Topo

Retrospectiva 2012: Em ano de CPI e senador cassado, Congresso conclui votação de temas polêmicos apesar de recesso de cem dias

Camila Campanerut

Do UOL, em Brasília

28/12/2012 06h00

Apesar do "ano legislativo menor", marcado pela ausência dos parlamentares focados nas eleições municipais e nos debates acalorados na CPI do Cachoeira, o Congresso Nacional conseguiu concluir votações de projetos polêmicos como a reforma do Código Florestal, regras para a distribuição dos royalties do petróleo e a Lei Geral da Copa.

Neste ano, os parlamentares tiveram uma folga maior que a de 2011 por causa das eleições municipais. Com isso, das 12 semanas do período, os senadores só votaram em plenário em seis, totalizando 96 dias de recesso em 2012. Na Câmara, os deputados trabalharam em sete das 12 semanas do período pré-eleitoral, alcançando a marca de 103 dias sem votar em plenário. Apesar disso, as comissões permanentes das duas Casas, ainda que esvaziadas, continuaram seus trabalhos.

Na Câmara, foram aprovadas 787 proposições neste ano, quase 19% a mais do que em 2011 (638). No Senado, o número de proposições aprovadas em 2012 foi de 1.216, 23% a mais que em 2011 (936).

"Vamos perceber que mesmo com ano atípico, quando tivemos as eleições municipais que acabou diminuindo o número de sessões deliberativas realizadas pela Câmara dos Deputados, nós, mesmo assim, tivemos um acréscimo no número de proposições votadas no plenário da Câmara e nas comissões permanentes da Casa", afirmou o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), no último dia 20 de dezembro sobre o balanço das atividades do ano.

Com o aumento nas votações, outros temas importantes como a reforma política, o fim dos 14º e 15º salários dos parlamentares, o PNE (Plano Nacional de Educação) para os próximos dez anos, a reforma do FPE (Fundo de Participação dos Estados), o marco civil da internet e o fim do fator previdenciário chegaram a entrar na pauta de discussões, mas não conseguiram concluir sua tramitação nas duas Casas Legislativas neste ano.

“O ano, marcado por eleições, teve seu o calendário muito comprometido. Não teve nenhuma votação de destaque. Foi marcado pelo mensalão. Ficou fechado na aprovação das MPs [medidas provisórias]. Outros assuntos ficaram comprometidos”, afirmou ao UOL o líder do DEM no Senado, Agripino Maia (RN). 

Votações

Em maio, a Lei Geral da Copa de 2014 foi aprovada com a autorização de venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante o evento. O tema foi um dos que mais causaram debates entre os congressistas. O resultado de liberar a venda das bebidas manteve o acordo internacional firmado com a Fifa.

Musa do Congresso

  • O Congresso também teve sua musa em 2012, a assessora parlamentar demitida após vídeo erótico

No fim de setembro, foi a vez de mais uma etapa das discussões sobre a reforma do Código Florestal ser concluída. Depois dos vetos, contrariando a proposta que veio do Executivo, os parlamentares aprovaram novamente um texto que desagradou ao Planalto ao permitir reserva de área menor para reflorestamento em margens de rios e a ampliação deste benefício para propriedades maiores, além da possibilidade de plantação de árvores frutíferas no cômputo das APPs (Área de Preservação Permanente).  Foram justamente estes os itens vetados pela presidente Dilma Rousseff – o que enfureceu a bancada ruralista no Congresso, que prometeu retaliação.

No mês seguinte, a resposta veio: o projeto que regulamentava a distribuição dos royalties do petróleo foi aprovado de maneira a contrariar o Executivo.

O governo defendia a proposta de destinar 100% dos royalties dos contratos futuros para a educação. Este item não foi incluído no texto aprovado depois de uma reviravolta, comandada por grupos da oposição, que conseguiu colocar em votação a versão do texto do Senado (e não a da Câmara, que estava em apreciação), que ainda não contemplava a destinação exclusiva dos lucros da produção petrolífera para a educação. 

“O Código Florestal e os royalties foram as duas mais importantes votações do ano. A mais importante da década [foi o Código]. Um marco na relação do campo e do meio ambiente”, avaliou o líder do PMDB da Câmara, Henrique Eduardo Alves. 

O deputado, que integra a maior bancada governista na Casa Legislativa, argumenta que a votação contrária não representa um racha na base do governo, mas que os interesses locais foram preponderantes em relação aos político-partidários no caso da votação dos royalties. Depois muita polêmica, o Congresso Nacional decidiu deixar para 2013 a análise do veto da presidente Dilma Rousseff sobre a nova forma de distribuição dos royalties.

