Primeiramente minha esperança está em Deus. E segundo nele [Bolsonaro]. Chega de tanto roubo, é roubo demais. É roubo aqui, é presidente preso, tesoureiro preso, ministro da Fazenda preso... É todo mundo ladrão? Não sobrou nada?".

"Não pedi nada. Acho as propostas dele boas. E outra coisa: eu tive um filho assassinado. E [o pessoal dos] direitos humanos nunca me procurou para nada. O cara que matou meu filho tem direitos humanos para ele. Para o meu filho, nunca teve", contou ela.

Hanrrikson de Andrade/UOL
Glênio Ritter, 52, ficou conhecido como o "médico solitário" na portaria do condomínio

O 'médico solitário'

Quem esteve na portaria de Bolsonaro nas últimas três semanas, sobretudo durante a tarde, certamente notou a presença de um homem branco, loiro, 52, com camisa e faixa de apoio ao Bolsonaro.

Posicionado sempre sozinho no canteiro frontal ao condomínio, ele costuma apenas levantar o punho e dar socos no ar quando os motoristas passam buzinando pelo local.

Este é o médico gaúcho Glênio Ritter, que mora no Rio há 18 anos e diz ser eleitor de Bolsonaro "há muito tempo". Conhecido como o "médico solitário", Ritter comparece religiosamente aos arredores do condomínio há mais de um mês, todos os dias. Sempre com a mesma faixa, que contém o nome do presidenciável e o pedido de voto no número dele.

"Tirei férias e fechei meu consultório especialmente para essa campanha. Para mim, é um momento decisivo para o país. Estou aqui apoiando o Bolsonaro porque, para mim, ele é a pessoa que hoje representa os anseios de grande parte da população de bem desse país."

Ritter diz que a ideia de fazer campanha pró-Bolsonaro no local surgiu depois que ele viu convocações para passeatas na Barra da Tijuca. Após o atentado sofrido pelo candidato, ele afirma ter percebido que "Bolsonaro precisava de apoio".

"Na verdade, eu tinha feito isso sem pretensão alguma. Comprei uma bandeira e soube que ia ter uma passeata aqui nos domingos. Foi tudo improvisado. Fui a uma loja de material de artesanato, eu mesmo que fiz. Recortado, imprimi as letras, recortei, marquei. Tentei colar e não consegui. Foi costurado mesmo. Levei uma semana para fazer essa faixa. Acabou que saiu um resultado legal."

Segundo estimativa do próprio médico, ele gastou cerca de R$ 70 para produzir o material. "Eu estou de graça, sim. Tem gente que duvida. A gente acaba gastando. E, para mim, isso não importa. Eu quero o bem do país, o bem da nação e isso que importa."

Receba notícias do UOL. É grátis!

UOL Newsletter

Para começar e terminar o dia bem informado.

Quero Receber

Veja também

UOL Cursos Online

Todos os cursos