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Relator do mensalão condena dez réus da base aliada e mais dois acusados

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

20/09/2012 16h27Atualizada em 20/09/2012 18h26

O ministro-relator do mensalão, Joaquim Barbosa, votou nesta quinta-feira (20), no STF (Supremo Tribunal Federal), em Brasília, pela condenação de 12 réus em razão dos repasses ilegais feitos pelas empresas do publicitário Marcos Valério, a mando do PT (Partido dos Trabalhadores) aos partidos da base aliada no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006). Entre os réus, há sete que eram deputados na época e foram acusados de vender seu voto para apoiar o governo Lula. A maioria deles foi condenada por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Do PP (Partido Progressista), foram condenados o ex-deputado federal Pedro Corrêa, o deputado federal Pedro Henry (PP-MT) e João Cláudio Genú, assessor do partido na Câmara dos Deputados. Os três foram condenados por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

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Já entre os réus do PL (Partido Liberal, atual PR), Barbosa condenou o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP), o ex-deputado Carlos Alberto Rodrigues (Bispo Rodrigues) e Jacinto Lamas, ex-tesoureiro da sigla. Costa Neto e Lamas foram condenados por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Já Rodrigues foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), Barbosa condenou Roberto Jefferson, Romeu Queiroz --ambos ex-deputados federais-- e Emerson Palmieri, ex-tesoureiro da legenda. Jefferson e Queiroz foram condenados por corrupção passiva ee lavagem de dinheiro. 

O réu José Borba, ex-deputado federal do PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O magistrado também condenou Enivaldo Quadrado e Breno Fischberg, ambos ex-sócios da corretora Bônus-Banval, acusada de participar das operações para repassar os recursos do valerioduto para parlamentares. Ambos foram condenados por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

"A corrupção passiva se traduz no fato de um parlamentar receber estas quantias estonteantes de dinheiro com objetivo, que me parece claro que contido estão expostos nos autos, e a lavagem de dinheiro decorre de toda esta ‘mise-en-scéne’, esta engenharia posta em prática pelo [Banco] Rural e pelo pivô de todos estas [ações] que era o senhor Marcos Valério", afirmou Barbosa

"A lavagem de dinheiro funcionou como grande catalisador dos crimes de corrupção passiva", afirmou Barbosa. "[Assim,] os réus ficaram livre, livres para utilizarem como bem entendessem [os recursos recebidos] ao seu proveito ou a de seu partido", completou.

Em seu voto, Barbosa rechaçou as teses de várias defesas de que o dinheiro repassado aos partidos tinha como objetivo pagar despesas e dívidas de campanha não declaradas à Justiça Eleitoral --prática conhecida como caixa dois. "Teria que ser muito ingênuo para aceitar essa alegação."

"O que houve foi a compra de parlamentares para consolidar a base de apoio do governo", disse Barbosa. "A lealdade, de fato, é uma arma dos parlamentares."

Para sustentar a tese de que o dinheiro comprou o apoio de parlamentares na Congresso, Barbosa citou votações na Câmara dos Deputados, como as reformas da previdência e tributária, nas quais os deputados dos partidos votaram quase que integralmente com a base aliada. "Se os parlamentares divergissem das ordens do governo (...), deixariam de receber os milhares de reais em espécie que vinham sendo agraciados", afirmou.

Ao finalizar seu voto, Barbosa citou depoimento da presidente Dilma Rousseff, quando ocupava a chefia da Casa Civil, que, segundo ele, teria ficado "supresa" com a rapidez com que foi aprovado o novo marco energético, votado no Congresso na época do mensalão.

“Os parlamentares acusados utilizaram dos seus cargos para solicitar vantagem indevida aos réus ligados ao Partido dos Trabalhadores e receberam estas vantagens e podem as ter utilizado em qualquer finalidade por eles pretendida, tanto em campanhas eleitorais, em caixa dois, como começaram a arguir, mas no fim da ação penal ou para fim de enriquecer pessoalmente ou ainda distribuir mesada para parlamentar de seus partidos e para atrair deputados de outros partidos, aumentando suas respectivas bancadas, como concluiu a CPMI dos Correios”, finalizou Barbosa. 

Entre os acusados neste item, apenas Antonio Lamas, irmão de Jacinto e ex-assessor da liderança do PL na Câmara, foi absolvido da acusação de lavagem de dinheiro, já que Barbosa considerou não haver provas contra ele.

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Na sequência, o revisor Ricardo Lewandowski apresentará seu voto e será sucedido pelos demais ministros da Corte. Na sequência, a palavra volta a Joaquim Barbosa, que irá julgar os réus ligados à cúpula do PT (José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares) e ao grupo de Marcos Valério.

PP

"Os réus, principais dirigentes do PP à época dos fatos, por meio de mecanismos de lavagem, operacionalizados com o auxílio direto do réu João Cláudio Genú, dissimularam a natureza, a origem, a localização, a disposição e a movimentação de valores milionários, bem como ocultaram os reais proprietários e beneficiários destas quantias", afirmou.

Segundo a denúncia da Procuradoria Geral da República, as empresas de Valério repassaram R$ 4,1 milhões para os parlamentares do PP. Desse total, o valor de R$ 2,9 milhões foi entregue aos parlamentares em malas ou sacolas, e o valor de R$ 1,2 milhão foi transferido pela sistemática de lavagem de dinheiro operacionalizada pela empresa Bônus-Banval. Em seu voto, o relator concordou com a tese da Procuradoria.

