Topo

Duda Mendonça e Zilmar "não são mensaleiros" e receberam dinheiro lícito, dizem advogados

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

15/08/2012 16h00Atualizada em 15/08/2012 21h25

O advogado Luciano Feldens, que defende os publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes no julgamento do mensalão, afirmou nesta quarta-feira (15) no STF (Supremo Tribunal Federal) que seus clientes "não são mensaleiros". Ele disse também que o dinheiro recebido por eles do PT tem origem lícita e foi fruto do pagamento pela campanha publicitária das eleições de 2002, que elegeu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A defesa dos publicitários foi dividida entre Feldens, que falou primeiro, e Antonio Carlos Castro, o Kakay, que falou em seguida.

"Todo dinheiro que receberam [Duda e Zilmar] tem origem lícita, e o próprio procurador [geral da República, Roberto Gurgel] reconheceu. Duda Mendonça e Zilmar Fernandes não são 'mensaleiros’”, disse o primeiro defensor.

Na CPI dos Correios, Mendonça assumiu que abriu conta no exterior para receber dinheiro

Duda é acusado de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Segundo a Procuradoria Geral da República, o publicitário teria criado a empresa Dusseldorf com registros no exterior para evitar a obrigatoriedade de declarar ao Banco Central qualquer depósito de sua titularidade. Nesta conta, teria recebido cerca de R$ 10 milhões do PT pela campanha que elegeu Lula.

A ex-sócia de Mendonça, Zilmar Fernandes Silveira, também é acusada de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Ela teria recebido três parcelas de R$ 300 mil e duas de R$ 250 mil, em espécie, em agências do Banco Rural por meio do resgate de cheques nominais à empresa SMP&B, de Marcos Valério –apontado como operador do mensalão–, sem registro dos reais beneficiários dos valores. Ela seria ainda responsável por movimentar a conta criada por Mendonça no exterior.

O advogado citou os slogans criados por Duda para Lula para a campanha, que, segundo Feldens, foi “longa, custosa e exitosa”. "O ano é 2001. Aproxima-se 2002, ano de eleições. O Partido dos Trabalhadores tinha um sonho: fazer o presidente da República. O candidato era Lula. Seria um longo caminho. Seria um pesado desafio. Por isso foram contratados os melhores publicitários do país, Duda Mendonça e Zilmar Fernandes.”

Segundo Feldens, Duda e Zilmar fizeram mais de 150 peças publicitárias na campanha e eram credores de R$ 11 milhões do PT. “Inadimplentes e preocupados, eles procuram Delúbio [Soares, ex-tesoureiro do partido]. Ele personificava a própria figura do devedor. Ele que assina as prestações de serviços para a empresa de Duda e Zilmar”, afirmou.

De acordo com Feldens, seus clientes estão no julgamento do mensalão apenas pela maneira como receberam o pagamento: parte veio do Banco Rural e a outra foi recebida em uma conta aberta do Bank Boston, em Miami (EUA), em nome de Duda Mendonça.

Feldens afirma que Zilmar fez cinco saques pessoalmente, o que contraria a acusação, que sustentou que os publicitários usaram intermediários para sacar os valores. “Em tom genérico, eu ouvi que os acusados, com a finalidade de evitar qualquer rastro da participação, mandavam terceiros para os saques. Isso não é verdade."


Segundo Feldens, também falta consistência na acusação de lavagem de dinheiro já que seus clientes tinham como comprovar a origem do dinheiro, que era a prestação de trabalho publicitário.

Sobre os saques feitos no Banco Rural, o advogado afirma que Zilmar Fernandes assinou três recibos: "Ela tinha crédito lícito para receber. Ela tem os recibos para os saques.”

O primeiro advogado questionou como a denúncia pode apontar que Zilmar poderia ocultar, em fevereiro de 2003, origens de valor de um contrato que seria assinado meses depois entre alguns bancos e as agências de Marcos Valério. “Como ela poderia, em fevereiro de 2003, ocultar valores de um contrato que ela assinaria em setembro de 2003 com o objetivo de desviar para Marcos Valério?”.

