Topo

Leia a transcrição da entrevista de José Roberto Arruda ao UOL e à Folha

Do UOL, em Brasília

06/07/2014 06h00

José Roberto Arruda, candidato a governador do Distrito Federal pelo PR, participou do Poder e Política, programa do UOL e da "Folha" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 4.jul.2014 no estúdio do Grupo Folha em Brasília.

 

 

José Roberto Arruda – 3.jul.2014

Narração de abertura [EM OFF]: José Roberto Arruda tem 60 anos. Nascido em Itajubá, Minas Gerais, é engenheiro elétrico formado pela Escola Federal de Engenharia daquela cidade.

Arruda começou sua carreira no serviço público em 1979, como diretor da Companhia Urbanizadora do Distrito Federal, a Novacap.

Em 1985, tornou-se diretor da Companhia Energética de Brasília, a CEB. Trabalhou na estatal nas gestões dos governadores biônicos José Aparecido de Oliveira e Joaquim Roriz.

Em 1990, Roriz venceu a primeira eleição direta para governador do Distrito Federal e chamou Arruda para ser seu chefe de gabinete e, depois, secretário de Obras.

Arruda elege-se Senador em 1994, pelo PP. Em 1995, rompeu com Roriz. Filiou-se ao PSDB.

Arruda protagonizou 2 grandes escândalos. O primeiro, em 2001, quando participou da quebra do sigilo do painel de votações do Senado... e renunciou ao mandato para evitar sua cassação.

Recuperou-se. Elegeu-se deputado federal e depois governador de Brasília.

Em 2010, quando estava bem avaliado e era cotado para ser candidato a vice-presidente na chapa do tucano José Serra, Arruda foi abatido pela Operação Caixa de Pandora, que revelou suposto pagamento de propina a deputados e integrantes do governo do Distrito Federal.

Entre as provas, apareceu até um vídeo no qual Arruda recebia dinheiro em espécie.

Em fevereiro de 2010, Arruda foi o primeiro governador preso no exercício do mandato. No mês seguinte, a Justiça Eleitoral cassou seu mandato por infidelidade partidária. Em abril, foi liberado da cadeia.

Agora em 2014, filiado ao PR, Partido da República, José Roberto Arruda é candidato a governador do Distrito Federal.

Arruda responde a ação por suposto envolvimento no mensalão do DEM, mas deve escapar da Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2014. Mesmo que venha a ser condenado por um colegiado de juízes, ele já registrou sua candidatura e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está a seu favor.

Folha/UOL: Olá. Bem-vindo a mais um Poder e Política - Entrevista. Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo e do portal UOL. A gravação é realizada no estúdio do Grupo Folha em Brasília. O entrevistado desta edição do Poder e Política é o ex-governador do Distrito Federal, Brasília, José Roberto Arruda.

Folha/UOL: Olá, como vai, tudo bem?
José Roberto Arruda: Tudo bem, Fernando. Bom dia.

Por que o sr. quer ser novamente governador de Brasília?
Só tinha dois caminhos na minha vida: ou considerar que o golpe que o PT me deu para me tirar do governo tinha fundo de verdade e que, portanto, eu sou culpado do que eles me acusam, ou, segunda opção, voltar, botar a cara a tapa, dar as explicações que eu considero que são da minha obrigação, eu tenho que dar essas explicações à sociedade, e, por último, pedir para a população comparar o que foram os três anos do meu governo com o que foram os quatro anos do governo que me sucedeu. Aqueles que me tiraram do poder sorrateiramente em um golpe midiático muito bem dado não se prepararam para governador e mergulharam Brasília em um caos. Essa é a minha chance, a chance da minha vida, de passar a limpo essa página triste da política brasileira.

O sr. diz que foi um golpe, mas havia elementos concretos, evidências de algum comprometimento seu no escândalo que ficou conhecido como Operação Caixa de Pandora, como é que o sr. responde a isso? Por que foi um golpe?
É muito simples. Para você fazer um escândalo midiático basta você pegar fitas gravadas maldosamente, quem grava conversa com alguém sorrateiramente já o faz prevendo alguma chantagem, algum tipo de coisa escusa. Para você fazer um golpe midiático basta você editar essas fitas, mexer nas datas e como visualmente elas são fortes eles tiveram êxito.

O sr. falou visualmente. De fato, há um dos vídeos, dessa época, em que o sr. aparece recebendo dinheiro em espécie. Não é suficientemente forte para comprovar o seu envolvimento e sua culpa no episódio?
Vamos imaginar que aqui agora eu lhe entregasse um dinheiro. Você recebe e grava. Em seguida você diz “não, Arruda, eu não quero esse dinheiro” e me devolve. Essa parte da fita foi cortada. Quem diz isso não sou, é o laudo da Polícia Federal que consta dos autos.

Mas o sr. não devolveu aquele dinheiro.
Devolvi o dinheiro. Agora a doação...

Tem a fita? Tem a gravação em vídeo do sr. devolvendo?
Claro que não. Ele cortou. Mas tem o laudo da Polícia Federal dizendo que ele cortou. E agora tem mais. Tem a declaração dele próprio, o delator, em juízo, assumindo que editou maldosamente. Mas tem mais. Me permita explicar. Tinha os vídeos também de vários deputados recebendo dinheiro do mesmo triste personagem.

Alguns apareceram.
Vários. Muitos não apareceram, é verdade. Muito bem. Esses vídeos todos foram periciados pela Polícia Federal. E o que as perícias da Polícia Federal mostram é que todos os vídeos de todos os deputados são anteriores ao meu governo. E tem mais: a doação que a empresa Dot Paper, ligada à então esposa desse cidadão, fez a minha pré-campanha...

Esse cidadão é o que gravou, Durval Barbosa?
Isso. Isso. A doação que a esposa dele, na época, fez à pré-campanha, às nossas campanhas que fazíamos em todo o Natal, estão registradas no TRE. Esse registro no TRE nós levamos muito tempo para conseguir resgatá-lo, mas hoje ele já faz parte dos autos jurídicos. Por que eu estou aqui, Fernando? Basicamente porque durante quatro anos, depois de toda a tragédia que me tirou do governo, fui preso, humilhado, execrado na opinião pública, eu estou conseguindo provar na Justiça que tudo aquilo foi uma montagem e foi um golpe. Eu não tenho dúvida, Fernando, que aquele cidadão réu confesso praticou ilícitos com o dinheiro público e que também ele, com esse dinheiro ilícito, abasteceu campanhas, isso antes do meu governo.

Em resumo o sr. está dizendo que aquela gravação em que o sr. aparece recebendo dinheiro é de antes do seu governo, de 2005, e que o sr. recebeu dinheiro e devolveu o  dinheiro?
No mesmo ato em que ele me dá R$ 30 mil e diz que é uma doação da empresa da mulher, Dot Paper, eu digo a ele “Olha, não me sinto confortável com isso, faça a doação na conta certa com os recibos”. Muito bem. Ele pega o dinheiro de volta, sai de cena –ele sabia que estava sendo gravado–, ele sai da cena da gravação e depois maquiavelicamente deixa sobre a mesa um brinde da empresa que ele dirigia que eu acabei levando. Não há na gravação nenhuma cena que mostra eu levando o dinheiro. Eu não levei. Eu devolvi a ele. Muito bem. Esse dinheiro, de qualquer maneira, ele acabou fazendo essa doação em outro cenário, em outro momento. E essa doação que ele fez está registrada no TRE. Em resumo, não recebi nenhum dinheiro nem na campanha, nem na pré-campanha, que não tenha sido registrado de acordo com a lei no TRE.

