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Defesa diz que réu recebeu R$ 150 mil do PT para saldar dívidas de campanha: "ele foi ameaçado de morte"

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

13/08/2012 15h07Atualizada em 13/08/2012 17h00

O advogado Bruno Alves Braga, que defende o ex-deputado federal Carlos Alberto Rodrigues, o Bispo Rodrigues (ex-PL), no julgamento do mensalão, afirmou que seu cliente recebeu R$ 150 mil do PT para saldar dívidas da campanha eleitoral de 2002. Ele negou que o parlamentar tenha sido comprado pelo PT para apoiar o governo federal, prática que gerou o nome de mensalão.

“Ele jamais negou recebimento de dinheiro”, disse. “Esse montante veio do PT com destinação absolutamente diferente da imaginada pela acusação. Ele recebeu R$ 150 mil para pagamento de dívida de campanha de 2002″, afirmou. Rodrigues renunciou ao mandato para escapar da cassação e deixou de ser bispo. 

Braga afirma que as pessoas que colaboraram com a campanha de Bispo Rodrigues receberam pagamento em espécie porque eram humildes e muitas nem conta bancária tinham.

"As pessoas demoraram mais de 1 ano para receber. Ele recebeu ameaça de morte", alegou a defesa de Rodrigues. Ainda segundo o advogado, o PL sempre votou com o PT, portanto, não haveria sentido receber dinheiro para votar a favor do governo na primeira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.

A defesa afirma que o Ministério Público não aponta nenhum ato de ofício que comprovaria as acusações de compra de apoio, portanto não há os crimes de lavagem de dinheiro e corrupção ativa, como aponta a denúncia. 

Na sequência, começou a ser ouvida a defesa de o delator do mensalão, Roberto Jefferson (PTB-RJ). Então presidente do PTB, foi ele quem revelou, em entrevista ao jornal "Folha de S. Paulo" no dia 6 de junho de 2005, o esquema de compra de votos no Congresso, chefiado pelo então ministro-chefe da Casa Civil do governo Lula, José Dirceu.

Depois de Jefferson, serão defendidos os petebistas Emerson Palmieri, Romeu Queiroz e o ex-deputado federal José Borba (PMDB), hoje prefeito da cidade paranaense de Jandaia do Sul.

Roberto Jefferson

Ao delatar o esquema, o parlamentar, tornou-se nacionalmente conhecido o publicitário Marcos Valério, que seria o operador dos recursos que seriam distribuídos aos partidos para garantir apoio ao governo petista em votações no Congresso Nacional.  Segundo Jefferson, ele próprio teria alertado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o fato.

Ainda em 2005, o envolvimento de Jefferson no caso resultou na cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar. Segundo a Procuradoria Geral da República, Jefferson teria sido beneficiado por esquema entre o Banco Rural e a empresa SMP&B e ainda recebido R$ 4, 5 milhões para votar a favor do governo federal. Ele responde pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

OUÇA TRECHO DA ENTREVISTA À FOLHA DE S.PAULO EM QUE ROBERTO JEFFERSON MENCIONOU A EXISTÊNCIA DO MENSALÃO PELA PRIMEIRA VEZ

PTB

Além de Jefferson, a defesa de outras duas pessoas ligadas ao PTB serão apresentadas: Emerson Palmieri e Romeu Queiroz.

Palmieri atuava como um tesoureiro informal do PTB, onde era oficialmente primeiro-secretário. A acusação contra ele é a de que intermediou os volumes de dinheiro entregues ao partido, presidido por Roberto Jefferson.  Por isso, é acusado dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Sua defesa deve seguir a linha de outros reús de que apenas seguia as ordens dos superiores, não teria se beneficiado nem participado das negociações entre os partidos.

Ex-integrante do PTB, Romeu Queiroz era deputado federal em 2005 e foi apontado como um dos beneficiários do mensalão. Na ocasião, o envolvimento dele no esquema o levou a ser julgado no Conselho de Ética da Câmara, que pediu sua cassação, mas foi absolvido em plenário e seu caso foi arquivado.  Queiroz chegou a assumir como deputado estadual, mas saiu. Atualmente, ele atua como empresário no ramo de agronegócio e automóveis e também como consultor jurídico e empresarial, segundo o seu advogado Ronaldo Dias.

Queiroz é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e, em sua defesa, espera-se que ele negue a venda de seu voto no Congresso em favor do governo. O parlamentar já admitiu ter recebido recursos, mas que os repassou para a sua antiga legenda, o PTB.

José Borba

A quinta sustentação oral da defesa a ser apresentada é a do ex-deputado federal pelo Paraná e atual prefeito de Jangaia do Sul (PR), José Borba (PMDB).

