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Leia a transcrição da entrevista de Odair Cunha à Folha e ao UOL

Do UOL, em Brasília

04/05/2012 07h00

Odair Cunha (PT-MG), deputado federal relator da CPI do Cachoeira, participou do "Poder e Política", projeto do UOL e da Folha conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 3.mai.2012 no estúdio do Grupo Folha em Brasília. Fotos da entrevista de Odair Cunha.

 


>> Fotos da entrevista com Odair Cunha.

 

Leia a transcrição da entrevista:

Odair Cunha – 3/5/2011

Narração de abertura: Narração de abertura: Odair José da Cunha tem 35 anos. É filiado ao PT e está em seu 3º mandato como deputado federal de Minas Gerais.

Formado em Direito, Odair foi consultor jurídico de Prefeituras e Câmaras de Vereadores do sul de Minas. Chegou à Câmara em 2002 e  já teve funções importantes na Casa.

No governo Lula, relatou a Medida Provisória que criou o Bolsa Família. No governo Dilma, relatou a DRU, que liberou dinheiro para a presidente usar como quiser.

Agora, Odair Cunha é o relator da CPI do Cachoeira. Cabe a ele determinar o modo como a investigação será conduzida.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política – Entrevista".

Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo, dos portais UOL e Folha.com. A gravação é realizada aqui no estúdio do Grupo Folha em Brasília.

O entrevistado desta edição do “Poder e Política” é o deputado federal Odair Cunha, do PT de Minas Gerais, relator da CPI do Cachoeira.

Folha/UOL: Deputado, muito obrigado por sua presença. Eu começo perguntando: a maioria dos integrantes da CPI do Cachoeira pertencem ao PT ou a partidos ligados ao governo. Essa CPI corre o risco de ser chapa branca?
Odair Cunha: De nenhuma forma. Aliás, essa maioria é graça ao voto que todos esses partidos que compõem a base de sustentação do governo da presidenta Dilma têm. Exatamente essa maioria de votos que legitima a participação desses partidos, daqueles parlamentares naquela CPMI.


Folha/UOL: Agora, é um fato que na reunião inicial, em que a CPI começou a funcionar nessa semana, alguns nomes já citado nesse escândalos ficaram de fora. Não foram convocados, não tiveram seus sigilos quebrados. Isso não é uma indicação de que o governo joga um pouco de água na fervura?
Odair Cunha
: É indicação de que nós queremos faze ruma investigação que promova um resultado sério. Nós não queremos ficar convocando, quebrando sigilo sem nenhum tipo de critério. O critério que nós queremos promover é o critério primeiro da análise dos autos dos dois inquéritos da Polícia Federal. A partir desta análise, nós vamos opinar favoravelmente a outras convocações, outras quebras de sigilo.

Folha/UOL: A CPI começa com um prazo de 180 dias [para terminar], como toda CPI. Esse prazo é suficiente ou o sr. já imagina que seja necessário prorrogar?
Odair Cunha
: Eu espero que nós terminemos essa CPMI no prazo original, 180 dias. Não vejo necessidade. É claro que a investigação vai mostrar para nós se  há necessidade ou não de nós produzirmos uma investigação por maior tempo.

Folha/UOL: O sr. vai ter o recesso agora, pequeno, no meio do ano. O sr. imagina que seja necessário trabalhar com a CPMI dentro do prazo do recesso ou a CPMI vai parar dentro do recesso?
Odair Cunha
: Primeiro é importante a gente ter clareza que uma CPMI não trabalha só com oitivas, com sessões, com audiências. Porque muitas vezes você pensa: “não precisamos fazer duas, três, quanto mais audiências por semana, melhor”. Não é verdade. É preciso ter tempo para análise de documentos, das quebras de sigilo fiscal, telefônico, bancário. Para as interceptações telefônicas que nós teremos acesso. Então eu diria que nós não teremos oitiva no recesso, mas a CPMI, seu trabalho de investigação vai perdurar durante todo o período de recesso e durante todo o tempo do processo eleitoral.