O sr. convivia com essa pessoa, foi na residência dele, no escritório dele essa cena, não foi isso?
Não. Ele tinha um irmão que era deputado pelo PSDB em Brasília. Em função da convivência que eu tinha com o irmão dele eu estive algumas vezes com ele.

Mas esse local onde foi feita a gravação era onde?
Era no escritório dele.

Pois bem. O sr. foi ao escritório dele, o sr. era deputado federal e era pré-candidato ao Governo do Distrito Federal. Houve esse episódio. Havia suspeita sobre essa pessoa já. Essa pessoa depois durante o seu governo continuou durante um certo período próxima aí da sua administração. Não é isso? Como o sr. explica isso?
Isso é um erro. Eu acho que...

O que o Durval Barbosa fez durante o seu governo?
Na verdade foi um assessor de nada. Era um assessor sem gestão orçamentária...

Por que o sr. foi dar cargo de assessor para essa pessoa?
Porque o irmão era deputado. Eu considero que esse foi um erro. A diferença é que esse é um erro político de deixar uma pessoa desse perfil com um cargo no governo por mais insignificante que seja. Na verdade, quando o irmão dele se elegeu deputado, o irmão desejava que ele, Durval, continuasse presidindo a estatal de informática. Eu não permiti. Mas do que isso: no meu primeiro ano de governo eu reduzi de R$ 530 milhões o gasto com informática médio nos anos anteriores para apenas R$ 34 milhões. Eu o retirei da presidência da Codeplan. Não deixei que ele voltasse. Veio o irmão e pediu que ele, pelo menos, tivesse uma assessoria. Falando português claro, Fernando, esse erro eu cometi, um erro de avaliação. Eu não deveria ter permitido isso. Da mesma forma que a presidente Dilma, o presidente Lula, o presidente Fernando Henrique, atendendo pedidos políticos, podem ter deixado nos seus respectivos governos pessoas que não deveriam. Paguei um preço muito alto por isso, mas o que estou dizendo é que não cometi os crimes dos quais fui acusado.

Essa narrativa que o sr. apresenta terá acolhida na opinião pública, na sua opinião?
Esse é o meu desafio. Eu só tenho duas alternativas: enfrentar, botar a cara a tapa, responder a todas as perguntas que serão feitas, comprová-las com documentos e, por isso, eu coloquei no ar já um site, que é o www.golpede2009.com.br. Lá nesse site, Fernando, de consulta pública, você pode ver os laudos da Polícia Federal que mostram que aquelas fitas de deputados recebendo dinheiro eram todas anteriores ao meu governo. Lá nesse site você vai ver que as doações que eu recebi, inclusive trazidas por esse triste personagem, foram declaradas no TRE. Lá nesse site você vai poder ver as declarações dele, o delator, em juízo, dizendo que eu não tinha conhecimento da ilicitude da origem dos recursos que ele doou. Ora, o que esse sujeito montou? Vamos falar português claro. Ele tentou dar dinheiro para tudo que era candidato em Brasília. Quem ganhasse a eleição ele chantagearia e ele tentou me chantagear. Agora, o mais incrível, o fez em conluio com membros de alto escalão do Ministério Público local e quem diz isso não sou eu, quem diz isso é uma ação penal movida por um procurador do Ministério Público Federal, Ronaldo Albo, que diz, em uma ação penal em curso na Justiça Federal, que eu, Arruda, fui vítima de uma chantagem feita por procuradores do próprio Ministério Público, que foram afastados, em conluio com o delator que queria o quê? Que no meu governo ele pudesse continuar roubando. Eu não permiti. A política brasileira, Fernando, e você, jornalista experiente sabe mais do que eu, é feita de muitas hipocrisias e muitas vestais. Se eu não tivesse cortado o propinoduto, se eu tivesse deixado este cidadão continuar presidente da estatal de informática, se eu não tivesse cortado os gastos com informática, nada teria acontecido.

Por que um deputado federal, prestes a ser eleito governador do Distrito Federal, vai no escritório dessa personagem, Durval Barbosa, é apresentado a um bolo de dinheiro, pega o dinheiro na mão...
E devolve.

E devolve –o sr. está dizendo que o sr. devolveu...
Não, aparece na cena. A cena está aí.

Sim, mas por que um deputado federal vai nesse momento vai lá, depois de ter ido lá não sente nenhum estranhamento, não faz uma denúncia a respeito e diz “olha, quis me dar em dinheiro, não é para me dar em dinheiro”. Como o sr. explica isso?
Vamos lá. Primeiro, eu, como deputado federal, fiz um programa de visita a todos os órgãos de governo, federais e locais. Fui a todos eles, andar por andar, cumprimentando desde a senhora que fazia o café, até o secretário-geral do ministério quando este me recebia, todos eles eleitores de Brasília. Fui na empresa de energia elétrica, CEB, na empresa de saneamento, a Caesb, na empresa de informática, a Codeplan, em todas elas. Quando cheguei na empresa que ele presidia, ele me convida para a sua sala, me oferece um café, sabia ele, pelo irmão, que foi eleito deputado, que eu fazia campanha sociais no Natal, que estão comprovadas nos processos judiciais, e diz que queria fazer uma doação, e tenta fazê-la em dinheiro. Eu, sem graça, a fita mostra que eu fiquei totalmente... Me senti desconfortável, tentei com elegância dizer a ele que eu não receberia, mas que ele fizesse a doação pelos meios legais, que ele acabou fazendo. E essa doação, feita pelos meios legais, foi registrada no TRE. Que a situação é desconfortável é, aliás há uma frase do presidente Fernando Henrique dizendo que a intimidade de todos nós é ridícula. O que não se pode, Fernando, é julgar a vida de uma pessoa. Eu tenho 60 anos de idade, fui senador, fui deputado, fui governador, fazia aqui um governo com 2.300 obras, 80% de aprovação. Não se pode querer julgar, me julgar, interpretando 20 ou 30 segundos de uma fita que o laudo da Polícia Federal diz “foi editada”, que o lauda da Polícia Federal diz “foi muito antes dele ser governador” e que o próprio autor da gravação espúria diz “eu editei”.

Mas, por que o sr., ao sair desse local, não se sentiu incomodado e não tomou alguma providência para que esse tipo de tentativa evidentemente de constranger um político, foi o que aconteceu, dando em dinheiro, por que o sr. não reagiu e não fez uma denúncia?
Olha, depois que passa é muito fácil. Como se pode ver pelo próprio processo, ele fez doações desse tipo a “n” políticos de praticamente todos os partidos. Não me consta que ninguém tenha tido essa visão. O atual governador de Brasília, Agnelo Queiroz, quando prepara o golpe contra mim vai ao mesmo escritório do Durval, negocia com ele uma compensação no seu governo caso o Durval fizesse a delação para me derrubar, o Durval também grava essa fita, esta fita vai ao conhecimento da revista “Veja”, que a publica e, inexplicavelmente, essa fita da gravação do Durval com o Agnelo foi arrancada dos autos. Mais grave: uma advogada, Dra. Cristiane, que teria sido assessora do Durval e teria ligações muito fortes com autoridades do governo federal, ela aparece, inclusive, em um ato de campanha com a presidente Dilma e o ministro Gilberto Carvalho. Teria ligações muito íntimas com o ministro Gilberto Carvalho. Muito bem. Esta senhora dá um depoimento de oito horas na Polícia Federal contando todo o subterrâneo desse golpe, mostrando como altas autoridades do governo federal agiram para cooptar o delator, dar a ele os prêmios judiciais que ele está tendo e, com isso, me tirar do governo, me tirar da eleição de 2010 para que o Agnelo pudesse ganhar a eleição. É incrível, mas essas oito horas de depoimento, que foram motivo de capa de uma matéria de capa da revista “Veja”, com foto dela dando depoimento na Polícia Federal, com a confirmação dos delegados da Polícia Federal e dos membros do Ministério Público Federal de que o depoimento houve, este depoimento foi arrancado dos autos.

Arrancado como?
Tirado. As folhas foram tiradas.

Mas ele existe.
Ele existe e não aparece e nossos advogados peticionam porque o meu objetivo de vida, Fernando, pode demorar muito, mas eu vou comprovar o golpe. Eu vou comprovar como que o PT usa o aparelho do Estado para destruir adversários políticos. É assim o jogo deles.

Mas foi só o PT?
Eu acho que ele pode ter tido outros aliados.

Deixa eu fazer uma pergunta para o sr. O sr. era filiado a um partido político, o Democratas, antigo PFL.
Verdade.

O seu partido tem pessoas experientes. Pode se questionar alguns ali, alguns melhores outros piores, mas tem gente experiente. É um partido estabelecido.
Verdade.

O sr. foi praticamente chutado para fora do seu partido à época, o abandonou inteiramente. O Democratas, ex-PFL, não me consta que seja aliado ao PT. Se toda essa narrativa que o sr. apresenta de fato é a expressão da verdade, como é possível que naquelas reuniões todas, que houve do sr. com seu partido, ninguém do seu partido abraçou essa sua narrativa?
O meu principal algoz dos Democratas foi o senador Demóstenes [Torres].

Não, mas há outros. O senador José Agripino Maia, que é presidente nacional do Democratas, até hoje repele o sr. Inclusive, o sr. queria o apoio aí dos Democratas e ele vetou.
Muito bem. O que há na política brasileira, Fernando, é um jogo de faz de conta. É o jogo da hipocrisia. É um monte de vestais paridas querendo ser os caudatários únicos da ética. Quando aconteceu o episódio comigo e antes mesmo que eu pudesse apresentar as minhas explicações...

Não, o sr. apresentou várias vezes na época.
Posso concluir?

Diga.
Antes que eu pudesse apresentar as explicações, ainda naquela execração pública que eu passava, qualquer palavra que e dissesse era insignificante perto das fortes imagens que eram apresentadas todos os dias na televisão de políticos recebendo dinheiro em espécie. Muito bem. Antes de qualquer coisa o senador Demóstenes, caudatário da moralidade, pede a minha expulsão do partido. Eu considero que as lideranças do meu partido, à época, realmente foram fracas. Quiseram ficar livres do problema. Por quê? Porque eles sabiam que o PT me pegou para Cristo para criar uma figura do mensalão do DEM para se contrapor ao mensalão do PT que seria usado na campanha de 2010. E aí tiraram o corpo fora. Agora, olha como a história é interessante. O senador Demóstenes...

Foi cassado.
O caudatário da moralidade, o meu cruel julgador naquele episódio, poucos meses depois, cai no episódio do Carlos Cachoeira.

Muito bem. Ele caiu, mas os outros que também foram seus algozes na direção do PFL, que eu me recordo que foi uma decisão ali praticamente unânime, estão por aí ainda. Por que o sr...
Cada um tem o seu dia.

O sr. acha que não conseguiria convencê-los dessa sua explicação?
Fernando, nós estamos aqui conversando quatro anos depois. Eu demorei quase três anos para conseguir os laudos da Polícia Federal de que os vídeos eram editados e eram anteriores ao meu governo. Eu demorei quase dois anos para conseguir ter acesso, e a “Veja” teve acesso, aos depoimentos da Dra. Cristiane que releva os bastidores do golpe. Naquele momento da crise, eu fui tão surpreendido quanto toda a opinião pública brasileira. Eu estava preocupado, naquele momento, em governar, e fazia um bom governo. Eu tinha a aprovação de 80% da população, eu fazia 2.300 obras, eu tinha 200 escolas de educação integral, Brasília vivia um momento de otimismo, de desenvolvimento, arrumando a cidade para o seu futuro. Eu fui bombardeado pela crise, como todos nós fomos. Eu diria que a minha reação naquele momento, eu fazendo a minha autocrítica, fui muito ruim se comparado à condição que eu tenho hoje de explicar o episódio. Eu não reagi bem ao episódio. Aliás, não faço segredo para ninguém. Depois que tudo aconteceu eu fui preso em um falso flagrante, um flagrante montado, ridiculamente montado. Muito bem. E só três anos depois, Fernando, tiraram um governador eleito. Prenderam, disseram que era urgente a minha prisão e sabe quanto tempo demorou para fazer uma denúncia contra mim? Mais de três anos. Ora, se era urgente me tirar do governo, se eu tinha que ser preso, por que demorou três anos para fazer a denúncia?

Sobre esse episódio do flagrante, foi a respeito daquele suposto emissário seu que teria feito uma entrega de R$ 200 mil a uma das testemunhas da Operação Caixa de Pandora...
E eu fui acusado então de cooptar uma testemunha.

O sr. foi acusado de tentar subornar uma testemunha. O que aconteceu?
Basicamente o seguinte: eu sou o único brasileiro que fui preso em flagrante sem estar na cena do flagrante. Absolutamente não aconteceu nada. Os dois personagens, [Antônio] Bento [da Silva] e [Edson] Sombra, tinham aqui em Brasília um pequeno órgão, um blog, e dividiam a mesma sala. Montaram uma farsa de um entregar o dinheiro para o outro só que, imagina que você divide a mesma sala com o companheiro de trabalho, se você tem que entregar alguma coisa escusa para ele, se você tem uma mesma sala onde só vocês dois trabalham, aí você ao invés de fazer lá, você escolhe uma lanchonete. Vocês dois vão para a lanchonete e mais, avisam a polícia. Montaram um flagrante. Não há nenhuma ligação telefônica minha com nenhum dos dois, não há nenhuma ligação pessoal minha com nenhum dos dois.

Mas e de seus assessores à época?
Não há nenhuma ligação de nenhum assessor meu com nenhum dos dois e ainda assim eu fui preso em flagrante. É a coisa mais ridícula que existe, mais grave, Fernando. Cometeu-se ali uma insanidade jurídica, que é o seguinte –só há um paralelo na história, que é a prisão do governador [Miguel] Arraes, em Pernambuco, mas aí era um regime de ditadura – no regime democrático, um governador para ser processado tem que ter autorização do Poder Legislativo, um presidente da República para ser processado tem que ter autorização do Congresso Nacional. Antes de ser processado eu fui preso, sem autorização do Poder Legislativo. O que significa que se este precedente for juridicamente válido, amanhã o Supremo Tribunal Federal pode prender um presidente da República sem a autorização do Congresso. Destrói-se aí um dos pilares básicos da independência dos poderes e mais, básico do regime democrático que, no mínimo, um cidadão, por mais simples, que seja ou um presidente da República, tem o direito de defesa e aqueles que o acusam têm o ônus da prova. Não foi o que aconteceu comigo. Por isso eu afirmo: o que se fez comigo foi um golpe. Tanto é verdade que o ministro Gilberto Carvalho, estou dizendo isto aqui pela primeira vez 15 dias antes do dia 27 de novembro e isso está registrado...