Barbosa afirmou que os pepistas receberam o dinheiro de três maneiras: por meio de Simone Vasconcellos, ex-diretora da agência SMP&B, de Valério; em saques feitos nas agências de Banco Rural, tendo como beneficiária a própria SMP&B; e por meio da corretora Bônus-Banval, sem que houvesse qualquer tipo de registro formal da transação.

PL

Barbosa concordou com a tese da Procuradoria Geral da República, autora da denúncia, de que Costa Neto, ex-presidente do PL, recebeu R$ 10,8 milhões do PT em troca do apoio da bancada do partido no Congresso. "O repasse [aos parlamentares do PL] foi feito por interlocução de Delúbio Soares [ex-tesoureiro do PT], que indicou os nomes dos beneficiários a Marcos Valério [publicitário apontado como operador do mensalão]", afirmou.

Segundo o relator, embora o PL estivesse no governo Lula, já que era a sigla do ex-vice-presidente José Alencar, os parlamentares da legenda ainda não estava fechada com o PT no Congresso. Para embasar o seu argumento de que o PL não apoiava o PT integralmente, Barbosa citou o depoimento de Bispo Rodrigues, em que ele conta que não apoiou a chapa composta por seu partido com o PT.

Barbosa citou ainda que, em depoimento, Marcos Valério confirmou o pagamento ao PL alegando "que se tratou apenas de [despesa de] campanha". Contra o argumento, o ministro afirmou que Costa Neto não apresentou comprovantes de que esse dinheiro tenha sido gasto com despesas eleitorais.

PTB

Segundo o ministro, os autos do processo demonstram que os réus do PTB receberam pagamentos milionários para apoiar projetos de interesse do governo federal no Congresso. "Jefferson recebeu sim uma soma elevada, em espécie, no seu gabinete, com a presença de Emerson Palmieri, soma paga pelo PT", sustentou Barbosa.

De acordo com o relator, os primeiros pagamentos feitos pelo PT foram recebidos por José Carlos Martinez --ex-presidente do partido morto em 2003 e substituído por Jefferson-- e por Romeu Queiroz.

Após a morte de Martinez, em outubro de 2003, foram feitos mais alguns pagamentos, recebidos por Jefferson, segundo o relator. Ao todo, o PTB recebeu mais de R$ 4 milhões e não comprovou a destinação dada ao montante, segundo o relator.

"Jefferson sabia da existência do que chamou de mesada. Mais do que isso, sabia que Martinez vinha recebendo recursos em espécie neste mesmo esquema operacionalizado por Delúbio e Valério", disse Barbosa.

PMDB

De acordo com o relator, José Borba teria recebido R$ 2,1 milhões, de forma indireta, para votar a favor da reforma tributária e da reforma da previdência no primeiro mandato de Lula. Borba era líder da bancada do PMDB na Câmara na época –ele se desfiliou do partido em 2007.

Barbosa citou declarações dadas pelo tesoureiro da agência Brasília do Banco Rural de que iria fazer o pagamento a José Borba. Segundo o depoimento dele, como Borba não autorizou que ele tirasse cópia do seu documento de identidade, o saque não foi feito. Simone Vasconcelos, ex-funcionária de Marcos Valério, foi, então, até a agência para fazer o saque e entregar o montante para Borba, que estava aguardando no local.

Outro lado

O advogado do ex-deputado federal Pedro Corrêa, Marcelo Leal, disse que continua “otimista” apesar do voto do relator, ministro Joaquim Barbosa, que pediu a condenação do seu cliente por formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do mensalão. “Eu continuo otimista porque o meu cliente é inocente.” Embora tenha afirmado que discorda do voto, Leal preferiu não fazer comentários. “Seria deselegante eu comentar no meio do julgamento.”

Os advogados dos outros 11 réus desta fatia do processo foram procurados pelo UOL, mas não foram encontrados.

"Nova fatia"

Ao final do voto de Barbosa sobre os parlamentares de partidos da base governista, o ministro-revisor Ricardo Lewandowski iniciará a apresentação de seu voto e, na sequência, os demais ministros --em ordem crescente de tempo na Suprema Corte-- apresentarão seus votos. A expectativa de Lewandowski é que o voto dele dure de uma sessão a duas.

Isso porque o relator decidiu criar uma "nova fatia" dentro do item atualmente analisado, o de número seis. Com isso, foi adiada a análise dos réus ligados aos chamados núcleos político e publicitário, que também estão neste item.

Os votos sobre a cúpula petista --o ex-ministro José Dirceu, o ex-deputado José Genoino e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares-- ficam adiados por, pelo menos, uma semana.

A justificativa de Barbosa é o cansaço e grande número de réus neste item: eram 23 antes do novo "fatiamento". O magistrado e o revisor negam que o adiamento da votação deste trecho tenha qualquer relação com a proximidade das eleições.

Do núcleo publicitário do mensalão, serão julgados o publicitário Marcos Valério, acusado de ser o operador do esquema, seus ex-sócios, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, o advogado dele, Rogério Tolentino, e as funcionárias da agência de Valério, a SMP&B, Simone Vasconcelos e Geiza Dias.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo

Entenda o dia a dia do julgamento