Feldens diz que a conta aberta por Duda em Miami, nomeada Dusseldorf, foi criada para que o publicitário pudesse receber o recursos lícitos pelo trabalho na campanha de 2002. “Ter conta no exterior não é crime”. Ele diz ainda que os valores recebidos pelo publicitário não foram ocultados. “Quero saber qual depósito não foi declarado. Quem desejando ocultar abre uma conta com todos os documentos?”, questionou.

De acordo com o advogado, a conta de Mendonça no exterior não tinha um valor acima de US$ 100 mil em 31 de dezembro de 2003 e, portanto, ele não precisaria declarar a conta ao Banco Central. Na data citada, diz o defensor, a conta tinha US$ 573. Isso, no entanto, não livrava Duda de declarar os valores à Receita Federal. "Duda errou e pagou. Essa dispensa do Banco Central não o livrava de declarar os valores que recebeu", disse Feldens. Segundo ele, posteriormente o publicitário pagou R$ 4 milhões em impostos.

O primeiro advogado citou o ex-presidente Lula, ao afirmar que a Procuradoria Geral da República adotou um “anticritério”, ao denunciar Zilmar e Duda e não incluir o ex-mandatário. "O que eu não entendo é o anticritério [da PGR sobre o Lula] É ilógico a Procuradoria dizer que a quadrilha foi formada no Palácio, e Lula não sabia, mas seus clientes sim”, afirmou Feldens. Kakay foi na mesma linha, negando a participação dos réus no mensalão: "Duda e Zilmar não estão inseridos em nenhuma das circunstâncias que descrevem o mensalão".

O segundo advogado de Duda  e Zilmar também criticou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Kakay respondeu a uma fala de Gurgel de que as defesas dos réus eram “ladainha”. “Não é ladainha!”, disse, enfático, comparando o trabalho de Gurgel –que, segundo ele, entra junto com os ministros e fala sentado, “como se estivesse em casa”– com o trabalho dos advogados no plenário, que têm que falar em pé. “Respeite a responsabilidade de quem tem que defender um cidadão”, completou.

José Luiz Alves

O advogado Roberto Pagliuso, que defendeu nesta quarta-feira (15), no julgamento do mensalão no STF (Supremo Tribunal Federal), o réu José Luiz Alves --assessor do ex-ministros dos Transportes Anderson Adauto (PL)-- afirmou que seu cliente apenas cumpriu ordens ao realizar saques para pagar dívidas de campanha.

Segundo a defesa, o réu era chefe de gabinete de Adauto, que solicitou a ele que fosse retirar recursos do PT do Banco Rural para saldar dívidas de campanha. "Ele não viu nada de estranho nesse pedido", afirmou o advogado. De acordo com Pagliuso, Alves, à época, “não tinha percepção de nada que pudesse induzir à prática de crime.”

José Luiz Alves é acusado de lavagem de dinheiro. Segundo a Procuradoria, ele teria recebido dinheiro em espécie, desviado de contratos publicitários, para pagamento de dívidas de diretórios regionais do PT e de outros partidos aliados. Ele teria ainda intermediado o pagamento de R$ 950 mil de Marcos Valério --apontado como operador do mensalão-- para Adauto –que é acusado de corrupção ativa sobre dois ex-deputados federais: Roberto Jefferson (PTB-RJ) e Romeu Queiroz (PTB-MG).

Segundo a defesa, Alves foi ao banco quatro vezes e fez saques de R$ 100 mil, R$ 50 mil e dois de R$ 25 mil, totalizando R$ 200 mil. De acordo com o advogado, a denúncia atribui 16 saques a Alves, mas, nas alegações finais, esse número foi mudado para seis. No entanto, a defesa de Alves reafirma que foram apenas os quatro mencionados.

Nova fase do julgamento

Como cada advogado teve o tempo máximo de apresentação de uma hora, os ministros darão continuidade à sessão de hoje com o início da leitura do voto do ministro-relator do caso, Joaquim Barbosa. 

A estimativa é a de que o voto de Barbosa, com mais de mil páginas, dure cerca de quatro dias. Nesta semana, haverá sessão também na quinta-feira (16). Depois, o julgamento será retomado apenas na próxima segunda-feira (20).

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Lula. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo

Entenda o dia a dia do julgamento