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"PT não podia usar bancos porque o dinheiro era ilícito mesmo", afirma advogado de Delúbio

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

06/08/2012 16h21Atualizada em 06/08/2012 22h30

O advogado Arnaldo Malheiros Filho, que representa o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, um dos réus no julgamento do mensalão, admitiu que o PT fez "caixa dois" durante a campanha eleitoral de 2002. O defensor, no entanto, diz que os recursos auferidos ilegalmente pela legenda não serviram para comprar parlamentares, negando, dessa maneira, a existência do mensalão. 

"O PT não podia fazer transferência bancária porque o dinheiro era ilícito mesmo", afirmou. "Delúbio não se furta a responder ao que é responsável. Ele operou caixa dois? Operou. É ilícito? É. Ele não nega. Mas ele não corrompeu ninguém", disse o defensor durante sustentação apresentada no STF (Supremo Tribunal Federal) nesta segunda-feira (6). 

Malheiros Filho desqualificou as provas apresentadas pela Procuradoria Geral da República contra o seu cliente e que, segundo a acusação, provam a existência do esquema. "A prova é pífia, é esgarçada, é rala”, disse, 

Segundo ele, durante a campanha eleitoral de 2002, os partidos da coligação que elegeu Lula se reuniram para estabelecer como seria a divisão dos recursos da campanha.

Posteriormente, diz Malheiros Filho, Delúbio foi incumbido de captar recursos para saldar as dívidas provenientes da disputa eleitoral. “O diretório nacional do PT deliberou que iria arcar com as despesas da base aliada”, disse.

O advogado negou que o ex-tesoureiro do PT tenha buscado recursos de maneira ilegal para comprar parlamentares. “O governo conquista sua base com a partilha do poder, não é com dinheiro.”

"Ele operou o caixa dois", confirma advogado de Delúbio

Defesa de Genoino

No terceiro dia do julgamento do mensalão, Luiz Fernando Pacheco, advogado do ex-presidente do PT, José Genoino, afirmou que, para a opinião pública, o mensalão foi uma farsa. “A opinião pública, há muito, se convenceu que o mensalão foi uma farsa”, disse.

Ao longo de sua sustentação, Pacheco procurou convencer os ministros de que Genoino não tratava de questões financeiras no interior do PT e era responsável pela articulação política com outros partidos. “José Genoino não tem qualquer aptidão no tratamento com finanças, mas, por ter anos no Congresso, é expert na articulação política”, disse.

Para tentar comprovar sua tese, o defensor citou depoimentos de petistas, como José Eduardo Cardozo, Maurício Rands e Angelo Vanhoni, que, segundo Pacheco, confirmam a inabilidade de Genoino no trato com as finanças.

Pacheco afirmou que os contratos avalizados por Genoino foram legítimos. "Os dois contratos em que Genoino foi avalista foram negociados e firmados com o conhecimento de toda a diretoria do PT. São absolutamente legítimos, não são falsos como disse o procurador-geral da República”, disse. "Foram firmados em 2003 quando o Congresso Nacional quando não estava votando nada de importante. Portanto, não têm nada a ver com o fantasioso e inventado mensalão", afirmou o advogado.

Sobre a acusação relativa ao PP, em que os parlamentares Pedro Correa, Pedro Henry e José Janene teriam recebido dinheiro em troca de apoio ao governo, o advogado de Genoino declarou: "a acusação não disse quem teria dado dinheiro a quem, quando, onde, como, por que, em que circunstâncias, absolutamente nada".

Aparentando nervosismo, o advogado trocou, por uma vez. o nome do seu cliente, chamando-o de “Jesuíno”. No início de sua sustentação, Pacheco lembrou o passado militante de Genoino, que integrou a luta armada contra a ditadura militar e ajudou a construir o PT. Ele também citou afirmações de amigos de Genoino que, segundo o defensor, engrandecem o caráter do ex-deputado.

Veja quem são os acusados

Defesa de Dirceu

Antes da exposição de Pacheco, o advogado do ex-ministro José Dirceu, José Luís de Oliveira Lima, afirmou que seu cliente não chefiou o mensalão, tese defendida pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. O advogado falou pouco menos de uma hora e pediu a absolvição de seu cliente por falta de provas.  

“José Dirceu não é chefe de quadrilha, não”, disse. “Não há nos autos do processo nenhum depoimento, nenhuma testemunha, que faça essa afirmação, de que José Dirceu, na [chefia da] Casa Civil, tenha beneficiado qualquer instituição financeira”, afirmou Lima.

O advogado disse que o ex-deputado Roberto Jefferson, delator do suposto esquema de compra de votos, “conseguiu fazer um bom teatro”, ao acusar Dirceu de ter sido o mentor do esquema. “Roberto Jefferson é um homem eloquente, um belo orador, que conseguiu fazer um bom teatro. E por que fez um bom teatro? Todas as acusações que ele fez contra meu cliente, a prova destruiu”, disse.