Governo

Ao término, teremos uma boa legislação. O governo foi derrotado em duas votações, mas não se recusou a dialogar

Deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP)

“Foram questões de Estados e regiões que são acima de governo e oposição. Fomos buscar a negociação, mas o que prevaleceu foi o interesse do Estado federativo”, afirmou Alves, favorito para substituir o petista Marco Maia (PT-RS) na presidência da Câmara nos próximos dois anos.

Na mesma linha, o líder do governo na Câmara, o deputado federal Arlindo Chinaglia (PT-SP), reconheceu as derrotas do governo.

“O governo teve maioria na primeira votação [do Código Florestal]. Eu acho que, ao término, teremos uma boa legislação. E, nos royalties, foi uma votação tensa, disputadíssima, e vai prevalecer a melhor legislação possível. O governo foi derrotado em duas votações, mas fez medidas provisórias que ajudaram a definir parâmetros e não se recusou a dialogar”, avaliou o líder.

Outro tema importante aprovado no plenário da Câmara foi o reajuste de 15,8%, escalonado em três anos (2013 a 2015), para 24 categorias de servidores públicos federais. O texto aguarda sanção da presidente Dilma Rousseff.

Frustrações

Os parlamentares partiram para seus Estados no último dia 22 de dezembro sem votar o Orçamento da União. A decisão de adiar a votação para 2013 foi tomada após a interpretação de que uma liminar do ministro Luiz Fux do STF (Supremo Tribunal Federal) impediria a votação do Orçamento antes da apreciação dos vetos dos royalties na frente dos mais de 3.000 que aguardavam na pauta do Congresso para serem votados.

Fux, contudo, chegou a divulgar uma nota explicando que a decisão dele de respeito à ordem de chegada dos vetos não incluía a votação do Orçamento. Mesmo assim, até o dia 26 de dezembro, os congressistas não concluíram essa votação.

Alves destacou que o ano de 2012 se encerra com uma frustação para ele: a de não ter concluído a aprovação dos projetos que compõem a reforma política. “Não tivemos a capacidade e a competência de votar a reforma política”, lamentou. 

Questionado sobre a possibilidade de dar prosseguimento ao tema em 2013, o líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PR), é categórico: “O que não é do interesse do governo não se vota. O governo não quer fazer reforma política agora”, disse.

“Do ponto de vista do interesse do governo, o Congresso foi generoso [neste ano], fez tudo o que governo pediu, em função de ter uma maioria histórica. Foram inúmeras MPs (medidas provisórias) aprovadas. O governo fez o Congresso ser o ‘almoxarifado’, encaminhou as MPs que quis, com todos os penduricalhos que quis. Alterou a legislação para atender a Fifa, na Lei Geral da Copa, mexeu na das licitações, da responsabilidade fiscal, para atender aos interesses da Copa em licitações privilegiando grupos”, afirmou Dias.

Até meados de novembro, o governo havia encaminhado 31 MPs (medidas provisórias) ao Congresso, que, por sua vez, havia votado pelo menos 25.

Oposição

O que não é do interesse do governo não se vota. O governo não quer fazer reforma política agora

Senador Alvaro Dias (PSDB-PR)

“Do ponto de vista da sociedade, [o Congresso] perdeu uma oportunidade: que a CPI do Cachoeira continuasse com as investigações, possibilitando a impunidade de muita gente”,  disse o senador, em referência a pessoas e empresas ligadas à construtora Delta.

CPI e cassação 

Criada em abril, a CPMI do Cachoeira (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) mobilizou deputados e senadores de partidos da oposição e da base do governo para aprofundar as investigações sobre as relações do contraventor Carlos Augusto Ramos, mais conhecido como Carlinhos Cachoeira, com políticos, funcionários públicos e empresários depois de reunir informações de operações da Polícia Federal sobre esquema de jogos de azar, tráfico de influência e corrupção.

Deputados investigados

O caso Cachoeira chegou a respingar em alguns deputados federais que foram citados ou interceptados em ligações telefônicas com o contraventor ou seus auxiliares. O deputado Delegado Protógenes (PCdoB-SP) teve o pedido de investigação rejeitado pelo Conselho de Ética da Câmara. O pedido era de apuração se o parlamentar chegou a ter contato com o ex-sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, conhecido como Dadá, integrante da quadrilha de Cachoeira.
Pela Comissão de Sindicância da Câmara, os deputados de Rubens Otoni (PT-GO) e Sandes Júnior (PP-GO) - apontados em gravações da PF por terem relações com Cachoeira – também tiveram seus pedidos de investigação arquivados.
Em 11 de julho, a mesma comissão aprovou o pedido de cassação do mandato do deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), amigo de Cachoeira, e o encaminhou ao Conselho de Ética da Câmara, que ainda definirá se vai abrir ou não um inquérito com base no pedido da comissão por quebra de decoro do deputado.
Em outra questão, o Conselho de Ética da Câmara arquivou a representação contra o deputado João Carlos Bacelar (PR-BA) por acusações de nepotismo cruzado. Reportagem da revista "Veja" mostrou que ele nomeou para seu gabinete a mãe e a irmã do deputado estadual Nelson Leal (PSL-BA), enquanto Leal nomeou para o gabinete dele, na Assembleia Legislativa baiana, a mãe e o tio de Bacelar.
O Conselho de Ética da Câmara arquivou a representação contra o deputado Marcos Medrado (PDT-BA), por quebra do decoro parlamentar pela denúncia de participar de esquema de venda de emendas parlamentares ao Orçamento para beneficiar empresas de propriedade dele.