O que é o dia 27 de novembro?
27 de novembro é quando essa delação toma os ares de escândalo, é de conhecimento público.

27 de novembro de 2009. O que aconteceu 15 dias antes?
15 dias antes o ministro Gilberto Carvalho vai à residência oficial do governador e diz com todas as letras: “mude de partido”. Desculpa, eu falei 26 de novembro é 27 de setembro.

Setembro.
“Mude de partido”, “venha para um partido da base do presidente Lula”, com quem, aliás, eu me relacionava muito bem.

27 de setembro ainda era possível mudar de partido porque era um ano antes da eleição.
Até 30 de setembro. Eu me recusei.

Por que ele sugeriu isso ao sr.? Não estou entendendo.
Basicamente, ele foi me pressionar “ou você muda de partido ou você vai cair”. Em resumo é isso. Foi um recado muito claro que eu recebi.

Então, ele foi durante o mês de setembro porque o episódio eclodiu em 27 de setembro é isso?
Não, a delação é feita no dia 16 de setembro.

Certo.
Ok. Ele me visitou na primeira quinzena de setembro, almoçou comigo.

Uhum.
Eu tinha uma relação pessoal e polícia muito respeitosa e muito boa com o presidente Lula.

O sr. está dizendo que o então secretário do gabinete pessoal do presidente Lula visitou o sr. na residência oficial do governo do Distrito Federal e sugeriu ao sr. alguns dias antes da apresentação da denúncia que o sr. mudasse de partido? É isso?
Eu estou afirmando isso. Estou afirmando mais: logo depois desse encontro com o ministro Gilberto Carvalho, que eu disse da minha dificuldade, que eu não mudaria de partido, que eu tinha um compromisso com o DEM.

O sr. era filiado ao Democratas.
Eu também fui visitado pela então candidata Dilma [Rousseff] na companhia da sra. Erenice [Guerra]. As duas também almoçaram comigo.

Antes da apresentação da denúncia. Não existe denúncia ainda.
Não havia denúncia.

E que foi dito nesse almoço?
A mesma coisa. Da possibilidade... Olha, o que foi dito, em tese, Fernando, é uma coisa até legítima “olha, você não quer mudar de partido para me apoiar?”. O que a presidente Dilma me disse foi isso. Eu disse “não, não posso”, “eu me relaciono muito bem com o presidente, gosto muito da sra.”, e eu já vinha tendo uma relação respeitosa com eles, “mas eu sou de um partido de oposição”.

Mas por que o sr. acha que eles queriam que o sr. mudasse de partido se eles tinham pessoas já sendo preparadas para tentar sucedê-lo no PT?
Porque a chance de eles ganharem as eleições eram zero comigo. Ou eles me derrubavam num golpe, como me derrubaram. Eu tinha 80% de aprovação.

Mas o sr. acha que Gilberto Carvalho, Dilma Rousseff, Erenice Guerra, como o sr. cita, tinham conhecimento disso que o sr. chama de golpe?
Absolutamente. Não tenho nenhuma dúvida. A revista “Veja” na edição de capa mostra a fotografia do ministro Gilberto Carvalho com a dra. Cristiane. E essa dra. Cristiane em uma reportagem de capa da revista “Veja”, que eu tenho aqui. Posso exibir? O bom de entrevista assim gravada é isso. Está aqui a matéria da “Veja”. É esta a advogada. E aqui dentro da matéria da “Veja” você encontra a foto da mesma advogada na presença da então candidata Dilma e do ministro Gilberto Carvalho.

Mas isso prova que Dilma Rousseff e Gilberto Carvalho soubessem disso que o sr. está dizendo? O fato de ela ter estado perto deles?
Olha, Fernando, você que é um jornalista experiente é que deve analisar. Eu acho que a “Veja” não daria uma matéria de capa, com os detalhes do depoimento onde ela conta como que o golpe foi engendrado contra mim se eles não tivessem elementos de convicção. Não me parece que a revista “Veja” faria uma reportagem de capa de forma irresponsável.

Mas aí, enfim, foi a respeito dessa, da dra. Cristiane, como o sr. diz.
Essa matéria diz, textualmente, que a dra. Cristiane deu um depoimento de oito horas ao Ministério Público, confirmado depois na Polícia Federal, mostrando como que o golpe foi preparado para me tirar do governo e da eleição. Muito bem. Este depoimento, o mínimo que se espera, é que ele apareça. Mais do que isso, nessa reportagem, tem uma foto da dra. Cristiane durante o depoimento. Esse depoimento foi gravado. E este depoimento inexplicavelmente foi arrancado dos autos e permanece em segredo de Justiça. Fernando, pode demorar dez anos, pode demorar 20 anos, pode demorar a vida inteira, mas eu tenho muita fé que eu não vou morrer antes de elucidar isso.

O sr...
A verdade vai aparecer.

O sr. está afirmando aqui então, em resumo, que houve um golpe preparado para retirá-lo do cargo de governador do Distrito Federal, em 2009, e enfim, e início de 2010 quando se consumou a sua saída. Que Agnelo Queiroz, que é o atual governador de Brasília, do PT, foi um dos artífices desse golpe, é isso?
É isso, mais do que isso. Como artífice do golpe, ele fez um acordo com o delator. “Você me ajuda a editar as fitas, a mudar as datas delas, derruba o Arruda, eu vou ganhar a eleição e, quando eu ganhar a eleição, o que o Arruda não te deu, eu vou te dar”. Eu fiquei quietinho, esperando. Sabe o que aconteceu? O chefe de gabinete do Durval Barbosa, o delator, no governo do Agnelo foi alçado à condição de presidente da Comissão de Licitação da licitação milionária que houve no governo para todo o sistema de transporte coletivo. Ou seja, ele não apenas fez um acordo com o delator para me derrubar, como no governo dele pagou a fatura a este réu confesso.

Vamos reservar então, política do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. O sr. está dizendo então que Gilberto Carvalho, secretário do gabinete pessoal, à época, do então presidente Lula, Dilma Rousseff que foi ministra da Casa Civil, estavam cientes dessa operação.
Eu não tenho...

Mas eles mencionaram para o sr. de maneira direta que “ou o sr. nos apoia ou o sr. vai ser derrubado”?
Não. O Gilberto Carvalho deu a entender isso.

De que forma?
“Olha, vai ser melhor para você, você não corre riscos”. Basicamente isso. A presidente Dilma, na época candidata, eu diria que me fez uma visita elegante. A dra. Erenice a acompanhou. E as duas pediram para que eu mudasse de partido e pudesse apoiar a Dilma e não apoiasse o Serra.

Para qual partido?
Sugeriram várias hipóteses.

Quais eram elas?
Não me lembro, mas acho que o PMDB era uma delas.  O próprio presidente Lula chegou a me fazer esse convite. Mas isso, Fernando, dentro de um jogo legitimo da política. O que me assustou foi a conversa com o Gilberto Carvalho, porque nesta conversa, uma conversa sorrateira, ele deixou claro “vem pra cá enquanto é tempo”.

Ele falou essa frase?
Olha, eu não gravo ninguém. Eu não sou desse naipe. Eu não lembro também, cinco anos depois, quais as palavras usadas por eles, aí seria leviano...

Mas o sentido, qual foi?
O sentido era este.

Qual era?
Venha nos apoiar. Venha para a base do governo enquanto é tempo. O enquanto é tempo poderia ser interpretado porque [depois de] 30 de setembro você não pode mais mudar de partido.

