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Com ajuda da PF, Comissão da Verdade pode obrigar militares a depor

Bruna Borges

Do UOL, em Brasília

21/07/2014 19h35

A Comissão Nacional da Verdade vai usar a autoridade policial para forçar o comparecimento de militares convocados a depor que não se apresentaram e não entregaram justificativa válida pela ausência. Nas próximas duas semanas, a comissão faz um mutirão para ouvir 41 agentes envolvidos em graves violações de direitos humanos.

Caso os militares não apareçam para depor, a comissão expedirá um mandado, que será executado pela Polícia Federal. Na prática, a medida determina que policiais busquem os depoentes em suas casas ou onde eles se encontram e os encaminhe até as oitivas à força.

Segundo o colegiado, a condução coercitiva está prevista na lei que criou a CNV. Membros da comissão se reuniram nesta segunda-feira (21) com o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) para estabelecer os procedimentos caso a medida seja necessária. De acordo com membros do colegiado, o ministro deu aval para que a medida ocorra.

“Nós temos muita expectativa que não seja necessária essa medida. Nossa reunião com o ministro foi uma medida de cautela, mas esperamos que os convocados compareçam”, defendeu Pedro Dallari, coordenador da comissão. 

Após o fim do mutirão, será feito um balanço e se necessário a condução coercitiva dos militares que não compareceram será solicitada à PF.

De acordo com Dallari, o coronel Wilson Machado, envolvido no atentado do Riocentro, pode ser um dos militares que será obrigado a se apresentar por meio desta medida. Ele já foi convocado e não compareceu e também não apresentou nenhuma justificativa para a ausência.

Outro que pode ser convocado desta forma é o general reformado José Antônio Nogueira Belham, que comandava o DOI (Destacamento de Operações e Informações) do I Exército em 1971, quando o deputado federal Rubens Paiva foi morto.

O relatório parcial da comissão sobre o caso aponta que Paiva foi preso na manhã do dia 20 de janeiro de 1971, torturado até o dia seguinte, quando não suportou a violência dos militares e morreu. O texto ainda acusa os militares responsáveis pela ação de ocultação de cadáver.
A versão oficial do Exército é que Paiva foi resgatado por guerrilheiros quando estaria sendo transferido.  Para a comissão, a versão é uma "farsa".

O general já prestou depoimento espontaneamente à comissão no início de 2013 e afirmou que no momento da prisão de Paiva estava em férias. No entanto, documentos obtidos pelo colegiado comprovam que ele esteve trabalhando no Doi nos dias da prisão.

Após a divulgação do relatório da CNV, Belham foi convidado a falar na Câmara dos Deputados sobre o assunto, mas não compareceu a audiência. Ele foi convocado para prestar depoimento amanhã em Brasília, mas já informou que não irá, pois se encontra no Rio de Janeiro. Uma nova convocação foi feita para a próxima segunda-feira no Rio. Caso ele não apareça novamente, a comissão deve tentar ouvi-lo por meio da condução coercitiva.

Depoimentos

Foram convocados 16 agentes da repressão para prestarem depoimento na sede da CNV, em Brasília, entre os dias 21 e 25 de julho. Outros 25 devem ser ouvidos na próxima semana no Rio de Janeiro.

"Os convocados foram citados em documentos relacionados a graves violações e a comissão deseja dar a eles a oportunidade de darem suas versões sobre os fatos, já que seus nomes constarão de nosso relatório que será divulgado em dezembro deste ano", declarou Pedro Dallari.

Depuseram nesta segunda-feira Gersi Firmino da Silva, Eudantes Rodrigues de Faria e Jamiro Francisco de Paula, que eram soldados e atuaram durante a operação Sucuri, e Deoclécio Paulo, que serviu como adido militar no Chile. Bolivar Mazon apresentou um atestado médico fornecido por um hospital militar e será convocado novamente. Segundo a comissão, os depoentes não colaboraram com muitas informações.

Também foi chamado para depor o ex-sargento do Exército Jurandyr Ochsendorf e Souza, que teria participado da farsa para justificar o desaparecimento do deputado. Ochsendorf também será questionado sobre a Casa da Morte de Petrópolis. De acordo com depoimentos de ex-agentes da repressão, ele teria atuado na prisão clandestina do Exército, que também seria um centro de tortura.

A comissão também convocou o ex-médico militar e general reformado Ricardo Agnese Fayad, ex-subsecretário de Saúde do Exército, que atuou no DOI-Codi do Rio e na Casa da Morte de Petrópolis.