Os trabalhos da CPI tiveram reflexo na cassação do senador Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido-GO), condenado por colegas do Senado por quebra de decoro parlamentar pela relação de amizade com Cachoeira e por colocar o mandato a serviço dele.

Os demais políticos citados nas investigações, como o deputado federal Carlos Leréia (PSDB-GO),o governador Agnelo Queiroz (PT-DF) e Marconi Perillo (PSDB-GO), foram ouvidos pela comissão, mas não tiveram seus mandatos comprometidos devido às relações com o bicheiro.

Dos deputados citados, apenas o caso do deputado Carlos Leréia (PSDB-GO) irá para o Conselho de Ética da Câmara no ano que vem, enquanto os deputados Rubens Otoni (PT-GO), Sandes Júnior (PP-GO) e Stepan Nercessian (PPS-RJ) tiveram representações --que pediam as investigações das relações deles com o bicheiro-- arquivadas.

Instituída para funcionar por seis meses, a CPI conseguiu prorrogar suas atividades por mais 48 dias, até 22 de dezembro. O período extra não foi suficiente para votar os mais de 500 pedidos de depoimentos e quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico de supostas empresas fantasmas ligadas à construtora Delta.

A medida garantiu tempo para analisar e votar o relatório do deputado Odair Cunha (PT-MG), mas não foi suficiente para votar mais de 500 requerimentos que incluíam pedidos de depoimentos e quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico de supostas empresas fantasmas ligadas à Delta.

Uma das empresas com mais contratos com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal, a Delta, segundo apontam investigações da Polícia Federal, seria usada para lavar dinheiro obtido por jogos ilegais e teria Cachoeira como sócio oculto.

O relator do caso na comissão, o deputado federal Odair Cunha (PT-MG), teve seu relatório rejeitado e o voto em separado, uma espécie de relatório alternativo, do deputado Luiz Pitiman (PMDB-DF) foi aprovado, sem que houvesse pedido de indiciamento nem responsabilização criminal de nenhum dos envolvidos no esquema.

Para Cunha, o desfecho da comissão foi uma “pizza geral”. Já outros parlamentares avaliaram que a entrega ao Ministério Público da íntegra do material reunido pela comissão, incluindo quebras de sigilos bancários e interceptações telefônicas, permitirá que o órgão dê continuidade às investigações e tome as medidas judiciais cabíveis com relação aos responsáveis.

Partidos como PSDB, DEM, PSOL e PPS defendiam a prorrogação da CPI por mais seis meses, mas não conseguiram assinaturas suficientes para protocolar o pedido nem para criar uma nova CPI.

“Até poderíamos fazer isso como gesto político, mas sem nenhum ato prático. Nós [oposição] não temos um terço no Congresso para propor CPI”, afirmou o líder tucano Alvaro Dias. 

O relatório de Cunha não foi aprovado, e a CPI terminou sem pedir nenhum indiciamento.

Expectativa para 2013

Os parlamentares consultados pelo UOL afirmaram que pretendem, depois de estabelecidas as presidências das duas Casas Legislativas, dar andamento a projetos negligenciados por falta de tempo e mobilização para serem votados.

As eleições para a presidência na Câmara e no Senado e para os demais integrantes da Mesa Diretora de cada Casa serão realizadas logo no início de fevereiro de 2013 – quando os trabalhos do Legislativo reiniciam. Os presidentes têm mandato de dois anos e a votação é feita pelos próprios deputados e senadores.

A previsão é a de que o PT e o PMDB mantenham o acordo firmado logo após as eleições de 2010. O acerto prevê que Renan Calheiros (PMDB-AL) seja o candidato do PMDB à presidência do Senado, no lugar de José Sarney (PMDB-AP); e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) substitua o petista Marco Maia (RS) à frente da Câmara dos Deputados.

O acerto prevê que Renan Calheiros (PMDB-AL) seja o candidato do PMDB à presidência do Senado, no lugar de José Sarney (PMDB-AP); e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) substitua o petista Marco Maia (RS) à frente da Câmara dos Deputados. Como os dois partidos contam com o apoio da maioria dos parlamentares, é esperado que o candidato apoiado por eles seja o vencedor.