Mas olha só, no melhor do meu juízo, o sr. foi chantageado durante um certo período, o sr. sabia que existiam essas fitas. Certo?
Eu só fiquei sabendo que existiam essas fitas no dia em que uma promotora do Ministério Público do DF...

Quando foi isso?
Dra. Deborah Guerner. Uns dois meses antes de o episódio eclodir.

Pois é. À época que Gilberto Carvalho o visitou o sr. já sabia da existência.
A dra. Deborah Guerner me visitou e disse: “Ou você permite que o pessoal da coleta de lixo de Brasília e o pessoal da informática nos dê a mesada que nos foi retirada ou você vai ver fita suas recebendo dinheiro do Durval na televisão”. Qual foi a minha reação? Eu a coloquei para fora da residência oficial e imediatamente avisei o procurador-geral do Ministério Público que me pediu que eu esperasse porque as providências estavam sendo tomadas.

Mas o sr. formalizou em ofício?
Não, não formalizei porque ele pediu que eu esperasse.

Não deveria?
Eu acho que sim. Se passasse o filme outra vez eu deveria.

O sr. cometeu um erro grave. O sr. deveria ter formalizado no ofício porque como provar agora?
É verdade, Fernando, sabe como provar agora? Eu, bom, eu acho que eu nunca... Quando aconteceu e eu caí, eu disse “infelizmente eu nunca vou poder provar isso”.

Difícil, né?
Muito bem. Só que as provas apareceram. Sabe como?

Quais são elas? Como?
O procurador Ronaldo Albo, achando aquela denúncia do Durval muito arrumadinha para ser verdadeira, começa a fazer uma investigação paralela ao Ministério Público local. A última coisa que eu imaginava é que membros do Ministério Público local corruptos estivessem ligados ao delator. Muito bem. Esse procurador federal começa a investigar e um belo dia, com autorização judicial, faz uma busca e apreensão na casa dessa procuradora, que quando eu disse na imprensa que eu tinha sido chantageado por ela, disseram “o Arruda está louco, tentando arrumar explicação estapafúrdia para um episódio inexplicável”. Ele vai à casa dela, no Lago Sul, aqui em Brasília. E na casa dela, ele descobre enterrado em uma caixa de concreto no seu quintal, uma série de fitas onde ela contava essa história e ensaiava a chantagem sobre mim. Com base nessas fitas ele faz uma denúncia penal contra a procuradora Deborah Guerner, contra outros procuradores e contra o próprio Durval e diz, nessa ação penal, “o ex-governador Arruda foi vítima de chantagem de um grupo criminoso do qual faziam parte procuradores do próprio Ministério Público e o delator réu confesso”. Mais grave, esta ação penal tramitando na Justiça Federal me chamou para depor como testemunha. Eu fui. E chegando lá, Fernando, tudo isso, todas essas provas, foram exibidas com clareza. E só a partir disso que aconteceu, três anos depois da minha retirada do governo, é que eu pude obter as provas daquilo que eu tinha falado três anos antes.

Quando o sr. recebe, em meados de setembro de 2009, Gilberto Carvalho, secretário do gabinete pessoal do então presidente Lula, o sr. já sabia desse episódio. Já estava sendo chantageado, como o sr. diz.
Ficou claro para mim também que ele já sabia.

Isso foi objeto da conversa entre o sr. e Gilberto Carvalho?
Olha.

O sr. disse isso para ele?
Não, não disse. A conversa foi...

Como que o sr. sabe que ele sabia?
O que ele foi fazer na minha casa?

Não sei.
Dizer para eu mudar. Bom, está aí. Eu adoraria debater esse tema com ele. Seria muito interessante...

O sr. acha que ele foi na sua casa ameaçá-lo, é isso?
Não tenho a menor dúvida. Olhando sob os olhos de hoje, dúvida nenhuma. Não foi a única vez. Depois que eu fui preso, em uma celinha de 2 por 3 metros, sem banheiro, sem janela, com luz acessa 24 horas por dia, quem vai à minha cela?

Quem?
O dr. Luiz Fernando Corrêa, então diretor-geral da Polícia Federal. E o que ele me propõe?

O que ele propõe?
Ele me propõe “fale o nome de políticos do DEM e do PSDB que você, por ventura, tenha ajudado e você sai daqui amanhã. E eu respondi “vocês não me conhecem, eu saio daqui morto, mas não perco meu caráter”. Ele disse “não, não precisa dizer muita gente, diz só o nome do Arthur Virgílio, do Marconi Perillo e do José Agripino”. Eu disse, eu repeti a ele “vocês podem até me matar aqui, já mataram o prefeito de Santo André, é mais uma morte, não tem problema nenhum, mas não sou o fraco que vocês imaginam”. Quem fez isso não foi um agente, não foi um delegado, foi o próprio diretor-geral da Polícia Federal à época.

O sr. está acusando o então diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, de ter proposto ao sr. um acordo de delação. É isso?
Eu estou contando uma visita que ele me fez. Eu não sou advogado e não vou colocar entre aspas qual o nome que isso tem. Agora...

Porque é natural. Quando alguém supostamente aí participa de algum esquema de corrupção que seja procurado pelas autoridades e dizem “olha, conte o que você sabe, é melhor para você”, não é?
Desculpa. Isso seria natural se o delegado responsável pela investigação tivesse ido à minha cela. Isso seria natural se o membro do Ministério Público que me acusasse tivesse ido me interrogar. Não foi. Nenhum dos dois. Nunca me ouviram. Quem foi lá foi o diretor-geral da Polícia Federal. Detalhe: meses antes, a meu pedido, havia indicado o seu próprio chefe de gabinete, dr. Wilmar, como meu secretário de Segurança Pública, que também, inexplicavelmente, quinze dias antes havia deixado o governo.

Agora, chama a atenção o fato de o sr. realmente não ter apresentado eventualmente nenhum elemento de prova contra alguns políticos que poderiam ter se beneficiado desse esquema e que existiu de fato um esquema.
Por quê?

Por quê?
Muito simples. O processo judicial responde. Porque este esquema de desvio de dinheiro público para beneficiar político está provado nos autos, pelas perícias da Polícia Federal, que foi anterior ao meu governo. No meu governo, Fernando, e esta é uma prova contundente ao meu favor, antes do meu governo gastava-se em torno de R$ 530 milhões por ano com informática. Eu baixei, no primeiro ano do meu governo, para R$ 34 milhões. Eu acabei com a corrupção. O que aconteceu? Quando eu fiz isso, tinha uma organização social em Brasília que chamava ICS, Instituto Candango de Solidariedade, que era o instrumento usado pela Codeplan para contratar as empresas de informática sem licitação. Eu extingui o ICS, demiti 15 mil servidores que trabalhavam lá sem concurso. Eu tomei medidas duras que contrariaram interesses políticos e econômicos. Isso foi a base da armação do golpe que se fez contra mim. Só que o golpe teve uma coisa errada do lado deles: o PT não desejava, isso para mim está muito claro e se você ler os autos do processo vai ficar claro também, eles não desejavam dar o golpe em setembro de 2009. Eles imaginavam que eu poderia vir a ser o candidato a vice-presidente na chapa do Serra. Tinha havido uma frase do Serra inclusive, “vote em um careca e leve dois”. Eles esperavam segurar todo este material e só detonar o escândalo depois que eu fosse indicado candidato a vice-presidente. Por que estourou antes? Estourou antes porque eu, depois de ter recebido a visita desta procuradora, que eu botei para fora da residência oficial tentando me chantagear, eu primeiro avisei o procurador-geral do Ministério Público, que me pediu para esperar alguns dias porque estava tomando providências. Quando essas providências não vieram eu reuni a minha assessoria jurídica e comecei a formalizar uma denúncia. Antes que essa denúncia fosse entregue veio o golpe. Ou seja, não resta dúvida para mim que eles estavam absolutamente informados dos meus passos e tiverem que antecipar o golpe porque, na verdade, politicamente eles queriam dar o golpe lá na frente. Agora, conseguiram uma coisa, você vai lembrar que na campanha de 2010 o cerne da discussão seria o mensalão do PT, esse assunto praticamente saiu de pauta. Por quê? Midiaticamente eles conseguiram criar o mensalão do DEM para se contrapor a ele.