Folha/UOL: A mídia, todos nós, analisamos os integrantes da CPI. E não é segredo que aproximadamente um em cada três integrantes da CPI responde por algum tipo de acusação, algum tipo de irregularidade que supostamente teria cometido. O sr. acha que isso, em certa medida, tira legitimidade desses integrantes que também são investigados?
Odair Cunha
: Eu digo que a legitimidade está no voto que cada parlamentar teve para lá estar. Exatamente considerando essa legitimidade que nós precisamos respeitar as pessoas que lá estão. E acredito também que todos nós temos a noção exata da responsabilidade que temos, que é fazer uma investigação séria, que desvende e compreenda essa organização criminosa que foi criada pelo Carlos Cachoeira, suas ramificações no Estado brasileiro. Essa é a tarefa que nós temos. Eu acredito que a CPMI como um todo, oposição e situação, tem noção exata dessa responsabilidade.

Folha/UOL: Se o sr. perceber durante os trabalhos que alguns desses que têm conhecimento, amizade com essas ramificações do Cachoeira estão atuando ali para atrapalhar os trabalhos, que atitude o sr. tomaria?
Odair Cunha
: Conhecimento, amizade não significam relação criminosa. Eu acredito que todos nós lá temos consciência do trabalho que temos a desenvolver. Eu não acredito que haverá nenhum tipo de proteção a essa ou àquela pessoa. O que nós queremos é investigar essa relação criminosa.

Folha/UOL: Vou dar um exemplo concreto. O deputado Protógenes Queiroz, do PC do B de São Paulo, teve contatos muito estreitos com Idalberto Matias Araújo, o Dadá, que também tem ligações com o grupo de Carlos Cachoeira. Esse tipo de conexão é boa?
Odair Cunha
: Eu diria que é da responsabilidade do deputado Protógenes se pronunciar a respeito das denúncias que são feitas a ele. Não vou aqui tecer comentários sobre o comportamento do parlamentar. O que eu acredito é que ele também está imbuído do espírito de produzir uma investigação séria. E nós vamos, é claro, acompanhar o trabalho de todos da CPMI, inclusive do deputado Protógenes.

Folha/UOL: Carlos Cachoeira está preso aqui em Brasília na penitenciária da Papuda. Ele vai depor à CPI, está marcado, em 15 de maio. Ele deve ir a esse depoimento da CPI chegando algemado, com as vestes prisionais?
Odair Cunha
: Isso é um tema que será tratado pelo presidente da CPMI. Ele vai cuidar de convocar e de criar as condições necessárias para nós ouvirmos todas as pessoas que nós vamos ouvir na CPMI. É um tema que interessa ao presidente da CPMI. Eu quero é ouvir as respostas do Cachoeira.

Folha/UOL: O sr. tem alguma opinião sobre esse tema? Cachoeira ir depor tal como fica vestido na penitenciária da Papuda?
Odair Cunha
: Eu creio que isso é irrelevante. O mais importante é que ele esteja na CPMI. É claro, que seja tratado com dignidade como todas as pessoas devem ser tratadas, com dignidade. E evidentemente eu estou preocupado é com as respostas que ele dará. Exatamente por isso nós não quisemos convocá-lo num primeiro instante. Nós queremos ter ciência do inteiro teor dos autos da Polícia Federal e, a partir do inteiro teor dos autos desses dois inquéritos, nós vamos convocá-lo.

Folha/UOL: Por que eu pergunto? Porque réus, ou pessoas que estão condenadas e presas, quando são levadas para depor em alguma Vara de Justiça, em geral, saem da prisão com as chamadas vestes prisionais. E vão algemadas. Em geral é assim. Nesse caso, o sr. acha que o tratamento que ele deve receber é como qualquer um que está preso e vai depor numa Vara de Justiça?
Odair Cunha
: Claro. Ele vai na condição de preso.

Folha/UOL: Não terá privilégios?
Odair Cunha
: De forma nenhuma. Como nenhum outro. Agora, será tratado com dignidade.

