Livro sobre a ditadura no interior de SP é vetado, e autores pedem recursos
O veto à publicação de um livro que aborda a ditadura militar (1964-1985) em Piracicaba (160 km de São Paulo) fez com que seus autores iniciassem uma campanha em busca de doações na internet para bancar a publicação de forma independente.
O veto foi feito pelo IHGP (Instituto Histórico e Geografico de Piracicaba), que havia solicitado a obra e a financiaria. Os autores afirmam que a instituição não explicou os motivos do cancelamento e falam em censura. O IHGP foi consultado pela reportagem, mas não se manifestou sobre o assunto.
Segundo Beatriz Vicentini, organizadora do livro "Piracicaba, 1964 – o Golpe Militar no Interior", ela foi chamada para uma reunião da entidade, em agosto de 2013, na qual foi consultada, pela instituição, para a elaboração do livro.
A ideia, segundo ela, seria lançar a obra no final de março e contaria a história da atuação da ditadura militar na cidade. Ela se comprometeu a organizar o livro, que seria escrita por ela e por especialistas da própria cidade.
“Eu pesquiso o tema há décadas e disse que não haveria problema em contar essa história. Acertamos que a publicação seria feita na época do aniversário dos 50 anos do golpe e passei, então, a chamar colaboradores para escrever sobre o assunto”, conta.
Segundo ela, em fevereiro, sem nenhum aviso anterior, ela recebeu um comunicado de duas linhas, por e-mail, informando que a instituição decidiu cancelar a publicação. “Eles não deram justificativa, não explicaram, não me chamaram para conversar. Mandaram um e-mail de duas linhas”, disse.
Campanha
Com a negativa para a publicação, os autores tentaram buscar explicações sobre o cancelamento, mas não foram atendidos pelo IHGP. Eles decidiram organizar uma campanha na internet, lançada na sexta-feira (28), para arrecadar R$ 12 mil para a publicação da obra.
Na tarde desta terça-feira (1º), R$ 6.485 já tinha sido arrecadados. Esse valor corresponde ao custo de impressão, sendo que os autores já assumiram os custos de diagramação, capa, divulgação e lançamento do livro.
A obra, com cerca de 400 páginas e tiragem de 500 exemplares, chegou a ser diagramada e teve o registro pedido na biblioteca nacional pelo IHGP antes de ter a publicação cancelada.
“Eles gastaram recursos. Não entendi o cancelamento, mas algo de muito sério deve ter acontecido. Para se cancelar algo no qual já se investiu recursos, a pressão interna, ou externa, não sei, deve ter sido muito forte”, disse Beatriz.
Ela ressaltou, no entanto, que a campanha para arrecadação de fundos deve ser suficiente para garantir a publicação. Na página do financiamento, é possível comprar desde um capítulo da obra, que será enviado por e-mail por R$ 10, o livro por R$ 45 ou até uma palestra com dois dos autores por R$ 1.500.
Ditatura agiu nas cidades pequenas
Para o sociólogo Luiz Fernando Amistalden, outro dos especialistas que escreveu o livro, o lançamento será importante para resgatar uma parte da história que poucos conhecem. “A obra é diferenciada porque consegue mostrar o que aconteceu nas pequenas e médias cidades brasileiras na época do governo militar”.
“Há a percepção de que a ditadura atingiu apenas as grandes cidades. Não foi assim. Em Piracicaba, houve pressão, prisões, censura, pessoas perderam o emprego. Esse livro preenche essa lacuna e nos mostra como a ditadura atingiu as cidades menores”, afirma.
Ely Eser Barreto César, teólogo e professor que participa da obra, afirma que, embora a ação do IHPC tenha traços de censura, o essencial é que a história será contada.
“O instituto abortou a publicação e nós estamos buscando alternativas para financiar a publicação. O primordial é que as pessoas passem a conhecer o que a ditadura fez em Piracicaba”, disse.
Outro lado
O IGHP foi procurado, por telefone, na tarde de segunda-feira (31) e na tarde de hoje, mas foi informado que apenas o presidente da entidade, Vitor Pires Vencovski, poderia falar sobre o assunto. Foi pedido que a reportagem enviasse um e-mail com o pedido e com o tema da entrevista, o que foi feito no início da tarde de hoje, mas, até o fechamento da matéria, não houve resposta.
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