Essa sua acusação de golpe que teria sido praticado pelo PT, o nome de Gilberto Carvalho, que é uma pessoa muito ligada ao PT, ao governo Lula, agora ao governo Dilma, neste momento, em que se inicia uma campanha eleitoral, não pode parecer que o sr. está apenas encontrando um argumento para usar durante a campanha, agora, justamente agora?
Em primeiro lugar não sou eu que estou fazendo.

Não, mas...
Eu não teria elementos para fazer.

Não, mas...
Quem fez foi a revista “Veja”.

Não, veja, o sr. está revelando, diz que está revelando agora essa visita de Gilberto Carvalho ao sr. O sr. está revelando agora.
Essa visita eu nunca escondi.

Não. Mas o teor tal qual o sr. está apresentando...
Eu também nunca escondi, Fernando, a única diferente é que no auge do episódio a única coisa que interessava, e eu entendo isso pela força das imagens, eram as tais fitas.

Mas o sr. acabou de dizer “pela primeira vez vou dizer que quando Gilberto Carvalho...”, “pela primeira vez vou dizer agora” o sr. falou, que “Gilberto Carvalho esteve comigo e eu me senti ameaçado”. Foi isso que o sr. disse.
O que eu disse é o seguinte, Fernando: eu fiquei quatro anos em silêncio. No episódio eu tentei me defender, na época do escândalo isso tudo foi dito. Teve mais. O advogado que me defendia, no momento em que eu, preso, não aceitei delatar ninguém, falar mal de ninguém, e não aceitei renunciar ao mandato, ele me deixou. Quem é esse advogado? O dr. [José Gerardo] Grossi, que hoje hospeda no seu escritório o José Dirceu.

O sr. tem algumas ações aí que estão em curso. Uma delas no Superior Tribunal de Justiça foi suspensa por meio de uma liminar, depois a liminar foi derrubada, agora, nesta semana que acaba, pelo presidente ainda do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Um caso antigo em que o sr. evidentemente se defende e imagino que se defende porque se julga inocente. Por que então impedir o julgamento no STJ dessa ação?
Muito simples. O juiz que tocou essa ação e que fez a condenação em primeira instância foi considerado suspeito pelo STJ em um caso correlato, em um caso apenso a esse. Há fortes indícios de parcialidade deste juiz e até de ligações suas com o PT, que eu não vou entrar no mérito. No momento em que o STJ decidiu que esse juiz era suspeito em um caso correlato os meus advogados pediram, claro, a extensão da suspeição para o meu caso. Me parece um instrumento jurídico válido dentro do Estado de Direito.

Mas no STJ o sr. não tinha convicção de que por um colegiado seria absolvido?
Não, mas a matéria não estava no STJ. O STJ apenas julgou a suspeição do juiz. O mérito da ação está no Tribunal da Justiça do Distrito Federal.

E o sr. dessa forma consegue registrar a sua candidatura. O sr. está confiante ou está seguro do ponto de vista jurídico de que a sua candidatura não será desta forma atingida pela Lei da Ficha Limpa? Se sim, por quê?
Fernando, eu acho que é um teste da democracia brasileira.

Qual é a lógica de o sr. que já, enfim, enfrentou todos esses problemas não ser atingido pela Lei da Ficha Limpa? Como é que se explica isso para um eleitor comum?
Muito simples: a Justiça agiu, os processos andaram e eu não tive nenhuma condenação de segunda instância. E a única condenação que tive de primeira instância o juiz foi considerado suspeito pelo STJ. Ninguém pode ser considerado culpado se a Justiça não o faz. Eu não tenho dúvida que vou vencer todos esses processos na Justiça. Mas Fernando, aí tem uma coisa muito curiosa que precisa ser dito, que é o seguinte: eu fui tirado do governo e fui preso. O que era de se esperar? Que o Ministério Público tão urgente na minha retirada do governo e na minha prisão imediatamente fizesse uma denúncia contra mim. Não foi o que aconteceu. Passaram-se três anos, e denúncia nenhuma. Quando veio a denúncia? A denúncia só veio no último dia útil antes do início do julgamento do mensalão do PT no Supremo. Assim mesmo, porque o ministro Marco Aurélio Mello do Supremo Tribunal Federal disse que cobraria do dr. [Roberto] Gurgel, à época procurador-geral do Ministério Público, por que ele tirou o governador eleito e o prendeu e três anos depois não tinha feito denúncia. Foi feita a denúncia. A denúncia se baseia, três anos depois, se baseou em quê? Em um relatório feito pelo governador Agnelo, o meu mais notário adversário. Foi o único elemento da denúncia. Por quê? Quando eles fizeram a denúncia três anos depois já se tinha os laudos da Polícia Federal de que as fitas eram anteriores ao meu governo, portanto não me condenavam em nada. Ok. Foi feita denúncia. Feita esta denúncia, sabia-se juridicamente que ela não tem como me levar a uma condenação e aí o que fizeram? Começaram a fazer uma série de outras denúncias, nada ligado a este episódio. E aí uma denúncia é que eu trouxe a seleção brasileira [de futebol] para jogar contra Portugal, aqui em Brasília, sem licitação. Como é que você faz licitação para contratar um jogo da seleção brasileira? A outra denúncia foi que eu tinha feito enfeites de natal, a outra denúncia foi que eu tinha reformado o piso do ginásio. Um monte de bobagens que viraram processos contra mim na tentativa de me condenar e de me tornar inelegível em outros casos e não nesse caso principal que me tirou do governo porque já sabiam que esta denúncia, conhecida como Caixa de Pandora ou mensalão do DEM, iria se esfarinhar, como está se esfarinhando por falta de consistência jurídica, por falta de provas. Muito bem. Eu respondi a todas essas ações e também venci. A única em que fui à julgamento de segunda instância, que é a do ginásio de esportes, eu respondi e ganhei no Tribunal de Justiça, fui inocentado. É por isso que posso ser candidato a governador. Talvez, Fernando, em termos pessoais da minha família, seria muito mais fácil eu não voltar para a vida pública, eu não me expor. Esses processos acabariam, como vão acabar, me inocentando e eu teria paz e tranquilidade para viver. Por que a decisão de voltar? Por três razoes básicas. A primeira é de cunho pessoal. O que aconteceu comigo não é justo em função de tudo que fiz na vida, não enriqueci com política, sou um dos poucos políticos brasileiros que não sou dono de rádio, não sou dono de televisão, não sou dono de jornal, não tenho empresa, não tenho nada. Vasculharam a minha vida e me deram um laudo assinado pelo Ministério Público, pela Polícia Federal e pela Receita Federal, um atestado de idoneidade mostrando que a minha renda é compatível com meu patrimônio. Muito bem. Ou eu vou para a opinião pública, dou a cara a tapa, conto essa podridão dos poderes e continuo a minha vida ou ia passar a vida inteira escondido, envergonhado. A segunda razão é porque as pessoas que acreditaram em mim, as pessoas que me ajudaram a governar, a parte da população de Brasília que me coloca hoje como líder das pesquisas, que me dá 40% das intenções de votos, essas pessoas mereciam o meu respeito. E em terceiro lugar, Fernando, você mora em Brasília, porque essas pessoas que me tiraram do poder se esqueceram do principal, não se prepararam para governar e mergulharam Brasília em um desgoverno, talvez no pior governo da sua história. Eu estou nesta eleição para resgatar a minha vida pública, mas principalmente para resgatar Brasília dessas pessoas maldosas, que não sabendo construir, destroem. E vou dizer aqui uma opinião pessoal minha, no que eu puder, eu quero que Brasília fique livre do PT e que o Brasil fique livre do PT. Esta visão dogmática que setores majoritários têm, que tem que dominar o aparelho de Estado, que tem que se enraizar e se infiltrar inclusive nos outros poderes para se perpetuar no poder e para fazer com que o país seja escravizado por um partido político. Isso contraria o pensamento democrático da maioria da população. É contra isso que eu me insurjo. Nem que seja a última coisa que eu vou fazer na vida, estou preparado para o debate.