Folha/UOL: Ainda que, se for o caso, vá com as vestes prisionais e algemado até chegar ao Congresso?
Odair Cunha
: Isso é um tema que o presidente da CPMI vai cuidar. Não me interessa isso. Eu vou cuidar da análise do inquérito e das perguntas que farei a ele.

Folha/UOL: O presidente da CPI não falou nada com o sr. a respeito desse tema ainda?
Odair Cunha
: Não.

Folha/UOL: O sr. acha que já é certo que, num segundo momento na CPI, que sejam convocados os empresários citados nesse episódio? Por exemplo, Fernando Cavendish, o dono da empreiteira Delta?
Odair Cunha
: Eu estou dizendo e inclusive gostaria de repetir aqui. Nós vamos investigar qual é o papel da Delta na organização criminosa do Carlos Cachoeira. A que ela se prestava? Qual era a relação de subordinação da Delta? Está evidente que o diretor [da Delta], que foi preso, Cláudio Abreu, tem uma relação, eu diria, muito intrínseca com a organização criminosa.


Folha/UOL: Foi convocado para depor já.
Odair Cunha
: Exatamente por isso. Outras pessoas nós vamos analisar a partir dos autos do inquérito da Polícia Federal. A partir dessa análise, nós vamos ter condições de dizer se vamos convocar o sr. Fernando Cavendish ou não.


Folha/UOL: Agora, tanto eu quanto o sr. que estamos acompanhado, por dever de ofício, esse caso, nós já lemos muito a respeito. O sr. não começou nem a formar um pouco de convicção, ainda que o sr. ache que agora não é o momento da convocação de Cavendish?
Odair Cunha
: Não. Porque eu estou me pautando pela análise, eu diria, dos documentos oficiais, autênticos, que o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, nos encaminhou nessa semana. Eu não quero basear minha opinião de investigador nesse processo, coordenador do processo de investigação, a partir das notícias dos jornais e da televisão. É claro que isso é natural, a mídia cumpre o seu papel, está correto em fazê-lo. De igual maneira, não está correto eu pautas a investigação a partir da opinião dos jornais. Por isso que eu estou tomando todo o cuidado, todo o critério, para garantir que as pessoas estejam lá convocadas a partir de uma análise dos autos que nós temos em mão uma parte agora.

Folha/UOL: A mídia teve acesso, como qualquer pessoa hoje tem acesso, de maneira informal, aos autos dessas investigações que foram colocados na internet. Sendo verdadeiros, nada indica que não sejam, se o sr. chegar à conclusão de que é necessário convocar Fernando Cavendish, dono da Delta, ele seria convocado. É isso?
Odair Cunha
: Sim, claro. Se ficar evidenciado que a Delta como um todo ou que o sr. Fernando Cavendish participou dessa organização criminosa, colaborou com ela, ele deve ser chamado também.


Folha/UOL: Com dolo ou sem dolo, ainda que, enfim, ele alegue que não tinha, porque ele já deu entrevista dizendo que não tinha conhecimento de tudo o que Cláudio Abreu, diretor pelo Centro-Oeste fazia. Essa é uma boa desculpa para que ele não seja convocado?
Odair Cunha
: Essa investigação vai mostrar, não tem condição de eu lhe antecipar.


Folha/UOL: Apareceu um nome recentemente, Georges Sadala Rihan, que seria dono de uma empresa de factoring que teria imbricações aí com Delta e talvez também com o esquema, não se sabe. Esse sr. também se encaixa na mesma situação. Se for necessário, será convocado?
Odair Cunha
: Todas as pessoas que tiveram participação com a organização criminosa devem ser consideradas pela CPMI, devem ser convocadas e devem ter sigilos fiscal, bancário e telefônico quebrados. É o que eu defendo.


Folha/UOL: Inclusive os governadores que foram citados até o momento, se for comprovado ou se houve indício a respeito do envolvimento deles?
Odair Cunha
: “Citados” é uma coisa. Ter participação na organização criminosa, ser cooptado, ter sido corrompido é outra coisa. Se ficar evidenciado cooptação e corrupção, este tema dos governadores deve ser tratado por nós [da CPI], com convocação, com envio desses elementos para o Ministério Público dos seus Estados, para as Assembleias Legislativas. É o que eu estou defendendo.