Lima citou depoimentos de Jefferson sobre uma viagem de Dirceu a Portugal para se encontrar com executivos da Portugal Telecom. “O presidente da Portugal Telecom desmentiu taxativamente."

O advogado cita ainda acusação de Jefferson sobre o deputado federal Miro Teixeira, que, segundo o petebista, teria confirmado a existência do mensalão. "A primeira pessoa que teria falado sobre o mensalão teria sido o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ). Mas o que disse Miro Teixeira? 'Mente o Roberto Jefferson'", afirmou o defensor.

Provas "desprezadas"

De acordo com o advogado de Dirceu, o Ministério Público Federal (MPF) desprezou provas produzidas durante o contraditório. “Foram mais de 600 depoimentos e nenhum deles incrimina José Dirceu”. E diz que a procuradoria-geral da República se apoiou em “provas extrajudiciais, em depoimentos tumultuados e em análises publicadas na imprensa”.

O argumento do MP para demonstrar que Dirceu seria chefe de organização criminosa é que ele teria comando sobre o Partido dos Trabalhadores e sobre o operador do mensalão, Marcos Valério.

"É lógico que foi um homem importante. Mas quando assumiu a chefia da Casa Civil, ele deixou de participar da vida do partido. E quem fala isso são as testemunhas. Foram dezenas de depoimentos nesse sentido", diz o defensor.

“O MPF apresenta frase de efeitos, que a condenação vai servir de exemplo. A defesa de José Dirceu, ao contrário, será escrava da Constituição Federal”, afirmou o defensor. Lima negou ainda a existência da “propalada compra de votos” --que batizou o escândalo de mensalão. “Não existe prova dessa acusação nos autos.”

Pouco antes de começar a sessão de hoje, o advogado de Dirceu afirmou que o pedido do procurador-geral, Roberto Gurgel, pela condenação do ex-ministro é uma afronta à Constituição. "Pedir a condenação [de José Dirceu] é a mais atrevida e escandalosa afronta à Constituição."

O advogado refere-se a uma declaração de Gurgel, na última sexta-feira (3), sobre o mensalão ter sido "o mais atrevido e escandaloso caso de corrupção do Brasil."  

Análise

Os primeiros três advogados tentaram desqualificar a acusação, alegando que não há provas contra os réus apontados como integrantes do núcleo político do suposto esquema.

“Esta está sendo a tônica do dia de hoje: a defesa apontar elementos da prova testemunhal para contrariar a acusação, mais genérica e calcada em interpretações”, avalia o advogado criminalista Antonio Ruiz Filho. “A defesa de José Dirceu pretendeu contrapor às acusações elementos da prova dos autos, colhidos no curso do processo. Alegou que as testemunhas ouvidas durante a instrução processual desmentiram o mensalão e todas as acusações imputadas ao então ministro da Casa Civil. Os ministros do STF terão de analisar a prova e dela retirar suas próprias conclusões.”

Para o também advogado criminalista Sergei Cobra Arbex, que acompanha o julgamento na redação do UOL, “o que a lei estabelece é que os ministros não podem formar a sua convicção exclusivamente nas provas colhidas na investigação, mas pela apreciação da prova produzida também em contraditório judicial [quando ocorre, obrigatoriamente, a presença de um defensor]”.

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta. 

Dia a dia do julgamento

Infográfico

  • Arte/UOL

    Relembre o escândaldo do mensalão, veja quem são os acusados, como era o esquema e quais são as possíveis penas

O julgamento do mensalão está dividido em duas fases. A primeira começou na última quinta-feira (2), quando o relator do processo, o ministro Joaquim Barbosa, leu uma síntese do seu relatório, com os argumentos dos 38 réus e da acusação, a Procuradoria-Geral da República. Em seguida, na sexta-feira (3), o procurador-geral, Roberto Gurgel, fez a sua manifestação e apresentou provas da existência do esquema.

Nos dias seguintes, os advogados dos 38 réus terão uma hora cada um para fazer a apresentação da defesa. A previsão é que a primeira fase aconteça nos dias 2, 3, 6, 7, 8, 9,10, 13 e 14 de agosto. Com duração de cinco horas, as sessões começarão sempre às 14h.

A última fase será destinada à leitura do voto de cada um dos 11 ministros do STF, que irão revelar se absolvem ou condenam os réus. Nesta etapa, as sessões devem ocorrer nos dias 15, 16, 20, 23, 27 e 30 de agosto, a partir das 14h, mas sem horário para terminar.

O primeiro a votar será o relator, seguido do revisor do processo, o ministro Ricardo Lewandowski. A partir daí, a votação segue por ordem inversa de antiguidade, da ministra Rosa Weber, a mais nova na Corte, até o ministro decano, Celso de Mello. O último a votar será o presidente do STF, ministro Ayres Britto.

Se o julgamento precisar se estender até setembro, as datas das novas sessões deverão ser publicadas no Diário da Justiça. 

Entenda o dia a dia do julgamento