Para finalizar o caso da acusação que o sr. faz de golpe, o sr. aponta o atual governador de Brasília, Agnelo Queiroz, do PT, como um dos que engendraram esse golpe. Aponta Gilberto Carvalho como conhecedor do que se passava e também Dilma Rousseff e Erenice Guerra, na sua opinião, tinham conhecimento do que se passava. É isso?
Vamos por partes. Governador Agnelo, ele declarou em um blog pessoal dele que realmente fez a visita ao Durval, viu as fitas e ajudou levá-lo ao Ministério Público para a delação. Então sobre este cidadão não há a menor dúvida, inclusive as pessoas que viram a fita, e muitas pessoas viram, embora ela tenha sido arrancada dos autos, diz que quando Durval fala que podia editar as fitas e embaralhar a opinião pública pegando fitas antigas e dizendo que eram do meu governo ele comemorou então dizendo “então eu vou ganhar a eleição”. Eu quero ver essa fita. Ela tem que aparecer. O próprio Agnelo reconhece que fez a visita. O delator diz que fez a visita, a revista “Veja” aqui, em uma outra edição, está aqui a matéria na revista “Veja”, “O PT na Caixa de Pandora”. Tudo isso não sou eu quem está dizendo, Fernando, é a revista “Veja” disse e com provas. Eu quero que isso venha à tona. Eu não tenho a menor dúvida que o governador Agnelo foi o agente do golpe. Segundo...

Conhecimento de outros integrantes da direção do PT a respeito.
Sobre a visita do dr. Gilberto Carvalho não há dúvidas. Há os apontamentos oficiais que falam da sua visita e o que ele fez de maneira velada foi uma ameaça, “ou vem para o nosso lado, ou você vai enfrentar muitas dificuldades”. Sobre a visita, também que já saiu na imprensa, da então candidata Dilma acompanhada da dra. Erenice, elas foram me fazer um convite para mudar de partido, que eu não aceitei.

Mas o sr. acha que o grau de conhecimento dessas três personagens, Gilberto Carvalho, Dilma Rousseff, Erenice Guerra, a respeito do que o sr. chama de golpe era qual?
Não sei.

O sr. tem alguma inferência a respeito?
Não devo fazê-lo. Posso até ter mais não devo fazer. Eu só estou dizendo...

Mas se Gilberto Carvalho o ameaçou, como o sr. disse que ameaçou, ameaçou com base em quê?
Fernando, o que eu estou dizendo aqui nesta entrevista, quatro anos depois, em resumo, são as mesmas coisas que eu disse lá atrás, com uma diferença, lá eu não era ouvido. Depois de ter vencido quatro anos, e aí passei por uma profunda, eu não sou super-homem, passar pelo que eu passei. Demorei muito para recuperar a minha capacidade de pensar. Demorei mais ainda para conseguir vencer os obstáculos da Justiça que me foram postos. Houve um momento, Fernando, que ficou claro, no palco de Brasília, que a política, as forças políticas no poder atualmente tentaram invadir o templo da Justiça. Só me restava uma arma: confiar na Justiça. Confiei, apelei ao STJ, ganhei a suspeição, os parciais foram afastados e a partir daí eu consegui restabelecer a justiça. Agora, no momento em que faço essas avaliações, eu as faço politicamente. Eu não sei dizer qual a eventual participação do mesmo personagem, Gilberto Carvalho, na morte do prefeito de Santo André [Celso Daniel], mas eu quero deixar um recado aqui, eu não tenho medo de morrer, porque se quiserem me calar agora vão ter que fazer comigo o que fizeram com o prefeito de Santo André. Eu não tenho mais nada a perder. Me enxovalharam na opinião pública, mancharam a minha vida pública, usaram poderes de Estado, de aparelho de Estado, em benefício de uma causa política deles. Fui afastado do governo por um golpe e quero voltar ao governo pelo instrumento democrático que é o voto. Eu não estou tentando voltar no tapetão. Sabe o que fica claro nessas últimas horas em Brasília, Fernando? Que o mesmo Agnelo está usando de todos os meios possíveis e imagináveis para mais uma vez me tirar no tapetão. Sabe por quê? Porque ele tem medo de debater comigo. Você que é jornalista chame-o aqui para um debate no dia e na hora que ele quiser, e eu estarei pronto. Chame o ministro Gilberto Carvalho, estou pronto para debater com ele. Preparadinho, com todo o respeito, e munido de uma única arma, a verdade, a minha tranquilidade de consciência.

O sr. está contando uma história que tem começo, meio e fim de acordo com o seu entendimento do que se passou. Deixa eu recordar um caso anterior, de 2001. Em 2011 o sr. foi acusado de participar da violação do painel de votação do Senado quando o sr. era à época senador. Sua primeira reação foi contar uma história muito bem encadeada negando o envolvimento. A partir de um momento ficou impossível negar e o sr. admitiu e ficou claro que o sr. havia mentido na versão anterior. Esse seu histórico já, que existe de 2001, não compromete essa sua narrativa atual?
Ao contrário, fortalece. E é muito simples. Você acha que eu fui o único senador em 2001 que vi a lista de votação?

Não, foram vários os senadores. ACM também acabou renunciando.
Inclusive o “Jornal do Brasil” à época publicou a lista. Os outros senadores que resolveram continuar mentindo, dizer que não tinham visto, dizer que votou de um jeito e votou de outro, esses continuam aí posando de vestais na política brasileira. Eu tomei uma decisão difícil. Embora...

O sr. tomou uma decisão difícil porque ficou inevitável, não é?
Desculpa, se ficou inevitável para mim por que não ficou para eles?

Porque não havia elementos de prova de que eles estavam mentindo, no caso deles.
Havia todos os elementos de prova. Todos os elementos de prova, inclusive a matéria publicada no “Jornal do Brasil” com gente que tinha votado de um jeito e votou de outro.

Sim, sim, mas aí era...
Sabe qual era a diferença, Fernando?

Se o sr. me permite dizer eu conheço esse episódio. Eu acho que em relação aos outros eu tenho fundadas suspeitas de que muitos tiveram acesso, só que eu não tenho como provar. No seu caso havia depoimentos, havia muito mais elementos comprobatórios, no seu caso e foi por isso que eu entendo que o sr. teve que admitir.
Muito bem. Eu respeito a sua opinião e eu posso lhe garantir que se eu tivesse me mantido calado o senador...

O sr. teria sido cassado.
Eu estou te afirmando que se eu tivesse ficado calado e o senador Antônio Carlos também nada teria acontecido para ninguém. O acordo no Senado estava feito para segurar todo mundo. Eu rompi com isso por uma razão muito simples, porque, em restabelecendo a verdade, eu pedi desculpas por ter entrado no combinemos anterior, falei a verdade e pude ir para as ruas de cara limpa e por isso, em 2002, fui eleito deputado federal com a maior votação da história da República brasileira, em termos proporcionais. Ora, sabe que isso demonstra para mim, Fernando? A política brasileira é o seguinte: quem continua mentindo, quem faz parte do jogo de faz de conta, quem joga sorrateiramente nos subterrâneos continua posando de herói. Quem assume a verdade, quem não aceita chantagens, como eu não aceitei em uma episódio e no outro, esse é execrado e pregado na cruz.

Quem vai apoiá-lo na sua campanha para governador do Distrito Federal?
Eu espero que a população de Brasília.

Não. Em termos de partido. O seu próprio, o PR.
Sou filiado ao PR, temos um entendimento com o PTB e no plano local tem mais quatro ou cinco partidos que nos apoiam.

Alguns partidos anunciaram que iam apoiá-lo e as suas direções nacionais vetaram. O que aconteceu? Quais foram eles?
Eu não vou entrar nisso porque é uma questão de economia interna de cada partido. Os atos jurídicos foram perfeitos nas respectivas convenções e a legislação eleitoral brasileira é clara: ninguém pode desrespeitar as convenções partidárias, portanto, é uma aliança política já consolidada e eu não tenho dúvida que a Justiça Eleitoral nos dará total ganho de causa. Mesmo assim, Fernando, eu terei algo como três minutos de televisão. O atual governador terá algo como 12 minutos de televisão. Como eu estou conversando com os mesmo interlocutores que ele, que poderiam ou apoiá-lo ou me apoiar, o que eu estou percebendo? Mais uma vez, o governador Agnelo usa para fazer as suas alianças meios ilícitos, espúrios. Os acordos que o governador Agnelo está fazendo neste momento com vários partidos políticos para apoiá-lo pressupõe a entrega de milhares e milhares de cargos públicos de livre provimento, pressupõe verbas oficiais de publicidade no período eleitoral, pressupõe ilegalidades flagrantes. Isso eu vou enfrentar no período eleitoral.

O PR, o seu partido apoia oficialmente a candidatura da presidente da República Dilma Rousseff a mais quatro anos ao Palácio do Planalto. O PTB, que também o apoia, como o sr. relatou, apoia a candidatura de Aécio Neves, que é de oposição à Dilma Rousseff. O sr. na campanha pelo governo do Distrito Federal fará declaração de apoio a algum dos candidatos a presidente da República neste ano?
Não. O que eu farei é o seguinte: eu acho que os eleitores, os cidadãos normais, podem dar o seu voto e tê-lo como secreto, é o direito que lhes dá a Constituição. Então eu, como cidadão, poderia simplesmente dar o meu voto para presidente e não dizer para ninguém em quem eu vou votar.

O sr. vai fazer isso ou vai declarar?
Não, porque eu acho, aí é um pensamento pessoal meu, eu acho que quem faz vida pública tem a obrigação de publicizar o seu voto.

Qual será o seu voto?
O meu voto é contra o PT e eu considero, neste momento, que quem tem as melhores condições de resgatar o Brasil dessa ditadura partidária e de soltar o freio de mão da economia brasileira, de repensar o papel de Estado brasileiro, é o candidato Aécio Neves. É nele que eu vou votar. E isso eu já tornei público.

O sr. espera tê-lo no seu palanque fazendo campanha junto com ele, de mãos dadas, em Brasília?
Não, não espero não, porque o partido dele aqui tem um candidato que está cumprindo o seu papel. Eu diria o seguinte, Fernando, eleição não se dá de cima para baixo, é de baixo para cima. Eu tenho a obrigação de dizer em quem eu vou votar para presidente, o presidente não tem necessariamente a obrigação de dizer quais os apoios que ele tem em cada Estado. Há inclusive Estados brasileiros que têm dois candidatos a governador apoiando o mesmo candidato a presidente. Aí se você me permite, a legislação eleitoral brasileira, eu acho, ainda precisa ser aprimorada. Há uma miscelânea de partidos políticos, há uma grande parte desses partidos que fazem negociações nem sempre muito claras às vésperas de toda eleição, e continua dessa maneira. E eu acho que o fato de não haver a verticalização gera essas incongruências que você aponta, não apenas no meu caso, em todos os Estados brasileiros. Você tem Estados brasileiros em que o DEM, por exemplo, que apoia o Aécio, no Estado apoia o PT. Você tem uma miscelânea. Isso não é bom para a democracia. Eu acho que a legislação eleitoral brasileira necessariamente tem que ser aprimorada. Dentre esses avanços, um que me parece fundamental, para evitar casos como o meu e “n” outros casos que ainda estão no subterrâneo, que por razões quaisquer não vieram à tona, é preciso instituir o financiamento público de campanha e acabar com as doações de campanha. Isso me parece fundamental.

Todas as suas explicações aqui nessa entrevista dão conta que o sr. ou foi vítima de um golpe, no caso de agora, estava sendo enredado lá em 2001 em um acordão para ninguém contar a verdade no Senado. Em algum desses momentos o sr. se arrependeu de alguma atitude sua?
Fernando, a vida, principalmente de quem já sofreu como, eu venho de família humilde, sofri muito para estudar engenharia, depois entrar na vida pública sem ser diretor do sindicato, sem ter fortuna pessoal, sem ter dinheiro, sem ter herança política familiar, eu furei um bloqueio. A elite tem um bloqueio para você entrar. Eu sempre tive esse idealismo, fiz política estudantil, tinha vontade. Muito bem. Eu furei muitos bloqueios. Tive grandes vitórias e tive grandes derrotas. O sujeito que passa por tudo que eu passei necessariamente vai, ao longo da vida, repensando coisas, aprendendo, se aprimorando. Eu diria a você que me considero hoje um pouquinho melhor como ser humano do que eu era antes dos sofrimentos que eu passei. Então, há muitas coisas em circunstâncias diversas que eu eventualmente possa ter feito, erros que cometi e que hoje não gostaria mais de cometer. Acho que o principal deles, se me permite, é na escolha de pessoas para o exercício de governar. O grande problema na política brasileira hoje é que, com esses acordos enormes que tem que ser feito para disputar a eleição, gera expectativas nem sempre muito republicanas em alguns que te apoiam. É preciso ter muita força para repeli-los quando assume o governo. Eu acho que quando fui governador da outra vez, e fazia um belo governo, reconhecido por todo mundo em Brasília, eu cometi esse erro. Eu não podia ter aceito a indicação de um personagem como este, que acabou sendo delator, mesmo em um cargo sem importância, mesmo sem ser ordenador de despesas. Esse foi um erro que eu cometi e que me custou muito caro. O que é muito diferente de querer dizer que eu sou responsável por uma corrupção que ele confessamente realizou em governos anteriores ao meu e que eu podei, que eu cortei.

José Roberto Arruda, muito obrigado por sua entrevista à Folha de S.Paulo e ao UOL.
Muito obrigado a vocês pela oportunidade.