Folha/UOL: Até agora três governadores foram citados e há indícios, não provas, de que eles teriam alguma relação com esse esquema. São eles, por ordem alfabética: Agnelo Queiroz, de Brasília, filiado ao PT, Marconi Perillo, de Goiás, filiado ao PSDB, e Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, filiado ao PMDB. Nesses três casos se aplica a regra que o sr. falou. Se houver algum indício mais robusto de envolvimento de um deles, eles teriam que ser chamados?
Odair Cunha
: Evidentemente. Porque nós queremos identificar se houve cooptação e corrupção. Se houve, eles devem ser investigados.


Folha/UOL: Todos nós ouvimos ali nos corredores do Congresso que há um pacto entre PT e PMDB para que um não convoque o governador do outro. É possível esse pacto prosperar?
Odair Cunha
: O pacto eu diria que é um só: produzir uma investigação séria. Ademais não é só PT e PMDB que existem nessa CMPI. Nós temos um conjunto de outros parlamentares, partidos, que participam da CPMI e têm o mesmo compromisso que o PT e o PMDB têm, que é produzir uma investigação séria.

Folha/UOL: A Justiça já autorizou o procurador-geral da República a investigar o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, do PT. O fato de haver essa autorização, já haver essa investigação plenamente legal, autorizada pela Justiça, não justifica o fato de que a CPI também o convocasse?
Odair Cunha
: Nós inclusive estamos esperando os documentos do procurador-geral da República. Os documentos que motivaram o procurador-geral da República a pedir investigação sobre o governador não nos foi entregue ainda. Nós, exatamente, queremos a documentação que está na Procuradoria-Geral da República para que, a partir da análise desses documentos, nós tenhamos a ciência que, eventualmente, teve o procurador-geral. A partir da entrega desses documentos, nós vamos formar a nossa opinião sobre os fatos. E a partir dessa nossa opinião, tomar medidas.


Folha/UOL: No caso de Agnelo Queiroz, já está sendo investigado. Seria bom, talvez, que a Procuradoria-Geral, autorizada pela Justiça, também abrisse investigações formais a respeito de Marconi Perillo e Sérgio Cabral para suprir a CPI com informações objetivas?
Odair Cunha
: O que eu espero nesse caso é que o procurador-geral da República encaminhe logo a documentação que o motivou a pedir investigação sobre o governador Agnelo. E em segundo momento, nós teremos condições de analisar a conveniência dessa convocação sobre o governador Agnelo e sobre outros governadores. Não dá para nós simplesmente não termos acesso à documentação e nos posicionarmos. Eu acredito que o procurador-geral da República fará chegar às nossas mãos logo essa documentação.


Folha/UOL: Foi requerido.
Odair Cunha
: Exatamente. Como requeremos ao Supremo Tribunal Federal, o ministro Lewandowski (Ricardo Lewandowski), prontamente nos atendeu e encaminhou a documentação.


Folha/UOL: O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, foi contatado pela CPI sobre a possibilidade de ele estar lá presente fazendo um depoimento. Ele disse não neste primeiro momento. É vital que ele, em algum momento, vá até a CPI?
Odair Cunha
: Você disse bem. Neste primeiro momento, ele disse não. Mas também nos disse que a porta não está totalmente fechada. É exatamente por isso que nós ainda podemos contar com a presença dele na CPI.

Folha/UOL: É essa a sua expectativa?
Odair Cunha
: Pode ser que, mais adiante, depois que nós analisarmos toda a documentação a que teremos acesso, seja necessário que ele esteja presente. Mas, evidentemente, nós acreditamos no bom senso e no diálogo entre as partes.

Folha/UOL: Mas e se ele se recusar?
Odair Cunha
: O plenário da comissão vai ter que decidir...


