Em troca de apoio, agronegócio cobra candidatos por segurança no campo

Adriana Ferraz e Paulo Beraldo

  • Getty Images

O avanço da violência no campo desde a última eleição presidencial, em 2014, levou representantes do agronegócio nacional a elegerem o tema da segurança pública como um dos principais entraves para o desenvolvimento do setor e também um dos maiores desafios para os pré-candidatos que buscam apoio e voto dos produtores agrícolas.

Na pauta de reivindicações estão a expansão de programas de patrulha rural, a criação de delegacias especializadas e a abertura de um debate sobre a flexibilização do Estatuto do Desarmamento.

Com a tecnologia empregada hoje no campo, a preocupação dos agricultores e pecuaristas deixou de ser o risco de ter suas propriedades invadidas por movimentos sem-terra para a possibilidade de ver seus investimentos em maquinário e insumos, por exemplo, serem perdidos em roubos praticados por quadrilhas especializadas.

Dados oficiais do governo de Mato Grosso, maior produtor de grãos do País, mostram uma alta de 60% nos registros de roubos e furtos no campo entre 2014 e 2017. No mesmo período, houve incremento de 20% dos índices em Goiás, de 7,5% no Rio Grande do Sul e de 4% em Minas Gerais - onde a média dos últimos dois anos é de 139 casos por dia (mais informações no quadro). O setor representa 21,5% do PIB, sendo considerado a atividade econômica mais dinâmica hoje do País - ano passado obteve safra recorde, com 230 milhões de toneladas de grãos, uma alta de 13%.

Para pressionar os presidenciáveis a apresentarem propostas que solucionem ou, ao menos, amenizem o problema, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) passou a produzir uma estatística própria. Criado em 2016, o Observatório da Criminalidade no Campo serviu de base para um estudo com propostas que será apresentado quarta-feira ao ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, e ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), um dos pré-candidatos à Presidência. Os demais também receberão o material até as eleições.

"Nossa primeira intenção foi montar um banco de dados que nos ajudasse a identificar como e onde ocorrem os crimes, já que a maioria dos Estados não têm essas informações, por incrível que pareça. A partir daí, vamos ter condições de avaliar que tipo de política pública funcionaria e como cobrar por elas", afirmou ao Estado o secretário executivo do Instituto CNA, André Sanches.

Os relatos colhidos com produtores rurais nos últimos 18 meses mostram, por exemplo, que 72% dos furtos e roubos são "encomendados". "Os bandidos entram nas fazendas sabendo muito bem o que querem levar, o que mostra organização e planejamento. Não são crimes de ocasião, como chamamos. E isso ocorre porque existe um mercado paralelo de insumos agrícolas que custam caro", disse Sanches.

Patrulhas. Presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Márcio de Freitas afirma que a falta de segurança levou algumas organizações a adotarem a entrega limitada dos insumos como prevenção. "Há esquemas especiais de distribuição, nos quais os produtores só podem pegar os itens na medida em que forem utilizar." Freitas pede dos presidenciáveis projetos de patrulhas rurais em parceria com a iniciativa privada.

Foi o que um grupo de fazendeiros de Goiás fez. Para se protegerem, produtores de 50 dos 246 municípios do Estado participam de programa de patrulha rural da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), uma parceria de sindicatos com o governo. Segundo o assessor jurídico da entidade, Augusto César de Andrade, a implementação de tecnologias no projeto, como o uso de GPS e de drones, diminuiu o tempo de resposta das ocorrências, agilizando a ação da polícia. "Com a geolocalização das propriedades, é possível fazer rondas em locais de difícil acesso", disse ele.

Depois de ter sua propriedade em Santa Mariana, no Paraná, assaltada três vezes, o produtor de soja Jayme Telles, de 57 anos, passou a defender não apenas a expansão das patrulhas rurais, mas uma discussão aprofundada sobre flexibilizar o Estatuto do Desarmamento.

"Precisamos ter armas na fazenda, até por causa dos animais. Vire e mexe aparece uma onça por lá. Me espanta esse tema não ser amplamente trabalhado pelos pré-candidatos. A violência não está mais só nas cidades", afirmou Telles, que já perdeu mais de R$ 300 mil com o roubo de produtos para irrigação. Após o prejuízo, o fazendeiro contratou três guardas.

Armas. Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Arlindo Moura, o avanço da violência nas zonas rurais justifica o debate sobre armar a população. "Qual a solução? Para mim, ela só virá no momento em que as fazendas possam estar armadas. Hoje, em função da lei do desarmamento, ele (criminoso) tem certeza de que ninguém tem arma."

O agricultor Antônio Junqueira, de Colina, no interior paulista, também já sofreu três assaltos em sua propriedade na qual planta bananas, eucalipto, cana-de-açúcar e seringueira. Ele comenta que, no pior dos assaltos, ocorrido há três anos, criminosos roubaram 30 mil quilos de borracha. Na época, o prejuízo totalizou R$ 115 mil. "Isso equivale a dois caminhões de 15 toneladas cada um. É gente estruturada, que rouba e depois vende sem nota, o que é pior ainda", afirmou ele.

Nos crimes anteriores, em que lhe roubaram defensivos agrícolas e fertilizantes, contabiliza perdas próximas a R$ 200 mil. "Antes era um paraíso, dormia de janela aberta. Agora, com tudo isso, escutamos carros passar de noite e ficamos preocupados", disse Junqueira. 

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