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Advogado de Marcos Valério afirma que pedirá absolvição por falta de provas; "o mensalão não existiu", alega

Imagem de dezembro do ano passado mostra Marcos Valério sendo preso após uma operação sobre grilagem de terras - Charles Silva Duarte/O Tempo/Ag. O Globo
Imagem de dezembro do ano passado mostra Marcos Valério sendo preso após uma operação sobre grilagem de terras Imagem: Charles Silva Duarte/O Tempo/Ag. O Globo

Rayder Bragon

Do UOL, em Belo Horizonte

31/07/2012 06h01

O advogado do empresário Marcos Valério vai defender durante o julgamento do mensalão, que começa nesta quinta-feira (2) no Supremo Tribunal Federal (STF), que não há provas contra seu cliente e que o suposto esquema de compra de apoio político durante o primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva não existiu.

Valério é apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como operador do mensalão e será julgado ao lado de outros 37 réus sete anos depois da primeira acusação sobre o esquema.

O empresário é acusado pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, lavagem ou ocultação de dinheiro, evasão de divisas e peculato. Valério era sócio nas agências de publicidade DNA Propaganda e SMP&B Comunicação, que tinham contas do governo federal. Segundo a Procuradoria, ele criou um esquema que financiou o PT e partidos aliados por meio de recursos desviados, obtidos em contratos firmados com o Banco do Brasil e a Câmara dos Deputados. Empréstimos fraudulentos dos bancos Rural e BMG teriam disfarçado a origem do dinheiro.

O advogado Marcelo Leonardo afirmou, em entrevista ao UOL, que sustentará no julgamento a tese de que os empréstimos feitos pelas empresas existiram e foram realizados para saldar dívidas de campanha eleitoral de partidos da base aliada. Os repasses, ainda segundo o defensor, foram sempre indicados por Delúbio Soares, ex-tesoureiro nacional do PT – que foi expulso do partido após o escândalo.

Outra argumentação a ser usada por Leonardo é a de que não houve uso de dinheiro público nos pagamentos. O advogado também alegará que somente as provas colhidas em juízo seriam válidas contra Valério. As conclusões da CPI que investigou o suposto esquema e as da Polícia Federal não poderiam ser usadas contra seu cliente. O advogado vai pedir a absolvição por falta de provas.

Procurado pela reportagem, Valério não quis dar entrevistas. Segundo seu advogado, o empresário abandonou a área de publicidade após o fechamento de suas duas agências (SMP&B e DNA) e trabalha com consultoria empresarial e de negócios em Belo Horizonte.

Valério vive atualmente com a família –um casal de filhos e a mulher– em uma casa na região da Pampulha, na capital mineira. Depois do escândalo, a vida social da família praticamente deixou de existir.

Veja abaixo a entrevista com Marcelo Leonardo, concedida por e-mail: 

UOL: Qual será a estratégia da defesa de Marcos Valério no julgamento?
Marcelo Leonardo
: Sustentar, oralmente, no prazo legal, as alegações finais escritas apresentadas em setembro de 2011. Marcos Valério apenas atendeu aos pedidos de Delúbio Soares, então tesoureiro nacional do PT, tendo emprestado recursos ao PT, repassando-os aos partidos da base aliada para saldar despesas das campanhas eleitorais de 2002 e 2004, conforme as indicações de Delúbio.

UOL: O mensalão existiu?
Leonardo: O mensalão tal como narrado na denúncia do procurador-geral da República ["repasse de recursos a partidos políticos da base aliada para que seus parlamentares votassem a favor do governo em projetos no Congresso Nacional”] não existiu, segundo ficou provado, no curso da instrução na ação penal, através do depoimento de centenas de testemunhas. A versão de Roberto Jefferson [então deputado federal, que denunciou o esquema para o jornal “Folha de S.Paulo] não restou provada no processo, sendo o seu depoimento isolado.

UOL: O senhor acredita que o julgamento será adiado? Pretende tomar alguma atitude para que isso ocorra?
Leonardo
: Não. Não. Vou apenas, por coerência, sustentar que o STF é incompetente, segundo a Constituição, para julgar cidadão comum, que não tem foro por prerrogativa de função [como é o caso de Marcos Valério].

UOL: O senhor acha que o seu cliente será inocentado? Por quê?
Leonardo
: Vou requerer a sua absolvição, uma vez que o Ministério Público não fez prova, em juízo, com a participação da acusação e da defesa, dos fatos de que acusou Marcos Valério.

UOL: O julgamento no Supremo poderá ser contaminado pelo clamor popular? Qual a expectativa do senhor em relação a condução do julgamento pelos ministros?
Leonardo
: Não. Tenho confiança que os ministros, fiéis à tradição histórica do STF, farão julgamento justo, baseado na prova produzida nos autos durante a fase de instrução criminal contraditória, de forma técnico-jurídica.

UOL: O cliente do senhor enfrenta outros processos na Justiça [leia mais abaixo]. O julgamento do mensalão poderá influir nesses outros processos?
Leonardo
: Não.

UOL: O que aconteceu com a carreira de Marcos Valério após ter o nome envolvido no escândalo?
Leonardo
: As duas agências de propaganda (SMP&B e DNA) de que era sócio Marcos Valério, em razão do escândalo e da publicidade opressiva consequente, tiveram de encerrar suas atividades, pois foram atingidas em sua credibilidade no mercado. 

UOL: Atualmente, Marcos Valério trabalha em qual área?
Leonardo
: Marcos Valério continuou a trabalhar em seu escritório de consultoria empresarial e de negócios, abandonando a área de publicidade.

Preocupação com os filhos

Em resposta ao jornal “Folha de S.Paulo”, Valério afirmou ter preocupação com os filhos e disse estar ansioso pelo início do julgamento.

"Estou ansioso, como todo ser humano ficaria numa situação dessa. É um momento muito difícil, pois não sei o que poderia advir do julgamento", disse. "Estou extremamente preocupado com meus filhos, com a minha família, mas tenho confiança na Justiça.”

Além do julgamento no STF, Valério tem contra si oito ações na Justiça de Minas Gerais.

Ele já foi condenado em duas decisões da Justiça Federal –as penas somadas chegam a 15 anos e dez meses de prisão. A maior (9 anos e oito meses) foi aplicada em fevereiro deste ano por sonegação de R$ 90 milhões e falsificação de documentos. Junto com ele, os ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach foram apenados com 9 anos e um mês de prisão cada um.

Em setembro de 2011, Valério havia sido condenado a seis anos e dois meses de prisão sob acusação de ter efetuado, juntamente com Paz, alteração contratual da SMP&B, possibilitando esconder condições de um empréstimo R$ 7 milhões do Banco Rural. Segundo a decisão, a fraude permitiu camuflar irregularidades do banco. Paz foi condenado a quatro anos e oito meses.

Assim como na primeira condenação, a Justiça permitiu que Valério recorresse da sentença em liberdade.

À Folha, o advogado de Valério disse que espera reverter as condenações com recursos e diz que seu cliente é perseguido pelo Ministério Publico e pela Receita Federal em razão do mensalão.