Folha/UOL: Se o convoca de maneira compulsória?
Odair Cunha
: Esse é um tema que está colocado e que a CPI, no momento adequado, vai ter que fazer a análise [sobre] se é necessário ou não. Neste momento, nós simplesmente fizemos uma visita de cortesia ao procurador-geral e expusemos a ele a oportunidade de ele ir à CPMI. Ele, num primeiro momento, disse que não era o caso. Todavia, contudo, entretanto, se disponibilizou a manter o diálogo aberto.


Folha/UOL: Tem uma sensação entre alguns congressistas de que o procurador Roberto Gurgel demorou mais do que deveria para agir nesse caso, sobretudo em relação ao senador Demóstenes Torres. O sr. compartilha desta impressão?
Odair Cunha
: Eu terei condição de responder a isso só depois que eu identificar, olhar e analisar os autos dos inquéritos.


Folha/UOL: Mas por que tanta gente tem essa impressão lá dentro do Congresso?
Odair Cunha
: As pessoas falam muito, discutem muito, dão opinião sobre tudo. Como relator eu tenho que dar opinião a partir da realidade material. E essa realidade material desses documentos, desses inquéritos, que estão na Polícia Federal, na PGR, no Supremo Tribunal Federal, não estão todos comigo ainda. Exatamente por isso eu vou me guardar para dizer [algo a respeito] num momento adequado.

Folha/UOL: No início do processo da CPI, alguns companheiros do seu partido, o Partido dos Trabalhadores, sobretudo o presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, Rui Falcão, disse que a CPI era muito importante para desmontar a farsa do mensalão. O sr. é do PT, ele é presidente do seu partido. O que ele quis dizer com isso?
Odair Cunha
: Primeiro que a CPMI [do Cachoeira] não investiga o mensalão. Aliás, nós já tivemos duas CPMIs que trataram desse assunto. Nós queremos é investigar a organização criminosa que foi criada pelo Carlos Cachoeira. Suas relações com o mundo empresarial, suas relações com Estados, com o Ministério Público, com polícias. Esse é o objeto da nossa investigação. Com membros do Poder Legislativo. Aliás, de todos os entes da federação. Então, não tem nada a ver uma coisa com a outra.


Folha/UOL: Por que será que Rui Falcão disse isso então? O sr. falou com ele?
Odair Cunha
: Não conversei com o presidente Rui Falcão sobre esse tema. Esse é um assunto que ele deve responder por si só. O que eu posso dizer é que nós constituímos essa CPMI com apoio de partidos da base e da oposição. Se fosse esse o objetivo, penso que a oposição não ia querer a instalação dessa CPMI.


Folha/UOL: Não tem nada a ver a CPI do Cachoeira com o mensalão então?
Odair Cunha
: De forma nenhuma. São temas totalmente distintos, com objetivos diferentes, com focos diferentes e é isso que nós estamos fazendo.


Folha/UOL: A apuração do caso Cachoeira não vai ajudar a embolar o meio de campo, como se diz, no julgamento do mensalão?
Odair Cunha
: Os membros do Supremo Tribunal Federal não vão se deixar, eu diria, comover por qualquer questão que nós venhamos a desvendar, descobrir na CPMI do Cachoeira.


Folha/UOL: Não há vasos comunicantes?
Odair Cunha
: Nenhum. São temas distintos, circunstâncias distintas, procedimentos distintos. O julgamento do Supremo já se estende por anos. Essa CPMI está simplesmente começando.


Folha/UOL: Vários congressistas foram citados nesse escândalo do Cachoeira. Mas apenas um deles, Demóstenes Torres [senador de Goiás, ex-DEM], está convocado formalmente para depor. Os outros deputados citados, há quatro deputados mais evidentemente mencionados, não foram ainda convocados. O sr. imagina que seja o caso de convocá-los?
Odair Cunha
: Ficando evidenciado um envolvimento desses parlamentares, com certeza.