Depois de ter sido citado no escândalo do mensalão, Borba também renunciou ao mandato para evitar a perda de seus direitos políticos. Ele responde por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. De acordo com o Ministério Público, o parlamentar recebeu R$ 200 mil do valerioduto para votar a favor do governo.

Em 2005, quando o escândalo do mensalão veio à tona, Borba era líder do PMDB na Câmara dos Deputados e, em sua defesa, pode utilizar a mesma argumentação do também líder do PP, Pedro Henry, de que, apesar do cargo de liderança, não era responsável pelas questões financeiras da legenda. 

Até a sexta-feira (10), 25 dos 38 réus já haviam apresentado suas defesas ao STF.

Defesas de sexta-feira

O sétimo dia de julgamento do mensalão foi marcado por referências aos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello.

O advogado Délio Lins e Silva Júnior, que faz a defesa do ex-tesoureiro do Partido Liberal, Jacinto Lamas, disse que, se o Ministério Público Federal estendesse o mesmo critério que usou para denunciar seu cliente para outros citados nos depoimentos, deveria pedir a condenação do ex-presidente Lula. “Não vou dizer de maneira nenhuma que ele deveria estar nessa denúncia, mas questiono a ausência de critério do MP. Se entre as quatro paredes do Planalto eram feitas as tratativas, quem seria o maior beneficiário? Seria o chefe da nação, o chefe do palácio do governo, o presidente Lula”, disse.

"Por que é tão fácil acreditar no presidente Lula quando ele disse que nada sabia e é tão difícil acreditar em Jacinto?", afirmou.

Jacinto Lamas é acusado de organizar e intermediar o esquema de entrega de recursos do PT até o PL, a mando do deputado federal Valdemar Costa Neto, então presidente da sigla. Pesam sobre ele as acusações de crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele também é acusado de operar o contrato da empresa Guaranhuns com a agência SMP&B, do publicitário Marcos Valério, supostamente para esconder a origem do dinheiro.

O advogado Délio Lins e Silva, pai do defensor de Jacinto Lamas e advogado do réu Antonio Lamas, também questionou a participação do ex-presidente e cometeu uma gafe, ao incluir Antonio como o primeiro nome do ex-mandatário. "Por que o senhor Antonio Luiz Inácio Lula da Silva não foi denunciado? Nesse Brasil o cassetete só rola nas costas do humilde.”

Antonio Lamas era assessor da liderança do PL na Câmara dos Deputados e é acusado de sacar R$ 350 mil do esquema para o irmão, que era tesoureiro da legenda à época. Porém, a Procuradoria já pediu sua absolvição por falta de provas.

O julgamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello no STF, em 1994, no qual ele foi inocentado da acusação de corrupção passiva, foi usado como exemplo pelo advogado Marcelo Luiz Ávila de Bessa para livrar o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP) no julgamento do mensalão.

No julgamento de Collor, em 1994, o Supremo considerou que não houve provas que comprovassem a ocorrência do chamado “ato de ofício”, quando um servidor público muda a sua postura em determinado ato mediante recebimento de vantagem financeira --pressuposto do crime de corrupção ativa e qualificante de corrupção passiva. Collor foi inocentado no processo porque não foi comprovado que ele se beneficiou com o desvio de recursos. 

O defensor público federal Haman Córdova, que foi nomeado para a defesa do réu Carlos Alberto Quaglia, reforçou durante o julgamento o pedido feito anteriormente de nulidade absoluta da ação penal contra o acusado. O argumento de Córdova é que o réu teve o direito de defesa cerceado ao longo do processo por ter ficado sem advogado.

Quaglia trocou de advogado em 2006, quando Haroldo Rodrigues passou a defendê-lo no lugar de Dagoberto Dufau. Segundo a defensoria, o novo advogado não foi intimado para acompanhar o depoimento de testemunhas que incriminaram o réu. O defensor diz ainda que, por conta disso, o acusado não pode arrolar testemunhas a seu favor.

Antes de Quaglia, foi apresentada a defesa de Breno Fischberg, apontado pelo Ministério Público Federal como sócio junto com Enivaldo Quadrado na corretora Bônus Banval. Ele é acusado de lavar dinheiro de Valério e repassá-lo a integrantes do Partido Progressista. Fischberg responde pelos crimes formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. "Tecnicamente não há nos autos nada que se possa deduzir do que a inocência", afirma Nostre. Na nota de rodapé citada pelo advogado afirma-se que Fischberg e Quadrado seriam os interlocutores de Valério na Bônus Banval. "Não há recibos, telefonemas e menção a Breno em outros depoimentos.”

Entenda o dia a dia do julgamento

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo