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Por votos, vereador loteou secretaria e doou asfalto da Prefeitura de Blumenau (SC)

Vinícius Segalla e Guilherme Balza

Do UOL, em Blumenau (SC) e em São Paulo

01/05/2013 12h00

Ligações elétricas, tickets de gasolina, empregos públicos, vantagens a empresas e até doação de asfalto. Esses foram alguns “favores” prestados pelo vereador de Blumenau (139 km de Florianópolis) Robinsom Fernando Soares (PSD), o Robinho, para obter apoio na eleição de 2012, segundo revelam escutas feitas a pedido do MPE (Ministério Público Estadual) em Santa Catarina e obtidas com exclusividade pelo UOL.

Vereador de Blumenau (SC) negocia obras em troca de votos

Sexto vereador mais votado no município catarinense, com 4.514 votos, Robinho foi diretor de Iluminação da Sesur (Secretaria Municipal de Serviços Urbanos) até 4 de julho de 2012, quando se afastou do cargo para fazer campanha. A investigação do MPE apontou que ele continuou a usar sua influência no órgão mesmo afastado da administração.

  • Divulgação

    Robinsom Soares (PSD), o Robinho, vereador de Blumenau (SC), que estaria envolvido em esquema de corrupção e compra de votos

A reportagem conversou por telefone com Robinho. Ele pediu que as questões referentes às investigações do Ministério Público fossem encaminhadas por e-mail. A reportagem enviou as perguntas, mas não obteve resposta até o fechamento do texto.

A atuação do vereador está ligada a um megaesquema de corrupção instalado em Blumenau, com o objetivo de desviar dinheiro público. Segundo o MPE, o esquema já teria sido responsável por um prejuízo de pelo menos R$ 100 milhões aos cofres públicos, cerca de 7% do orçamento de 2012 da cidade catarinense.

Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, que constam em um inquérito de pelo menos 3.500 páginas, mostram indícios de práticas criminosas como fraudes em licitações, contratação de funcionários fantasmas, desvio de recursos e equipamentos do poder municipal e uso de cargo público para o favorecimento de particulares.

Entenda o esquema

Em 2012, o esquema teria alimentado o caixa de campanhas eleitorais de vereadores ligados ao PSD e ao PR, entre eles, Robinho.

Cabide de empregos

Em um dos diálogos telefônicos transcritos, com data de 26 de junho de 2012, Robinho conversa com um interlocutor não identificado e fala da necessidade de tirar da Sesur o funcionário comissionado Josvaldo Ottesbach, conhecido como Capivara, para que ele se dedique exclusivamente a sua campanha para vereador.

Ao interlocutor, Robinho afirmou que o substituto de Capivara terá de ser alguém “que fique com uma parte e devolva a outra”, referindo-se a uma parcela do salário que o funcionário teria de desembolsar para ajudar na campanha dele. “Tem que ver o valor e quanto é que tu vai querer”, responde o interlocutor.

Em outra conversa, interceptada em 2 de julho, Alfonso Espíndola, funcionário da prefeitura e colaborador na campanha de Robinho, pergunta ao então candidato a vereador se os cabos eleitorais indicados por eles para ocupar cargos comissionados na administração pública iriam receber ajuda de custo.

“A gente já arrumou uma ‘beirada’ [cargo] para eles, que tão na folha [de pagamento] (...) A gente vai vê alguma coisa de ajuda de custo?”, questionou Espíndola. Robinho responde que não, porque eles já estão trabalhando por indicação.

Em seguida, o cabo eleitoral cita dois funcionários da prefeitura, um de carreira e o outro comissionado, e pergunta se eles terão ajuda de custo. Robinho responde que apenas o funcionário de carreira, que "tem que ter um agrado". Depois, Robinho, novamente interpelado por Alfonso, afirmou que poderia arcar com até R$ 50 de gasolina utilizada pelos comissionados.

Segundo o MPE, o escolhido para substituí-lo é um funcionário chamado Jefferson, que teria ciência do “acerto” para beneficiar Robinho.

SAIBA MAIS SOBRE BLUMENAU

De acordo com as investigações, em conversa com Benjamin Valle, funcionário da URB (Companhia de Urbanização de Blumenau), com data de 3 de julho –um dia depois de Robinho declarar afastamento da Sesur-- o então candidato a vereador trata do seu substituto, um funcionário do setor de sinalização da secretaria.

Na transcrição feita pela Promotoria, Robinho deixa claro que a substituição será apenas de fachada, dada a necessidade legal de candidatos se afastarem de cargos públicos. “Ele vai assumir o meu lugar aqui na diretoria. É, na verdade só no cargo, né, ele vai continuar trabalhando na sinalização, mas eu tenho que nomear pra, poder, enfim...”

Asfalto em troca de votos

De acordo com o MPE, Robinho usou sua influência dentro da administração para asfaltar a rua Angelo Vanelli, no bairro Progresso, em troca de votos dos moradores. O asfaltamento da via não estava previsto, além de não ter projeto, nem aprovação dos órgãos competentes.

Para realizar a obra, Robinho teria acionado o empreiteiro Moisés Rodrigues, conhecido como Tchê, dono de empresas ligadas ao esquema de fraudes em processos de dispensa de licitação organizado pela URB.

A obra chegou a ser parada por um fiscal da prefeitura, mas foi retomada depois que Robinho e seus coordenadores de campanha intercederam. Parte da obra foi realizada com asfalto da própria URB, sustenta a Promotoria.

As escutas apontam que o candidato a vereador utilizou um caminhão e uma kombi da construtora Engetechne, envolvida no esquema de fraudes em licitações da URB, para fazer o transporte e instalação de placas e outros produtos de campanha, o que é ilegal, pois as empresas mantinham contratos com a administração.

O caminhão chegou a ser utilizado em horário comercial, com adesivos e outras indicações da empresa, o que preocupou o empreiteiro Israel de Souza, um dos sócios da Engetechne e articuladores do esquema de fraudes, de acordo com as investigações. “Pelo amor de Deus, isso pode ir para a imprensa, vai pra TV e pode dar m...”, disse, em conversa com um subordinado.

  • Reprodução

    Na transcrição acima, Robinho conversa com interlocutor sobre a nomeação de fachada de um funcionário para substituí-lo; ambos conversam também sobre um favor a Benjamin

"Favores" eleitorais

Outra ligação transcrita pelo MPE, de 27 de junho, um interlocutor não identificado ligado à Corrêa Materiais Elétricos LTDA EPP, agradece Robinho por ele ter ajudado a liberar uma obra de responsabilidade da empresa e reduzido uma multa imposta à firma de R$ 50 mil para R$ 5.000.

Na sequência, o interlocutor diz a Robinho que fica a critério do candidato ir até a empresa para “estipular o valor do apoio” a ele. Afirma, ainda, que Robinho pode “contar forte com a Corrêa” na campanha.

Segundo as escutas, Robinho usou um contrato da URB para serviços de iluminação na rua Dois de Setembro para obter apoio eleitoral. O candidato ajudou um interlocutor chamado Juliano, que falava em nome da Corrêa e pediu que a empresa fosse subcontratada ao menos para executar a mão de obra do serviço.

Juliano afirmou que, após o serviço ser repassado à Corrêa, seria subcontratado para uma empresa chamada BJ. “[Eles] vão apoiar nós na campanha, tu sabe, né? (...) Uma coisa amarra a outra, vamos pedir para o Victor [funcionário da URB e coordenador de campanha de Robinho] também dar uma atenção especial pelo menos para nós termos os caras na nossa mão. Ali é um montinho de voto.”

As escutas mostram ainda que Robinho usou sua influência no setor de iluminação da Sesur para atender favores, como religações elétricas, consertos de postes particulares, em troca de apoio político, como a distribuição de santinhos.

De acordo com o MP, aos apoiadores que colocassem adesivos nos carros dentro do comitê de campanha, Robinho entregava tickets de abastecimento de gasolina. Durante a campanha, o candidato continuou usando celular funcional da prefeitura, o que configura crime de peculato, afirma a Promotoria.

Crimes

Segundo o MPE, as provas colhidas são suficientes para denunciar o vereador pelos crimes de peculato apropriação (uso de bem público para fim privado), corrupção passiva, compra de votos, advocacia administrativa (uso de facilidades do cargo em favor de terceiros), além de improbidade administrativa.

As escutas foram enviadas pelo Ministério Público Estadual ao Ministério Público Eleitoral, que pediu a cassação do mandato de Robinho. A Justiça Eleitoral de Primeiro Grau aceitou o pedido, mas o vereador recorreu ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral). Enquanto o recurso não for julgado, ele tem direito de permanecer no cargo.