Folha/UOL: A CPI vai analisar o caso, revelado recentemente, de que o senador Aécio Neves, de Minas Gerais, trabalhou para ajudar a indicação de uma pessoa que é prima de Carlos Cachoeira para um emprego público em Minas Gerais?
Odair Cunha
: Não me parece que isso signifique envolvimento, cooptação, corrupção por parte da organização criminosa contra o senador Aécio Neves. Se isso ficar evidenciado, que houve uma participação na organização criminosa, também deverá ser investigado. A princípio, parece-me que não. Mas nós precisamos analisar sempre.


Folha/UOL: Agora, um caso curioso. O senado Fernando Collor [do PTB-AL], que é integrante titular da CPMI do Cachoeira, tem recorrentemente falado que vai trabalhar para evitar vazamentos e que a CPI deve manter o sigilo absoluto dos dados que vierem de outros órgãos públicos. Não obstante, a imensa maioria dos autos do processo que a CPMI vai receber já foram colocados na internet. Como tratar esse tema?
Odair Cunha
: Primeiro, é preciso saber se o que está na internet é realmente a autenticidade dos autos.


Folha/UOL: Vamos dizer que seja... vamos dizer que seja, o que parece que é.
Odair Cunha
: E se for, precisamos ver se são todos os autos.


Folha/UOL: E se forem todos os autos?
Odair Cunha
: Aí, o sigilo já foi quebrado. Aí não há mais sigilo a ser guardado. Agora, é claro, é preciso se fazer essa conferência.

Folha/UOL: Por que o senador Fernando Collor insiste tanto nesse tema?
Odair Cunha
: Desconheço. Não posso falar pelo senador Fernando Collor.

Folha/UOL:O sr. tem essa preocupação também? Que os dados que cheguem à CPI sejam protegidos por sigilo? Ou o sr. acha que seria o caso, ainda que eles venham protegidos por sigilo, requerer às fontes oficiais que forneceram os dados a autorização para divulga-los?
Odair Cunha
: O sigilo faz parte do processo de defesa dos acusados. É um direito constitucional. Tem a ver com o Estado de Direito. O Estado democrático. O sigilo é necessário. Agora, ficando constatado que houve a quebra de sigilo, sigilo não há que ser guardado mais, porque já houve o crime. Agora, nós precisamos fazer a conferência desses autos.


Folha/UOL: Agora, vamos analisar um outro aspecto. Digamos que novos documentos sejam requeridos, quebras de sigilo telefônico, bancário, sejam requeridos pela CPI. Como foram no caso de Carlos Cachoeira, desde 2002, se não estou enganado. Não é? Foi requerida a quebra de sigilo por uma década. Ao receber esses dados a CPI deve mantê-los ali para sempre em sigilo ou deve compartilhar? Até porque são 32 integrantes, a chance de 32 integrantes da CPI manterem o sigilo é muito difícil. Não é melhor nesse caso então compartilhar com toda a sociedade?
Odair Cunha
: Eu parto do princípio que os 32 integrantes são pessoas conscientes do seu dever constitucional, que é investigar. O sigilo dessas pessoas que nós viermos a quebrar, deve ser respeitado como nós respeitamos o sigilo telefônico e bancário de qualquer cidadão brasileiro. Na verdade, não é uma quebra de sigilo. É uma transferência de sigilo. Nós investigamos a partir dessas dados sigilosos. Não nos é dada a autorização de torná-los públicos.


Folha/UOL: Agora, e ao final da CPI? Os dados ficariam disponíveis quando a investigação tiver conclusa?
Odair Cunha
: No nosso relatório, os dados que servirem à conclusão do nosso relatório, serão públicos.


Folha/UOL: Setores do PT e de alguns outros partidos defendem que um dos capítulos da CPMI do Cachoeira seja investigar possíveis relações impróprias, alguns dizem ilegais, entre órgãos da mídia e pessoas do esquema Cachoeira. Qual é a sua avaliação sobre isso?
Odair Cunha
: Se houve cooptação e corrupção de alguns atores da mídia, isso deve ser investigado pela CPMI. Não há tema proibido. Nós não vamos generalizar nenhum tipo de investigação, mas é preciso individualizar condutas. Quer seja entre alguns membros da imprensa, membros do empresariado brasileiro, membros do Congresso Nacional, agentes de governos municipais e estaduais e agentes do governo federal. Essas condutas que, individualizadas, serviram à organização criminosa têm que ser investigadas por nós.


Folha/UOL: No caso da mídia, sr. tomou conhecimento de algum caso que tenha chamado a sua atenção?
Odair Cunha
: Não. Vou analisar os autos dos dois inquéritos da Polícia Federal para me posicionar com segurança sobre a participação de qualquer pessoa, não só da mídia.

Folha/UOL: O sr. sente uma pressão por parte de alguns setores dentro do Congresso para que esse seja um dos aspectos importantes dentro da CPI?
Odair Cunha
: Eu diria que pressões são naturais do processo democrático. Nós estamos...

Folha/UOL: Mas elas existem?
Odair Cunha
: Nós estamos numa Casa política. Há pressões no sentido de se investigar aquilo ou de não se investigar aquilo. Tudo isso depende dos interesses que estão colocados. É uma Casa política.


Folha/UOL: Nesse caso específico da mídia que foi falado em público por vários congressistas. O sr. recebeu algum pedido em particular?
Odair Cunha
: Nada além do que já foi falado em público.

Folha/UOL: Este é um ano eleitoral. Há eleição em todas as cidades brasileiras. É um ano em que também, agora, começa a CPI do Cachoeira. Os trabalhos do Congresso terão um ritmo muito reduzido por conta desses dois eventos, eleição e CPI?
Odair Cunha
: Em todo período eleitoral, o foco da política brasileira fica no processo eleitoral. Quando nós assumimos a responsabilidade de participar dessa CPMI, sabíamos disso. Nós vamos nos dedicar e nenhum ato de investigação será prejudicado em razão do período eleitoral. Repito isso: até porque a investigação não se dá só com audiências, oitivas. Dá-se com análise de documentos, de provas. E é isso que nós faremos o tempo inteiro.


Folha/UOL: O governo tem uma agenda própria, o país continua a andar. A presidente da República tem, nos últimos dias, falado muito sobre redução de juros para o consumidor final, no sistema financeiro privado. Está para anunciar algumas mudanças na caderneta de poupança. O sr. acha que esse ambiente externo também do governo se comunica com o Congresso e com os trabalhos da CPI? Haverá alguma contaminação de parte a parte?
Odair Cunha
: Nós temos que garantir que o Congresso Nacional continue trabalhando. O Senado Federal continue votando. A Câmara dos Deputados continue votando. E o Executivo tem a sua agenda própria. Não há... Nós não podemos parar o país em razão de um processo de investigação. Precisamos cumprir nosso papel na CPMI e cada qual no seu espaço deve cumprir a sua tarefa. Por isso eu defendo que a agenda legislativa deve continuar a todo vapor. Isso não se comunica com o governo.


Folha/UOL: Seu partido, o Partido dos Trabalhadores, um dos principais do Poder Legislativo, tem alguns grupos internos. E não é segredo que um dos grupos na Câmara dos Deputados têm sido vitorioso em muitos embates ali dentro da Câmara. O sr. pertence a esse grupo, do qual também faz parte Alindo Chinaglia [do PT-SP, líder do governo na Câmara], o presidente [da Câmara] Marco Maia [do PT-RS], Jilmar Tatto [do PT-SP] que é o líder atual [do PT na Câmara], Paulo Teixeira [do PT-SP], que foi líder. Como está o clima dentro do PT atualmente entre os senhores?
Odair Cunha
: O clima é o clima de convencimento, de diálogo, de interação. Todos esses processos de debate interno na bancada são naturais. O centro da questão é que nós estamos unidos na nossa ação no sentido de fazer com que, no caso por exemplo da CPMI, aconteça a investigação que tem que acontecer. É bom lembrar que tanto o deputado Vaccarezza [do PT-SP], como o deputado Paulo Teixeira [do PT-SP], como o deputado Luiz Sérgio [do PT-RJ], como o deputado Dr. Rosinha [do PT-PR], todos nós estamos na CPMI e com o objetivo de trabalhar de maneira integrada.


