Eleito, Doria perde na capital paulista com rejeição massiva da periferia

Camila Rodrigues da Silva, Talita Marchao e Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

  • Marcelo Gonçalves/Estadão Conteúdo

    O tucano João Doria faz campanha no final de outubro com a senadora eleita por São Paulo, Mara Gabrilli (à dir.)

    O tucano João Doria faz campanha no final de outubro com a senadora eleita por São Paulo, Mara Gabrilli (à dir.)

Eleito nesse domingo (28), João Doria (PSDB) havia deixado a prefeitura da capital paulista para concorrer ao governo. Em São Paulo, entretanto, ele perdeu a eleição. O governador em exercício, Marcio França (PSB), venceu em 43 das 58 zonas eleitorais da capital paulista.

maior rejeição de seu adversário foi na periferia da cidade, especialmente nos bairros do extremo sul e do extremo leste. Doria teve 2.447.309 votos paulistanos (41,9% dos votos válidos) enquanto França contabilizou 3.393.092 votos (58,1%) 

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Na zona leste, França venceu com folga na Cidade Tiradentes (77,8%), em Guaianases (74,76%), no Jardim Helena (72,88%), no Itaim Paulista (72,53%) e em José Bonifácio (70,4%). No extremo sul, o candidato do PSB liderou em Parelheiros (76,7%), Grajaú (75,82%), Piraporinha (73,97%) e Valo Velho (72,53%). Em Perus, na zona oeste, o candidato do PSB alcançou os 70%.

As três zonas eleitorais em que Doria venceu com mais de 60% foram o Jardim Paulistano (vizinho de seu bairro de residência, o Jardim Europa), Indianópolis e Santo Amaro. As 15 zonas eleitorais em que Doria vence estão localizadas no chamado "centro expandido".

Proporcionalmente, a votação de Doria foi pior do que a de França em comparação com a do primeiro turno. O ex-prefeito liderou com 26,34% na votação de 7 de outubro e cresceu 67,53% de lá para cá; já o atual governador contabilizou 22,16% no primeiro pleito e avançou 176,06% nos últimos 22 dias.

Comparação com eleições municipais

Se forem considerados número de eleitores, o desempenho de Doria foi menor do que o das eleições municipais de 2016. Naquela ocasião, o tucano foi eleito com 3.085.187 de votos contra 2.447.309 recebidos neste domingo.

Naquela época, foi a primeira vez que um candidato conseguiu mais de 50% dos votos e se elegeu no primeiro turno para a Prefeitura de São Paulo. Também foi o melhor resultado do PSDB em proporção de votos no primeiro turno nas eleições municipais dos últimos 20 anos.

Aquele resultado contrariou o comportamento histórico do centro expandido, que tradicionalmente votava em peso no PSDB, e as periferias, no PT -- foram os bairros das bordas da cidade que elegeram o prefeito que se apresentava então como "gestor" e não político.

Punição dos eleitores da periferia

Na opinião de Américo Sampaio, coordenador da Rede Nossa São Paulo, grupo que reúne 700 organizações da sociedade civil que acompanha as políticas municipais, o eleitor da periferia votou em desaprovação ao mandato de Doria como prefeito.

"Doria fez um governo que não conseguiu melhorar a qualidade de vida da periferia e, somado a isso, abandonou a prefeitura, o que causou uma rejeição muito grande. Acredito que, nas regiões periféricas da cidade, foi um voto de castigo, enquanto nas regiões mais nobres, onde Doria ganhou, o voto teve viés mais ideológico, voltado ao antipetismo", afirmou. 

Sampaio lembra que a gestão Doria paralisou uma série de ações que eram executadas nas periferias quando assumiu a prefeitura da cidade, em 2017. "Em um ano e meio, a periferia não viu nenhuma mudança estrutural. Por exemplo, todas obras dos CEUs (Centros de Educação Unificados) foram congeladas. A parte de mobilidade, como os corredores de ônibus, também foi paralisada. Os dois hospitais que Haddad deixou quase prontos ainda não foram entregues", afirma.

"Em relação às creches, Doria conseguiu avançar, mas por meio de convênios com organizações particulares, e não por equipamentos de sua própria administração, o que tira a qualidade do serviço. Além disso, o Corujão da Saúde, que foi a grande bandeira de sua campanha na prefeitura, não necessariamente assegurou o atendimento básico nas UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e com maior número de médicos na atenção primária de saúde", enumera o especialista.

Para a cientista política Jacqueline Quaresemin, da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), França também pegou carona na busca de votos para Fernando Haddad (PT), que disputou à Presidência. "Organizações ligadas ao campo democrático fizeram uma campanha pró-França ou, de algum modo, tentaram fazer a dobradinha não oficial entre Haddad e França na periferia, na linha 'vote 13 e 40'", afirma a professora.

"Se a gente pensar no território da cidade de São Paulo, o governo do estado não chega à periferia. O governo brasileiro, de modo geral, só chega às bordas pela bala, e não com saneamento e políticas públicas. Ele só chega no dia das eleições por causa dos trabalhos do campo democrático, que neste caso tentavam reverter votos também para a candidatura de Haddad", acrescenta Jacqueline.

Já o cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Eduardo Grin afirma que "historicamente o PT tem apoio maior nas zonas sul e leste e de parte da zona norte. Esse eleitorado histórico do PT se identificou melhor com o França".

Para ele, essa identificação pode ter sido até reforçada pela própria propaganda de Doria, que associou o rival ao comunismo. "Esse tipo de apelo ao medo é mais útil a um eleitor menos informado, que vive nas cidades menores. Estes votaram no Doria muito por rejeição à esquerda. Mas esse apelo tem menos eco no eleitor mais esclarecido, morador das grandes cidades."

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