Folha/UOL: Politicamente, o sr. está se posicionando, está feliz com a possível aliança do PT com o PSDB em torno da reeleição de Márcio Lacerda para prefeito de Belo Horizonte, ele que é do PSB?
Odair Cunha
: Estou feliz com a aliança com o PSB. O PSB é um partido estratégico na aliança do governo da presidenta Dilma...


Folha/UOL: Mas o PSDB está junto.
Odair Cunha
: Nós não podemos, eu diria, criar empecilhos para que o PSB convide para sua casa essa ou aquela pessoa. Na casa do PSB, ele escolhe as pessoas que ele convida para vir ao jantar. Infelizmente, ele está convidando o PSDB.


Folha/UOL: Atrapalha?
Odair Cunha
: É um erro histórico que foi cometido de maneira circunscrita ao PT em Belo Horizonte. E neste momento da história não é possível nós criarmos uma agenda que não seja a agenda que viabilize a reeleição do prefeito Márcio Lacerda.

Folha/UOL: O sr. está no seu terceiro mandato de deputado federal. Pretende disputar outros mandatos de deputado federal ou pensa em outros cargos?
Odair Cunha
: Eu diria que isso a gente precisa analisar a seu tempo. O tempo no momento é cuidar dessa CPMI, cuidar do meu mandato de deputado federal e, quando nós estivermos no momento adequado, vamos fazer essa análise.

Folha/UOL: O sr. gosta de ser deputado?
Odair Cunha
: Gosto. E eu acredito... Nós cumprimos um papel. Quando eu decidi ser candidato a deputado federal, eu olhei para a realidade da minha vida e eu percebi: eu contribuo com o parlamento? Eu contribuo com a sociedade mineira, com o Brasil? Se eu contribuo, eu posso me candidatar mais uma vez. E compreendi que eu ainda tinha uma contribuição a dar.


Folha/UOL: A presidente Dilma Rousseff vai ser candidata à reeleição em 2014?
Odair Cunha
: Tem todas as condições de ser.


Folha/UOL: Parece que a população ainda, quando indagada, se deve ser Dilma ou Lula, diz preferir Lula. A última pesquisa Datafolha foi assim. Por quê?
Odair Cunha
: Essa é uma situação boa para o Partido dos Trabalhadores. Nós temos dois grandes nomes com possibilidade de continuar governando o país. É porque a população brasileira aprova o trabalho que o Partido dos Trabalhadores, com o presidente Lula e, agora, com a presidenta Dilma... Tem dado certo esse trabalho.


Folha/UOL: O sr. acha que ao longo dos próximos dois anos tende a se inverter essa tendência? De as pessoas que dizem preferir Lula como candidato e não Dilma, ou não?
Odair Cunha
: É uma questão que está para ser analisada ainda.


Folha/UOL: A presidente Dilma falou com o sr. depois, enfim, que houve a sua indicação para ser relator da CPI? O sr. conversa com ela de vez em quando?
Odair Cunha
: Nem antes, nem depois da indicação.


Folha/UOL: O sr. tem contato com ela por algum motivo? Alguma coisa que o sr. faça na Câmara?
Odair Cunha
: Eu tive a oportunidade...


Folha/UOL: Relatou a DRU [Desvinculação de Receitas da União, em 2011], né?
Odair Cunha
: Eu tive a oportunidade de ser vice-líder do governo da presidenta Dilma [na Câmara], o que muito me orgulhou. Cumprimos um papel. Eu diria que foi importante para o governo, para o meu mandato, para o parlamento. Essa fase foi concluída. Agora o meu foco é a CPMI e produzir essa investigação.


Folha/UOL: Deputado Odair Cunha, relator da CPMI do Cachoeira, muito obrigado por sua entrevista à Folha e ao UOL.
Odair Cunha
: Obrigado, Fernando.